23/03/2023

AMOR EM TEMPOS DE GUERRA



Esta semana reli O Diário de Anne Frank para um trabalhinho.

Impressionante como é mais relevante do que nunca – não só pelo relato de guerra, mas principalmente pelo enclausuramento, em tempos de pandemia, BBB... (Aquilo é BBB puro... er, imagino, não sei, nunca assisti a BBB, não estou dizendo que BBB tenha algo de literário...) (Curioso que o nome do programa tenha vindo de outro livro...)

Como obra literária, o diário também é uma maravilha, até pela própria consciência da Anne da importância histórica daquele registro, e suas ambições literárias. Mas é de se pensar o quanto foi editado, o quanto é cortado...

Ainda assim, é bastante ousado na questão sexual, contendo até fantasias lésbicas; natural para uma menina enclausurada em plena puberdade. Senti muito falta disso nos incontáveis relatos de sobreviventes do genocídio armênio, que li para a pesquisa do meu Fé no Inferno – a sexualidade parecia que podia ser freada pelos horrores da guerra. Talvez isso se dê principalmente por os livros serem escritos posteriormente, com intuito objetivo de publicação, não como um diário íntimo, como o de Anne; e talvez também pelo dogma religioso pesado dos armênios.

(Só encontrei um memoir do genocídio armênio que trata do despertar sexual em tempos de guerra de maneira deliciosa: Four Years in the Mountains of the Kurdistan, do Aram Haigaz – com um moleque-protagonista tarado que se apaixona por toda mulher que vê. Não tem tradução para o português, e eu adoraria fazer. Mas parece que o tema não interessa muito por aqui, vide o alcance do meu romance pela Companhia... Traduzi outro memoir sobre o genocídio – “A Um Fio da Morte”, do Hampartzoum Chitjian, que também não teve muita repercussão.)

Voltando à Anne, é lindo e triste. Ela consegue namorar e se apaixonar pelo único menino com quem tem contato, Peter van Daan, que inicialmente ela considera “um rapazinho molenga, tímido e desajeitado.” Fiquei pensando se Peter não seria gay, tão fascinado por estrelas de cinema, driblando as investidas de Anne...

Homossexualidade em tempos de guerra é ainda mais tabu. Mas no caso armênio há dezenas de relatos de transexualidade... ou ao menos cross-dressing, meninas que se passam por meninos para poder sobreviver, trabalhar, evitar estupros. “Durante a noite, seu ronco alto me acordou. Enquanto eu me esticava para mudar sua posição, fiquei espantado de notar que o menino era menina!” – narrou Chitjian no seu memoir (sem entrar em detalhes de como descobriu isso). Remete a histórias clássicas, de Zulvísia a Mulan, passando por Grande Sertão. (E obviamente também incorporei no meu Inferno.)

Terminando com Anne Frank, me lembrei de que visitei o museu-esconderijo dela, na primeira vez que fui a Amsterdam, há mais de 20 anos. Eu tinha comprado uns cogumelos... Achei que não tinha batido... Fui visitar o museu...
 
O que me lembro mistura o que li no Diário. Olhares atravessados de turistas. E gnomos.


21/03/2023

HOMEM TAMBÉM MENSTRUA?

Trevosa e barbuda na academia...


Há uns dias, tava vendo um filme em que uma menina adolescente reclamava das primeiras cólicas menstruais. Me bateu uma sensação estranha, porque eu sabia (ou achava que sabia) exatamente o que ela sentia, mesmo nunca tendo menstruado...

Cólica é algo exclusivamente menstrual? Homem também pode sentir? Mesmo homem que não menstrua? É uma lembrança de vida passada? Um apêndice como os mamilos? Mamilos são polêmicos para o ornitorrinco?

(Tenho mais peito do que muita mulher... Mas menos cólica.)

Daí hoje, na academia, no auge da testosteronice, bati com um peso nas partes íntimas... Senti a dor de ser mulher.

