28/05/2008

SEU SONHO ENTRE MEUS DENTES, NAS MINHAS MÃOS, DENTRO DE MIM.

Rascunhos de Alexandre Matos sobre meu livro novo.

Isso não é do livro:

Um crocodilo australiano de quase 8 metros atacou e matou um bombeiro às margens do rio Pinheiros, na manhã desta quarta-feira. O animal havia sido avistado poucos minutos antes por motoristas que passavam pelo local; imediatamente avisaram a polícia e o corpo de bombeiros. “Diziam que era um jacaré gigante” – explica o Comandante Nogueira, da 24ª Corporação – “mas é claro que achávamos que era exagero. O pessoal sempre aumenta a história.” Os soldados do corpo de bombeiros, que em mais de uma ocasião já haviam feito remoções de jacarés pequenos naquela mesma região, vieram preparados com equipamento para um jacaré de até 4 metros. Ao chegarem no local, o crocodilo já havia se escondido dentro de um duto às margens do rio. Nogueira, e o soldado Ivan Pereira entraram no duto e foram surpreendido pelo gigantesco animal e não foram capaz de contê-lo. O Comandante conseguiu fugir, mas o soldado foi atacado e teve parte de seu corpo engolido pelo réptil. O crocodilo adentrou o sistema de esgoto e ainda não foi localizado. “Esse não é um animal nativo da fauna brasileira” – Explica o biólogo Jackson Mangueira. “E pelo tamanho considerável, só pode ter sido criado clandestinamente em cativeiro, há algumas décadas. Ninguém conseguiria entrar ilegalmente com um animal desse porte dentro do país. Ele deve ter vindo filhote, ainda em ovo, ou mesmo ser cria nativa de outros espécimes contrabandeados.”

Ok, isso foi sonho, o tipo de sonho recorrente que tenho ainda hoje em dia. Achei que já tinha superado isso, que já pudesse deixar os crocodilianos para trás, mas eles insistem, me assombram e me incitam (Oh!) Pior que com meu atual Phd em Freddy Krueger, agora tenho sido capaz de controlar meus sonhos, sonhar com o que eu quero, e a história do crocodilo vai continuando e se desdobrando em novos ataques, novas mortes. Já sonhei até com o caso sendo dado pelo Datena. “Meu chapa, não tem essa história de preservação. Preservação uma ova! Pra mim é assim: matou ser-humano, é pena de morte pra esse crocodilo!”

(Na verdade, o sonho deve ter vindo de “Primitivo”, filme de crocodilo assassino que vi recentemente em DVD. Não é ruim, mas esse é o problema, é menos bagaceiro do que deveria ser. Afinal, num filme de crocodilo assassino queremos... um crocodilo assassino! não um retrato da situação política da África, onde a corrupção e o poder paralelo matam mais do que as feras. E o crocodilo aparece menos do que deveria. O melhor filme desse gênero – de crocodilianos assassinos – continua sendo “Pânico no Lago”, ao menos se assume como divertimento trash e satírico. Mas queria rever o clássico “Alligator”, que passava no SBT. Alguém tem? Alguém me dá? Alguém me diz onde vende? – Não, claro que não vou chegar ao ponto de pedir na Amazon.)
"Retrato de Nazarian e Alter-ego", pelo pitéu entre hashis, André Tanaka.



Deixando o crocodilo descansar, estou lidando agora com a pós-produção do meu quinto romance. Estou meio perdido, confesso. O livro está pronto, a capa está pronta, e agora Alexandre Matos e eu temos de afinar as ilustrações, a orelha, a quarta-capa. A editora aparentemente não quer se envolver. Deixou nas nossas mãos. Não posso nem pedir opinião. O rascunho lá de cima era uma idéia para quarta-capa, como uma história em quadrinhos, mas fiquei com medo que o livro (mais uma vez) fosse interpretado como infanto-juvenil. Sabe como é, o meio literário brasileiro é meio... limitado, e se você carrega um pouco no pop eles acham que não pode ser literatura. Ah... se ao menos eu fosse gordo... careca.... usasse óculos ao menos...

Falando do meio literário brasileiro. Recebi uns livros bem bacanas recentemente. Sergio Keuchgerian me enviou seu “Contos Indiscretos”, que ao que me parece, vai muito além da sacanagem: “Nunca senti faca rasgando meu peito, mas acordar sem poder ver um sonho concluído dói tanto quanto” - dizem as primeiras linhas do segundo conto. Ótimo. E linda ficou a edição pela Mundo Editorial, da capa ao miolo.
Essa aí:

Walther Moreira Santos me mandou seu “Um Certo Rumor de Asas”, romance que recebeu o Prêmio Casa de Cultura Mário Quintana. Eu abro e encontro: “Parada, copo nas mãos, ela o vê botar foto em gato, estripar sapo, correr atrás dela com cobra. Mentir.” Quero ler.

