22/08/2018

FIM DOS TEMPOS

Mediando Fernanda Young. 

Voltei para São Paulo depois de 4 dias em Extrema, MG, mediando mesas no Flex. Sinceramente, gosto mais de mediar do que de participar como debatedor, porque posso perguntar a outros autores o que me inquieta, o que me instiga:

"Até que ponto o escritor tem compromisso político com o momento atual, até que ponto pode tratar de questões íntimas, atemporais?"

"Como manter uma identidade literária passeando por diversos gêneros, diversos públicos?"


"Como falar das minorias e atingir um público mais amplo?"


Foram algumas das questões que pude discutir com Antônio Xexenesky, Débora Garcia, Flávio Carneiro, Luiz Ruffato, Carola Saavedra e Fernanda Young.


Com Sérvio Biscaldi e Antônio Xerxenesky. 

Fora as mesas de debate, sempre é ótimo estender a conversa com os colegas pelas mesas dos bares, do café da manhã e dos translados. Assim também pude conhecer o queridíssimo imortal Antônio Torres e a inesquecível Giovana Madalosso.

O público foi ok, alguns estudantes, escritores locais, autores das outras mesas. Tinha muitas atividades simultâneas, o que dispersava um pouco o pessoal. Acho que se os debates fossem colocados literalmente em praça pública, no palco, com os passantes - em vez de num clube fechado ao lado - integraria melhor a cidade. Mas valeu. 

Então voltei para São Paulo para entrar na polêmica literária da vez: Ronaldo Bressane, escritor e jornalista, expôs a prática dos booktubers de cobrar por "resenha" (um termo que eles mesmo usam) - ou seja, os autores pagariam para seus livros serem lidos e resenhados por booktubers "famosos". 

Os valores vão de 2 mil a 5 mil reais, dependendo de em quais mídias o livro é divulgado, e se é apresentado sozinho ou com outras obras, para "impressões pessoais, sem interferência do autor/editora."

Isso não é resenha, nunca será, e é uma prática perigosa, mesmo que se deixe claro que se trata de "publi". Expus os motivos no Facebook: 

Para mim, essa prática é a pá de cal na crítica tradicional, isenta, e uma ameaça à literatura como um todo.

Sabemos do espaço cada vez mais restrito para a crítica literária que, com a abertura desse espaço para divulgação paga, ameaça acabar de vez.

Quem se dispõe a pagar por isso está interessado apenas em divulgação, não entende o papel da crítica, e não está interessado que seu livro seja de fato discutido e analisado, apenas comercializado.

Anunciar um "publi" como "resenha" é um equívoco grotesco. Uma "resenha paga" pelo próprio autor/editora ou "publi" não tem como ser isenta. É óbvio que críticos de jornal/revista recebem, mas o pagamento vem pelo jornal (através dos anunciantes/assinantes). Isso faz TODA a diferença.

Aconteceu a mesma coisa anos atrás, com as rodas/vitrines de livraria, que eram feitas por indicações de livreiros e se tornaram pagas. Por isso hoje só se encontra merda exposta. Por isso literatura vende cada vez menos.

E acredito que esses booktubers alcancem apenas um público mais jovem, de literatura mais comercial, que acabará sendo a única que terá espaço.



Na postagem do Bressane, e em menor intensidade na minha, uma leva de bookminions, fãs de booktubers vieram defender a prática, com alegações que iam do você trabalha de graça? distribui seu livro então ou isso é papo de velho reclamando dos novos tempos. Mas não tem como se argumentar, explicar que "resenha" não funciona assim, que isso é "jabá", que, quando se mistura opinião-resenha-indicação com valores pagos diretamente pelos autores e editoras, se coloca em risco toda a crítica. 

"Ah, mas a crítica nunca é 100% isenta" - colocam alguns. Beleza, não é 100%, então vamos investir no 0%?