Para os homens que nunca sentiram (cólica), para as mulheres que nunca sentiram (as bolas): cólica menstrual é exatamente como a dor de acertar as bolas, só que em menor grau e duração contínua. Talvez como a dor que persiste alguns minutos depois.

O que significa que a mulher é um homem com o saco comprometido? É só uma teoria. Mas faz sentido...

(É o masculino que cresce sobre o feminino? Ou o ovo? Ou a galinha?)

Hoje pisamos em ovos para dizer o que é masculino, o que é feminino... Acho curioso que a nova geração adote tanto o termo “não-binário”, termos dos mais contraditórios, porque pressupõe que tem de haver uma caixinha específica para o masculino, para o feminino – que só pode se definir como homem ou mulher quem se enquadra em estereótipos.
 
Na minha juventude, na virada do milênio, no século passado, éramos “andróginos” – essa coisa de pintar as unhas, pintar os olhos, se montar. Um dos meus melhores amigos, um menino lindo e hétero, era mais mulher do que eu. Cogitava até fazer laser para acabar com a barba. Hoje é um tiozinho barbado (como eu), casado, pai de família, comedor de torresmo. Se tivéssemos 20 anos hoje, provavelmente seríamos não-binários... Como não tenho, estou longe de ser – mesmo com os cabelos compridos, mesmo com os olhos pintados...

(Sou só um emo, um emo velho. Mas infelizmente isso não contemplado em editais...)

Será que não-binário é só uma fase? Uma transição até se assumir mulher? Até desistir e se assumir homem? Ser homem é uma fraqueza de caráter? Ser mulher e ter o saco na lua? Existe velho não-binário? Existe não-binário há vinte anos?
 
Sempre me debati com essas questões, dos limites do masculino, do feminino, mesmo me reconhecendo como homem-cis-gay (Ou talvez por me reconhecer como homem-cis-gay). Meus namoros recentes, com meninas trans, me fizeram aprofundar... e levei a discussão para meu novo romance (quase em pré-venda). Acho um horror que a comunidade gay busque tanto essa hipermasculinidade. E acho triste que os meninos que se enxerguem minimamente femininos hoje tenham de se enquadrar como trans. A binaridade anda mais forte do que nunca. Mas onde há debate há esperança...

Neste final de semana, no MASP, fui ao banheiro. Só as cabines eram separadas para homens, para mulheres (e o melhor de ser homem é mijar de pé). Lavando as mãos, checando a maquiagem, comentei com a menina ao meu lado: “Que horror. Foi só o PT assumir que pintaram o museu de vermelho e fizeram um banheiro unissex...”

Infelizmente, essa nova geração ainda não descobriu o sarcasmo.


18/03/2023

SEJA UM AUTOR FRACASSADO SEM SAIR DE CASA!



Terminou hoje mais uma oficina, de cinco aulas, que dei por Zoom – “Como se Escreve o Romance Contemporâneo”, com participação da Andrea del Fuego, Raphael Montes e Alexandre Staut.
 
Adoro, mas detesto. É sempre bom conversar sobre literatura, saber o que os outros estão escrevendo, estão lendo, receber as dúvidas deles sobre escrita, sobre o meio, muita coisa que a gente, já avançado na carreira, toma como natural.
 
O saco é vender o curso em si, promover – e não só por ter de ficar enchendo o saco nas postagens, chamando aluno, patrocinando post, mas por “vender o sonho” em si, a promessa; tenho sério conflitos com isso.
 
Cada vez mais vejo gente aí vendendo curso, seja de literatura ou do que for, e sempre com essas promessas: Seja um autor de sucesso! Conquiste mais leitores! Você já pensou em viver de escrita? Acho uma picaretagem, me dá um mal-estar, que é difícil precisar...
 