Luís Antônio Cajazeira Ramos me mandou “Mais que Sempre”, livro de sonetos. Me parece ter um certo humor kitsch, que eu adoro, indico e pratico. Vou ler.

E Samir Mesquita me deu (em mãos) seu “Dois Palitos”, livrinho de micro-contos em formato de caixa de fósforo. Não gosto muito de micro-contos. E acho que livro de micro-contos é para quem quer ser chamado de escritor sem precisar escrever, mas o projeto do Samir é despretensioso e divertido, um presente mimoso. Literatura nem sempre precisa ser aquela coisa árdua, tu sais.


Falando nisso, em contos, micro-contos, etc, ainda quero. Ainda quero escrever um livro de contos. Quer dizer, preciso, né? Cinco romances... tá na hora. Mas embora a idéia esteja me martelando e eu já tenha um tema... É isso, eu penso num tema. E nos personagens. E que os personagens podem se entrecruzar. E que um conto pode ter relação com o outro. Daí ele vai virando menos um livro de contos. Vamos ver. Eu também não quero pensar em publicação nos próximos anos. Escrever sim, publicar não – é meu lema. E você me escreve dizendo estar desesperado por editora? Não entre nessa. Editora é só decepção. É mais ou menos como sexo e masturbação, sabe? Quando você faz sozinho, imaginando aquela pessoa, é uma delícia. Quando chega lá, tem de agüentar todos os sabores, odores, pudores...

Por isso preservo minha virgindade até o casamento.

25/05/2008

ESCOLHAS PARTICULARES DE UMA MULTIDÃO

Quantos travestis você vê nesta foto?

Acabo de voltar enlameado da mancha parda que é a Parada Gay paulistana... no bom sentido.

Hohoho, elitismos à parte, é bom constatar isso, que a Parada é um evento do povão, que é o povão que está lá, que o povão é que forma a massa gay. Se você olhar nos jornais, na TV, vai achar que a parada é um aglomerados de travestis, bombados e alguns moderninhos que habitam a Paulista. Não é. Qualquer um que passa 5 minutos por lá pode constatar que os travestis são uma microscópica minoria; que os fortões e os modernos estão lá só aos pingos; que o que mais se encontra é o cobrador de ônibus, o office-boy, a caixa de supermercado e o pagodeiro do fundo do trem.

A parada serve para constatar isso, que os gays são, simplesmente, o povo brasileiro, numa porcentagem de respeito. Gente que você encontra todo dia, mas nem percebe. E que só nesses momentos é que esse povo dá as caras, beija, paquera, assume que bebe cerveja mas nem olha duas vezes pra Juliana Paes.

Aliás, esse foi um pouco meu discurso irônico do dia. Estava comentando que este ano a parada estava um pouco mais vazia por causa de tantos comerciais de cerveja, tantas gostosas nas TVs, nas revistas, os adolescentes se sentem menos influenciados a serem homossexuais não é? Bem, essa lógica faz tanto sentido quanto aquela que diz que hoje muitos adolescentes viram gays porque está na moda. A moda acabou. E agora?

Um pouco sobre esse tema tem a ver a crônica que escrevi pra revista Júnior deste mês. Sobre essa falta de identificação adolescente para assumir a homossexualidade. O menino achar que está isolado, que tudo o que vê aí identificado como gay não tem nada a ver com ele, ou com os meninos que ele namoraria (porque as pessoas não se assumem, seja na mídia seja no dia-a-dia). E a crônica tem uma traquitana: o texto se repete - uma vez com uma paixão feminina, outra masculina - mas só na segunda versão, na versão homossexual, é que os parágrafos ganham rimas, como se o texto só se encaixasse de fato nessa opção.

Fábio e eu no lounge do Mix.

Bem, minha passagem pela parada foi rapidinha. Não tenho mais saúde, mas acho bacana. Assim ao menos o pessoal se toca da força, da quantidade, de quanta gente está em torno da questão homossexual (ao menos como simpatizante).
O resto do feriado foi bom para encontrar os amigos, fazer jantarzinhos e mergulhar na maratona “Freddy Krueger”.