"Se você quiser anunciar seu livro na televisão, na revista, também vai ter de pagar." Mas livro nunca (ou raramente) foi "anunciado" em revista e TV. Como qualquer produto artístico podiam sair matérias, entrevistas, críticas (!), que não eram pagas. Eu nunca paguei por matéria alguma, entrevista alguma (e na TV estive por exemplo no Metrópolis, Saia Justa, Galisteu, Monique Evans, Arte 1, e Jô Soares - nesse 4 vezes). A discussão antigamente era se a gente devia receber cachê nas entrevistas.  

"Você quer ser divulgado, então que invista!" Queridos, o autor já investiu meses ou ANOS escrevendo o livro, sem receber. É um total desconhecimento de como funciona (ou não funciona) o meio literário brasileiro. 

Os valores em si, são totalmente inviáveis - as editoras muitas vezes não tem essa grana para pagar pela capa, muitas vezes não pagam nem 2000 reais de adiantamento pro AUTOR. É um total desconhecimento...

Mas isso nem deveria ser discutido, porque a prática em si de se pagar por "resenha", dez reais que seja, é totalmente anti-ética.

De todo modo...

Depois de muito discutir, refletir, passar por velho babão, acho que talvez seja mesmo uma alternativa. Se a crítica está morrendo, se há tão pouco espaço para a leitura isenta, não podemos lutar contra um espaço que se abre... Por mais que seja um espaço de gente canalha e oportunista. 

Terei saudades de quando meu livro saía e era discutido - às vezes massacrado - as estrelinhas que ganhava ou perdia. Que eu tinha um termômetro se ele era aceito ou rejeitado. Terei de me contentar se a editora achar que vale a pena investir nele, com as "resenhas pagas", para ao menos ele ser divulgado, comercializado, lido. 

A crítica literária séria já acabou. 

A crítica espontânea dos jovens apaixonados pelo visto também. 

Mas o Apocalipse está logo aí. 

Pagando os pecados e pedindo perdão em Extrema.

15/08/2018

ACONTECIMENTOS

Ilustração de Rogério Coelho. 

Neste final de semana estarei em Extrema, MG, no Flex, um festival literário sempre com muita gente bacana.

Grande time em 2016. 

Já estive lá duas vezes, com a curadoria original do querido Marcelo Spomberg, e agora volto para mediar mesas nos três dias, com Antônio Xerxenesky, Flávio Carneiro, Débora Garcia, Márcio Borges e Fernanda Young. O festival ainda terá Carola Saavedra, Luiz Ruffato e Antonio Torres, entre outros. Murilo também estará lá, coordenando a parte de gastronomia, com barraquinhas das escolas locais.

Programação completa aqui: https://www.flex2018.com.br

Conversando com leitores em 2015. 

Por enquanto é o ÚNICO evento que farei este ano fora de São Paulo. Talvez eu tenha esgotado com duas dúzias que fiz ano passado, talvez seja a crise pegando pesado, talvez já tenha passado minha época, eu tenha sido esquecido, desprezado, odiado, talvez tudo isso junto. Mas ao menos já tenho mais duas datas marcadas aqui mesmo na cidade, uma com Ivana Arruda Leite, em novembro, e outra com Marcos DeBrito, em outubro, (confira na aba "agenda", aqui do blog, que sempre atualizo por lá).

Há quinze dias, na Bienal.


Falando em DeBrito, estive com ele e Gabriel Tenyson há quinze dias, na Bienal, discutindo sobre literatura e cinema de horror e pós-horror, mediados por Antonio Sartini. Sempre é bom debater sobre o gênero - mesmo porque, eu consigo ser um outsider até nesse campo (meu destino é não pertencer); e se meu texto é reflexivo demais (ou "lento demais", "chato demais") para o terror convencional-comercial, agora tenho o pós-terror para chamar de meu.

No dia-a-dia, sigo com as traduções e na reta final de um novo romance, que seguirá uma linha mais histórica, e que ainda levará um tempo até a publicação.

Para os próximos meses tem meu primeiro livro infantil, um projetinho antigo com a Melhoramentos, que agora destravou. Deve sair ainda este ano. Será uma nova experiência, um novo público e uma nova parceria.

E que sobrevivamos a este ano funesto...Porque o próximo será pior.

NESTE SÁBADO!