Talvez seja um pouco por minhas frustrações pessoais com a literatura. Talvez seja muito por eu ter literalmente abandonado a publicidade para me tornar escritor (e agora o trabalho de escritor me obriga a voltar). Mas tem sido agonizante ver como a Internet tem cada vez mais obrigado TODOS a se tornarem publicitários, vendendo o tempo todo a si mesmos.
 
Instagram hoje só aparece conteúdo pago, “post patrocinado” e, além da venda de cursos, para mim o que mais aparece é rapazinhos sem camisa. O cara patrocina post dele na piscina. O cara paga pra você vê-lo sem camisa. É o povo pagando para ser famoso, ser amado, ser seguido.

Já tô velho demais para este mundo.

Nesses 20 anos de carreira (como escritor), me sinto cada vez mais perdido. Parece que no começo eu sabia mais o que fazer, como fazer e acontecer (e acontecia). Agora, a cada livro, encontro um terreno desconhecido (no anterior, foi a pandemia) em que tenho de repensar totalmente a maneira de promover um livro, de tentar chegar às pessoas.
 
Não tem chegado. (E não é nem o livro em si, é a “mensagem”, o número de seguidores que vai se tornando proporcionalmente cada vez menor, minha presença no meio literário, o alcance cada vez limitado...)

(Você já conhece a palavra de Santiago?)

Nunca dá pra confiar só na editora. Mesmo numa editora fodona, como a em que estou. O livro sempre depende do autor. A carreira é dele. É ele quem tem que fazer (escrever, divulgar, acontecer). Eu, em editora grande, tenho muito menos alcance do que muito autor da Patuá, da Nós, da Autêntica; gente mais bonita, malemolente e integrada. (O existencialismo bizarro é um projeto fracassado...)

Mas a gente segue, como sempre falo, porque antes de tudo (ainda) tenho muito prazer na prática, na escrita, na discussão sobre literatura. Um “coach literário” pode falar que estou fazendo errado. “O marketing não pode ser pensado só a posteriori, para vender o livro, Santiago. O marketing tem que estar na escrita em si, no texto vendedor...”

(Daí fodeu de vez. O existencialismo bizarro é, na verdade, literatura de autodestruição disfarçada.)

O que ferra é sempre o marketing. O que sempre ferrou e salvou minha vida foi mesmo a publicidade.
 
Por enquanto, não vai ter curso novo. Estou pensando em novos formatos, novas possibilidades, de repente presenciais, em outros lugares.. Vamos ver o que acontece.

Talvez estar em crise com a atualidade seja um sinal de que faço parte dela. Integrado ou não, estou pensando, agindo, e buscando alternativas para sobreviver nesse cenário. Talvez seja mais válido e consistente do que a bolha em que vivem os integrados, especialmente para quem quer criar algo consistente, que dure, que fique. A voz da literatura não deveria ser a voz dos outsiders?
 
Mas o que ficará daqui a cem anos, meus livros ou um canudo de plástico?

13/03/2023

MEDINDO MEUS PASSOS



A última atualização do meu iOS trouxe um aplicativo chamado "Fitness". Resolvi testar. Para ele me dar uma meta de calorias/movimento por dia, coloquei minha altura e peso.

"Tem certeza de que é isso mesmo, Santiago?"

"Claro que tenho!"

"Não é isso o que identificamos pelo nosso dispositivo... Você não vai chegar a lugar nenhum enganando a si mesmo."

"Ah, é?! Então coloca aí o que você identifica no dispositivo..."

"Bem, se você tiver até 80kg, pode PISAR no aparelho, que calculamos pra você..."

"Er, deixa como está..."

Agora o app está me deixando neurótico, literalmente calculando cada passo que eu dou, do banheiro para a sala, da sala para o quarto. "Você não está cumprindo sua meta, Santiago." Tenho que viver com o celular no bolso e ele nem é justo de fato; calcula o que eu gasto andando até a academia, mas não o tempo que fico na esteira! "Assim você não vai chegar a lugar nenhum, Santiago."

Ontem fui dormir cedo. Tive sonhos intranquilos. Acordei mais cansado do que dormi. Abri o aplicativo e já estava cumprida a meta do dia.