Incrível foi a peça “Quartet”, de Heiner Müller, que assisti na sexta, com Beth e Paulo Goulart Filho. Já trabalhei no argumento de um longa com a Beth (e não me pergunte como está o projeto, porque não temos novidades). Ela foi sempre queridíssima. Mas ainda não a tinha visto no palco, uma força impressionante. Recomendo muito. Está em cartaz no Sesc Ipiranga só até o final de semana que vem.


Paulo e Beth (a família é toda idêntica, não?)

20/05/2008

ARTE QUE ME CONSOME



Estréia neste feriado (aqui em São Paulo e aparentemente apenas no Cinesesc) o longa “Luz Silenciosa” do mexicano Carlos Reygadas. Eu não recomendo - depois você se suicida de tédio e vem botar a culpa em mim – mas para os bravos e os cinéfilos, é uma experiência...

Tive de ver o filme umas oito vezes. Legendei todas as sessões do filme no Festival de Cinema de Porto Alegre, há uns 3 meses. A primeira vez que eu vi... ok, as QUATRO primeiras vezes que eu vi, tive vontade de gritar. O filme é absurdamente lento e silencioso. Mas depois disso, revendo o filme tantas vezes, ele foi crescendo em mim, fui reconhecendo seu mérito, sua consistência, e hoje talvez até possa dizer que gosto. Confesso que até fiquei com vontade de ver de novo (e me arrependi de não ter feito uma cópia), embora esteja longe de ser meu tipo de filme.

A história? Um triângulo amoroso entre menonitas (uma comunidade religiosa de raiz holandesa) no México. Só isso. Mas para mim serviu bem como afirmação de que uma obra pode ser cansativa, até irritante, e ter um valor artístico admirável.

(Nesse mesmo festival de Porto Alegre, legendei outros filmes que eram tão chatos quanto, e que quanto mais eu via mais rasos ficavam, mais falsos eram em sua intelectualidade. Desses não vou nem dizer o nome.)

Agora, um que eu legendei no mesmo festival que é imperdível (e que não sei se entra em cartaz) é “La Antena”, do argentino Estepan Sapir. Lindíssimo. Uma mistura de expressionismo alemão com Sin City. É pra enfiar no rabo dos brasileiros e mostrar como a Argentina continua a milhões, milênios à frente do cinema brasileiro.

(Lá vou eu espinafrando novamente nossos amigos...)





Indo para minhas doenças pessoais, chegaram aqui os presentes que encomendei para mim mesmo de aniversário. Uma pá de livros e alguns DVDs. Acho que os robôs da Amazon devem achar que sou doente. Acho que os robôs da Amazon devem condenar minha humanidade, dada a lista de bizarrices que já encomendei de lá. Ultimamente não tinha encomendado nada, porque acho ainda mais bizarras as taxas de alfândega que tenho de pagar (e nunca entendo exatamente quando se paga ou não. Às vezes não cobram. Achei que livro não pagava taxa, mas desta vez veio. Alguém pode explicar?) De qualquer forma, acaba saindo mais barato do que encomendar por aqui – e várias coisas só se encontra por lá, nunca daria para pedir pela Livraria Cultura, por exemplo.

O que veio desta vez:

“The Encyclopedia or Serial Killers” – Um livrão com biografia e modus operandi de toda essa galera trevosa que apronta mil estripulias com nossos intestinos. Bem bacana como consulta (mas não exatamente para ser lido antes de dormir). Faltam os assassinos brasileiros, claro (embora mencionem coisas como a seita satânica que matava meninos no Pará – eles devem mesmo achar que o Brasil é o país do vodu), mas para isso eu recomendo: “Serial Killers Made In Brazil” livro da Ilana Casoy editado por aqui pela Arx, tem algumas entrevistas realmente chocantes.

Falando em chocante, chegaram também mais dois livros do Dennis Cooper. Ele é dos meus autores favoritos, mas eu vou lendo a obra dele bem devagarzinho, não tanto para economiza-lo, mas para não conspurcar minha alma! Autor extremo dos mais extremo, doente dos mais doentes. Desta vez, pedi “God Jr.” um dos romances mais recentes e “Wrong” um livro de contos antigo. Já li algumas coisas do “Wrong” e me fez lembrar bem um trecho de uma entrevista dele que traduzi aqui:

Eu tentei imitar “120 Dias de Sodoma”, e escrevi esse romance extremo de 800 páginas. Era sobre uma festa na escola onde meus amigos e eu fizemos todos esses carinhas bonitinhos virem, então os prendemos e torturamos e matamos. Era uma coisa bem longa, totalmente horrível e ridícula.



E falando em horrível e ridículo, veio também “Crystal Lake Memories” um livrão de capa dura com fotos, entrevistas e bastidores sobre... Os filmes do Jason! Para fãs da série, é imperdível. Até porque, o livro nunca tenta glorificar as produções. A maioria dos atores e técnicos entrevistados se confessam meio envergonhados de terem trabalho em “Sexta-feira 13”, vira uma mancha no currículo. Como eu fui apenas um fã mirim dos anos 80 (e estamos na era da nostalgia e do resgate, não é) eu não me envergonho.


Ch-ch-ch, ah-ah-ah!




Talvez o mais literário dos livros que encomendei (bem, eu coloco Dennis Cooper nessa categoria também) seja “White Lines – Writers on Cocaine”, livro de contos e ensaios sobre cocaína com nomes de peso como Robert Louis Setevenson, Sigmund Freud, David Foster Wallace, Irvine Welsh, Brett Eastn Ellis, Stephen King, Will Self, William Burroughs e por aí vai. Comprei há alguns anos um livro editado por aqui pela Casa da Palavra, chamado “Cocaína – Literatura e Outros Companheiros de Ilusão”, que tem até coisas interessantes (como contos de João do Rio e Manuel Bandeira), mas está longe de se focar exatamente no tema e ter essa variedade de autores.

E para fechar minha encomenda (vê como sou generoso comigo, hohoho) veio também a caixa de DVDs do Freddy Krueger, com os sete filmes (incluindo as cenas em 3D, com dois óculos), mais um DVD recheado de extras, entrevistas, making offs – o pior é que esse DVD bônus é uma espécie de jogo, onde você tem de perambular por um labirinto coletando itens e respondendo perguntas para ter acesso às entrevistas, aos clipes; bizarro, nunca vi uma produtora levar tão longe o conceito de easter egg (pelo menos no PC dá pra abrir o DVD e ver tudo sem ter de ficar jogando horas no DVD player).

E teve ainda o DVD “Live at the Ocean” do Sex Gang Children, banda seminal gótica que tive privilégio de ver (e conversar) em Londres exatamente nesse show registrado no DVD! (Fiquei de olho pra ver se eu aparecia na platéia, mas não).




Tó, um (pseudo) hit do Sex Gand pra você conhecer.

Só que ainda não terminei a caixa de “Heroes”. Ganhei também a caixa de “Dexter”, você gosta? Ainda não engrenei, vi só o piloto. Tá ficando difícil ver/ler tudo isso e ainda trabalhar, escrever, jantar... Acho que vou ter de abrir mão do sexo novamente... Alguma coisa vai ter de ficar de lado, não é?

16/05/2008

PRATELEIRAS INTRANSPONÍVEIS


Mondrian.


De tempos em tempos recebo o email de algum leitor me pedindo dicas de leitura. É gente jovem que descobriu meus livros, gostou e quer seguir na mesma linha, conhecer outros autores, livros com temas e abordagens parecidas...

E fico feliz em cumprir este papel. É um pouco do que tento fazer no blog. Afinal, é tão, tão difícil encontrar nossa família literária. Conseguir transpor as barreiras das prateleiras e identificar o que há realmente no interior de cada livro.

Sempre tive livros em casa. Minha mãe sempre foi uma grande leitora. E eu cresci com aquelas lombadas enigmáticas “Suassuna – A PEDRA do reino”, “O Arquipélago” (que para mim era “O arquipe-lago”, “norman MAILER – A Canção do Carrasco” e tantas outra que povoaram minha infância apenas como lombadas, como peças decorativas na minha sala.

O tempo foi passando e fui puxando algumas daquela lombadas. Descobri que algumas só eram interessantes mesmo como lombadas, outras revelaram um sedutor conteúdo interno que eu nunca soube que estava na minha própria casa, à vista de todos, na sala de estar, como por exemplo “Porcos com Asas”.

E embora minha mãe sempre tenha me indicado bons livros, foi com uma namorada de escola que fui descobrindo minha verdadeira família literária. Álvares de Azevedo, Caio Fernando Abreu e Oscar Wilde – principalmente Oscar Wilde. Quando li “O Retrato de Dorian Gray” na adolescência, foi a primeira vez que pensei. “É isso o que eu quero fazer.”

Ainda assim, hoje ainda acho difícil. Vou numa livraria e fico horas, horas folheando e não encontro nada. Fico imaginando que em alguma daquelas prateleiras tem algo bem precioso, mas como localizar? Nem é preciso dizer que o que menos há em livraria hoje em dia são bons atendentes, gente que lê realmente, conhece seu gosto e pode indicar títulos interessantes. Então a gente tem de vasculhar o que está exposto, as capas, as lombadas, os títulos (e esse é um dos motivos pelo qual me esforço tanto para que meus livros saiam com um ótimo acabamento visual e com orelhas explicativas – não intelectualóides – para poder fisgar as pessoas que ainda vão às livrarias).

Vez ou outra, a coisa dá certo. Como quando encontrei numa pilha de livraria, ano passado, “A Fábrica da Violência”, do sueco Jan Guillou, editado pela Record. Me chamou atenção o título (porque a capa é medonha). Li um pouco da orelha e comprei o livro. Acabou se tornando um dos meus favoritos de todos os tempos.

Alguns dos nomes que realmente ecoaram para mim são nomes obrigatórios - como Kafka, Mário de Andrade, Lygia. Outros eu conheci primeiro em filme, depois fui procurar os autores – como Thomas Mann, Laird Koenig, Armistead Maupin, Clive Barker, Koji Suzuki. Alguns eu li em antologias de contos, depois fui procurar livros próprios – como Paulo Henriques Britto, Saki, Rubem Fonseca, Márcia Denser. A maioria veio por indicação mesmo. E é difícil eu encontrar quem entenda meu gosto e acerte na sugestão. Os livros mais importantes vieram de indicações de namorados e namoradas: Wilde, Caio, Noll, Lúcio Cardoso, Mário de Sá-carneiro. Amigos foram poucos que acertaram.

Há uns dez anos conheci pela internet um professor americano, o Louis. Ele leu uma crítica que eu fiz de um livro na Amazon, comprou o livro, detestou e me escreveu para tirar satisfações. Acabou me mandando de presente vários e vários livros (até recentemente) de autores americanos contemporâneos (quase todos gays, é verdade). Com ele conheci Tom Spanbauer, Allan Hollinghurst, Eric Swanson. O Louis eu nunca conheci. Durante certo tempo até me questionei se ele não usava nome falso, se não era algum brasileiro que eu conhecia, ou algum dos autores americanos que ele me mandou.

Falando em Amazon, o sistema de indicações de lá para mim funciona melhor do que de qualquer outra livraria. Aquele esquema de “pessoas que compraram este livro também compraram:” é realmente útil. Você encontra livros de temáticas parecidas, de autores relacionados, pode pesquisar em listas de leitores elegendo os melhores títulos. Eu também sempre leio as críticas dos clientes, eles alertam para qual a melhor edição a se comprar (tanto em livros como em DVD), e geralmente descrevem melhor o conteúdo do que os releases oficiais.

Daí voltamos àquela velha discussão: e as leituras obrigatórias? E os livros obrigatórios para se ler na escola, no vestibular? Não ajudam a formar o repertório dos jovens leitores? Será que essa obrigatoriedade não é o que acaba afastando os alunos da leitura? Será que as opções não deveriam ser mais abertas?

Eu não sei. Nunca tive os livros obrigatórios como meus favoritos, é verdade. E acho que podem causar certa resistência, sim. O moleque é obrigado a ler Machado de Assis - que é “o maior escritor brasileiro de todos os tempos”- detesta Machado de Assis. Daí fica pensando que não gosta de ler mesmo. Se não gosta “do maior”, não vai gostar de mais nenhum. E acho que esse é um pensamento freqüente.

Mas daí o que fazer? Deixar que o aluno escolha livremente o livro? Não vai acabar vindo só Harry Potters? De repente a melhor opção seja deixar o aluno escolher dentro de temas, períodos, escolas literárias. O professor pode inclusive sugerir, mas deixar o aluno ter a decisão final. Claro que isso dificulta nas horas das provas, das avaliações, mas até aí, para que serve uma avaliação?

Um dos tópicos mais bacanas que eu vi na comunidade “Santiago Nazarian” do Orkut foi: “Como você conheceu os livros de Santiago Nazarian?” Porque daí pude ter alguma idéia de como as pessoas chegaram até meus livros. Claro, não é uma amostra exatamente científica, pega apenas meus leitores que estão no Orkut, que estão na minha comunidade e que responderam ao tópico, mas ainda assim, dá pra ter uma idéia. Alguns leram sobre o livro em revistas e jornais. Muitos tiveram a indicação de amigos. A maioria, previsivelmente, viu no Programa do Jô.

14/05/2008

DEMONOS IGNÔMIOS








Eu metia porrada nessa Aninha...



Em plena semana de inferno astral, os Demônios Tecnológicos resolveram me aloprar e tive pau no Outlook, todos os emails perdidos, tilt no celular, tilt no Ipod. Vou chorar, gritar e chutar os blocos.



Ou rezar para os Gnomos da Assistência Técnica. Eles não aparecem de vez em quando por aí? Por aqui, faz tempo... Mas vez ou outra um equipamento falecido volta a funcionar, uma máquina emperrada desemperra. Estou precisando deles novamente. Gnomos, me salvem dos Demônios!


Por falar nisso, meu livro novo se chamará "Macumba na Selva".


Entreguei já "O Prédio, o Tédio e o Menino Cego" para a Nova Fronteira. Daí lembrei a falta que faz. Por mais que a história estivesse pronta há tempos, quando você ainda tem livro pra entregar ainda sente que tem um filho em casa, que ainda pode ajudar na nutrição, que ainda pode alimentar. Basta entregar, que você se sente abandonado, viúvo, órfão, sozinho. E agora? Então me lembrei por que sempre começo um novo livro. Então me lembrei por que insisto. É bom ter algo (ou alguém) a retocar toda noite. O mais gostoso mesmo é esse espírito de criação - porque lidar com editora, com público e toda a expectativa da publicação é muito tenso, é muito frustrante.... Vou começar o próximo livro agora mesmo. Mas espero não publicar nada nos próximos dois, três, QUINZE anos...


Mas quem está falando no próximo, não é mesmo? Você nem viu as 400 novas e sensacionais páginas que tenho a oferecer ainda este ano... nos próximos meses...


O PRÉDIO, O TÉDIO E O MENINO CEGO

Porque eu sou construtor!



No mais, minha atual maratona pessoal agora é Heroes. Ganhei a caixa. Já vi metade da primeira temporada. Está roubando minhas preciosas horas de leitura durante a madrugada. (Bem... antes isso que "Supernatural".)


No momento, ouvindo a trilha sonora do Cymbeline:


How brave the promisse is
And lingers sweet the departure kiss
How slowly the soul sails
And, oh, how swift the ship!

Lindo!



(Ilustrações que abrem o post de "Eu Sou Construtor", livro infantil de Patryck Mayers. Ilustrações de Lucy Hawkinson.)






10/05/2008

HERÓIS DE CARNE E OSSO


Rufus, como eu o vejo.


Acabei de voltar do show do Rufus Wainwright em SP. Vi da primeira fila. Maravilhoso, mas eu não gostei. Eu adorei, mas foi meio chato. Hum, sei lá. Eu estava quase desistindo de ir. Não gosto muito de show, e quando gosto demais de um artista acho meio deprimente ir numa noite e só. A gente vê tanto pelo DVD, YouTube, etc, que a expectativa criada em torno de um show ao vivo pode ser meio frustrante, sei lá.

Não foi. O show foi exatamente o que eu esperava. E exatamente como estar assistindo um ótimo DVD, uma ótima performance dele. Talvez com a diferença de estar sentado ao lado de gente esquisita, de não estar no conforto da minha casa, de não ter um bom drinque e de não poder pular as faixas que eu não gosto. Enfim, não gosto de shows. Mas foi bom. O melhor, claro, são as surpresas, como a mãe dele, Kate McGarrrigle, cantando “Manhã de Carnaval”, num português bizonho. Foi lindo. A abertura de Martha Wainwright, irmã dele (com o Via Funchal ainda vazio) também foi bacana, embora ela seja folk demais (e o Rufus seja muito mais operístico, standard-jazz e tudo mais).

Agora, não superou (é claro) os dois maiores shows que vi na vida: David Bowie e Marina Lima no Auditório no Ibirapuera (hum... vamos deixar claro, foram dois shows distintos, Bowie não cantou com a Marina, ok?).


Resumindo, Rufus fez um show sem surpresas, e talvez intimista demais para o tamanho do Via Funchal (mesmo para quem, como eu, estava vendo de perto). Mas provou que é bom. Que é foda. Que é igual seus cds e DVDs. É isso.

Como esta foi uma semana cultural (e de encontrar meus heróis ao vivo), na quarta, fui assistir à palestra do Paulo Henriques Britto – grande poeta, grande tradutor, excelente contista - no Barco. Grande poeta, grande tradutor, excelente contista (novamente), e alguém que há um bom tempo eu queria conhecer. Já havíamos trocado alguns emails breves, e agora foi a oportunidade perfeita. Na palestra ele falou bastante do trabalho dele como poeta, como tradutor, um pouquinho sobre seus contos. Seu volume “Paraísos Artificiais”, lançado pela Cia das Letras, em 2004, é um dos meus livros de contos favoritos. E achava engraçado que, como poeta, Henriques Britto tenha um foco tão racional, estrutural, objetivo (o que o fez se definir como “poeta das coisas”), enquanto que como contista ele consegue ser tão subjetivo, afetivo, por vezes até etéreo (hehehe). Na palestra, ele chamou atenção para o fato de a maioria de seus contos terem sido escritos quando ele ainda era bem jovem, vinte e poucos anos; “hoje eu não conseguiria escrever essas coisas” – disse ele, reafirmando aquilo que eu sempre digo, que o escritor jovem pode trazer à luz algo que o escritor maduro perde.

Foi ótimo também estender a conversa com ele num jantar em seguida. Paulo Henriques é um grande, grande tradutor. Do ponto de eu ler um livro – quando eu ainda não o conhecia como poeta – traduzido por ele e me espantar: “isto aqui parece literatura brasileira.” Já traduziu quase 100 obras (a maioria para a Cia das Letras) e hoje pode ser mais seletivo nos trabalhos. Me contou que devido a problemas que teve pelo excesso de digitação, hoje faz todos seus trabalhos oralmente (!), dita tudo a um programa que transcreve direto para a tela. Para um poeta, isso deve ser incrível, deve trazer uma nova musicalidade aos versos.


Fábio, eu, Paulo Henriques Britto (ei, não estamos bêbados não).



Eu, como tradutor aprendiz (que não chego aos pés dele, admito, mas que gosto do ofício e tenho um longo chão a percorrer) pude debater pessoalmente algumas questões e paradoxos:

- Que palavras/expressões num texto podem ser mantidas na sua língua original? O que necessita de nota de rodapé? Até que ponto o tradutor pode/deve melhorar um livro mal escrito?

- Por dominar outro idioma, qualquer tradutor prefere (e recomenda) ler as obras em sua língua original. Desta forma, ele no fundo desaconselha a leitura de seu próprio trabalho, e está supondo que seu leitor seja menos preparado do que ele. Isso não é paradoxal?

(Paulo Henriques ainda me colocou que “a única pessoa que pode avaliar o trabalho de um tradutor é quem não precisa dele”.)

Podemos ainda trocar alguns causos da profissão. Enfim, foi uma noite bem bacana. Só me decepcionou um pouco ver que ele não tem planos para escrever mais prosa num futuro próximo.

E para terminar... Assisti “Homem-de-ferro”. Legal, né? Legal. Marvel de segundo escalão, claro, mas legal. Robert Downey Jr. está ótimo, charmoso, meio escroto, bem bacana. Só senti falta de um pouco mais de Homem-de-ferro (o herói), mas talvez isso seja bom. Talvez isso seja função do filme, deixar um gostinho de quero mais; melhor do que não agüentar até o final.





"Tam-tam-tamtamtam!" (isso é pra ser a onomatopéia da base de guitarra do Black Sabbath).


Que mais?





Bianca Bertolaccini e eu, no Loveland, depois do show do Rufus (por que eu tenho sempre essa cara de cínico ou de idiota?).


Eu só sei que as crianças continuam passando fome. Os velhos continuam sem dentes pra mastigar. E adolescentes anoréxicas vomitam em solo infertil sementes de macieiras que poderiam render o papel que imprimiria o romance do século. O romance do século! De qual, eu não sei - porque este nós já sabemos que não chegará ao fim.


06/05/2008

ESTRÁBICOS HISTÉRICOS E NARCISOS NÁUFRAGOS


Foto: Wendy Ewald - "I Dreamt I Killed My Best Friend, Ricky Dixon".



Semana que vem é meu aniversário. Estou pensando em fazer uma festa no MacDonalds, onde acontecerá de fato – pela primeira vez – o caso de uma criança ser picada por uma cobra na piscina de bolinhas. Sabe dessa lenda urbana? Então, no meu aniversário vai acontecer. Só falta arrumar a criança.

Deve ser a idade. Ou o que resta da juventude. Mas tenho tido umas sinapses assassinas, umas lembranças estranhas, vira e mexe me bate assim – tchum – uma memória de algum episódio fortuito, gratuito, de tempos remotos. Outro dia estava teclando aqui no PC e me baixou a lembrança exata – a sensação – de quando eu lia um livro sobre répteis no primário. Hoje, de madrugada, acordei lembrando uma frase frugal dita há quase quinze anos, pela minha land lady na Inglaterra. O que será que anda escavando essas minhas memórias? Será finalmente uma limpeza do excesso de drogas? Ou será que o excesso de peixe que tenho consumido está criando novas pontes, despertando neurônios esquecidos?

E hoje me lembrei como estava com saudades da Adriana.





Estava ouvindo o cd novo da Adriana Calcanhotto, “Maré”. É bem gostoso. Mais acessível do que o último dela – “Cantada” – menos pop do que o último de sua alter-ego, a “Partimpim”. E é bem coisa dela, meio melancólico, melódico, com algumas faixas mais alegrinhas que a gente ouve uma vez e passa o dia todo cantando: “um dia desses eu me caso com você...”.

(Falando nisso. Lembrei de uma vez que vi Adriana Calcanhotto no Programa Silvio Santos. Acho que ela foi receber um Troféu Imprensa. E o Sílvio é daquele jeito pimpão, né? Trata todo mundo como calouro. Ele: "Você é de onde?" Ela: "De Porto Alegre." Ele: "Minhas palmas, uma gaúcha!" - o auditório aplaudia. Ele: "E você é casada, solteira ou tico-tico no fubá?" Hahaha)


Continuando, hoje tive a oportunidade de conferir vaaaaaárias coisas novas da MPB na festa/gravação de aniversário do programa Metrópolis, da TV Cultura. Teve shows bem legais. Para começar, os novos Mutantes. Eu ainda não tinha visto nada deles depois da volta. Tinha medo. Mas gostei. Dá pra ter uma leve idéia do que devia ser na época. E hoje eles ainda soam BEM Mutantes, tanto as músicas antigas quanto a música nova, totalmente psicodélicos. Talvez, se dissessem apenas que era uma banda nova do Sergio Dias, seria uma banda ótima (mas daí não teria toda essa repercussão). Frente ao peso do nome “Mutantes” eles soam bem. Eu gostei. Lembra Mutantes, e Júpiter Maçã, e Pato Fu, e todas essas bandas que têm muito dos antigos Mutantes.

Falando em Pato Fu, gostei também do cd solo da Fernanda Takai. Acho a vozinha meiga dela um pouco fora de esquadro nas coisas mais pesadas do Pato Fu. Até prefiro o vocal do John – eu sei, sou o único. Mas nesse cd solo, de releituras do repertório da Nara Leão, ela se encaixa muito bem. É bem gostoso.

E quem lembra um pouco a Fernanda Takai – eu achei – é a Malu Magalhães, que eu também vi hoje ao vivo na gravação do Metrópolis. Já tinha ouvido falar (uma menina de quinze anos que virou sensação na Internet pelas músicas que ela fez em casa e colocou no Myspace). Nunca tinha ouvido o som. Gostei. Me lembrou várias, várias, várias coisas. Enquanto ouvia, fiquei tentando identificar – uma porrada de cantores folk, passando até por Pavement e Martha Wainwright. Mas ela tem belas melodias, uma voz doce, é bem bonitinha – e só tem quinze anos, pô. Acho que mandou muito bem, embora essa coisa de vozinhas folk não seja muito minha praia.

Malu, quer vir pra minha piscina de bolinhas?


Hum, que mais?

“Um dia desses ainda me caso com você...”


Ilustração de Alexandre Matos para "O Prédio, o Tédio e Menino Cego".

Oh, meu Deus, meu amor, meu querido, você não está tão bem hoje quanto poderia estar. Nós sabemos que você poderia estar melhor. Nós sabemos que sua franja poderia cair para outro lado. Nós sabemos, então, o que faremos? O que eu faço? Oh, meu Deus, meu amor, meu querido, como posso me arrastar por este dia assim, longe da perfeição heróica que eu sei, eu sei, existe dentro de mim? Oh, meu deus, meu amor, meu querido, como posso atravessar este espelho e fazer com que todos vejam o que está escondido lá dentro? O que eu já vi tantas vezes, tantas vezes, mas nunca na vez certa, nunca no momento exato, nunca quando eu me arrisco, quando eu mais preciso. Quando eu mais preciso essa franja cai assim, para o lado errado. Quando eu mais preciso, eu não consigo. Como posso mostrar a eles minha verdadeira face se nem você, oh, meu amor (Meu Deus!), meu querido, pode hoje refletir o que eu sinto?


(Não sou eu que estou dizendo - muito menos Thomas Schimidt. Esse aí é Lucas. Lucas! Vejam só, um novo nome - um tanto quanto previsível- para mais um de meus personagens. Um narciso vesgo, um tigre num aquário. Um estrábico lindo, olhando para si mesmo, com ambos os olhos, descalibrado.)

TIREM AS CRIANÇAS DA SALA

(Publicado na Ilustríssima da Folha deste domingo) Do que devemos proteger nossas crianças? Como não ofender quem acredita no pecado? Que ga...