Estava lá registrado: Pico de movimento - entre 4:15 e 5:38 da manhã.
 
"Noite agitada, hein, Santiago?"

"Como assim? Eu tava dormindo...."

"Aham, sei."

"Sério. Fui dormir cedo. O que aconteceu? O que tu registrou aí?"

"Está de ressaca? Lembre-se de que a bebida prejudica sua meta..."

"Me conta! O que foi que eu fiz?!"

"Usou camisinha, ao menos?"

11/03/2023

OS FILMES DO OSCAR (que eu vi)



- FABELMAN: Filmão de Oscar mesmo. Exatamente o que eu esperava e não me provocou naaaada.
- AVATAR 2: Lindo de ver em 3D no cinema. E só. (Me deu uma dor de cabeça de dois dias...)
- CLOSE: Dos mais lindos e mais tristes de todos os tempos. Só acho muito rápido e desproporcional tudo o que acontece... Não dá para entender como as coisas chegam naquele ponto. 
- OS BANSHEES: Bacaninha. Um pouco enfadonho, mas bacaninha. 
- ELVIS: Outro filmão de prêmio, mas divertido. (Nunca fui fã de Elvis, mas o filme levanta bem o personagem, talvez até demais - ele é muito idealizado; fico pensando que na vida real o Elvis não devia ser aquele santo todo.)
- TRIÂNGULO DA TRISTEZA: Divertidíssimo, provocativo, mas o final decepcionou.
- TUDO EM TODO LUGAR: Chato, histérico, neurótico. Não aguentei nem metade.
- A BALEIA: Meio teatro demais, falta um pouco em cinema, mas bacaninha.
- TÁR: Meu favorito. Amei.

22/02/2023

MINHAS CINZAS


Perdido no povo. 


“Tem que aproveitar o carnaval, mas com Jesus no coração.”

Foi o que ouvi de transeuntes assim que saí de casa no sábado.
Segui o conselho. Aproveitei o carnaval com essa limitação.

Prometi ao nosso senhor que não beberia mais, não treparia mais, não seria mais feliz até resolver minha situação financeira/profissional. Já faz três meses. Tem sido curioso passar por todas as festas (Natal, réveillon, carnaval) sem beber, a gente percebe mais a embriaguez do outro. Mais complicado é festa em que NINGUÉM está bebendo, a conversa não flui legal. Melhor que eles bebam, e eu não.

A bebida não é um problema, por isso resolvi parar antes que se tornasse. “As pessoas só param de beber quando já é tarde demais”, li não lembro onde. Então parei antes. No meio literário, beber é meio obrigatório (por sinal, traduzi um livro bem bacana da Leslie Jamison sobre alcoolismo/abstemia entre escritores, “A Reabilitação”, para a Globo Livros). Beber ajuda no trabalho. Ajuda nos contratos. O problema é quando NÃO beber prejudica (na criatividade, na sociabilidade...). Sinceramente, não tenho sentido diferença. Só sigo na seca porque é mais barato. E a saúde agradece.

Voltando ao carnaval, é uma época difícil de controlar as vontades... Até fiquei bonzinho em casa. Até trabalhei na segunda. Até tentei maratonar filmes. Mas os trios na Augusta latejam até aqui: “Venha, venha, dê só um pulinho...”

É bom para o moral. 


Dei só um pulinho mesmo.

Lucas. 
         

Bastou ir até a esquina pra ver o trio de Bollywood, o trio da Salete Campari, a Rita Cadillac (de novo), e todo aquele povo... Aqueles jovens descamisados... Aqueles velhos também... Muito mijo e purpurina (isso não é um nome de um conto do Caio Fernando Abreu?). Não tive ousadia nem pra pintar o olho, sambei no máximo levantando os dedinhos. Nem beijei. Mas até que foi divertido.

Encontrando ex...
   

“Eu vou no trio pelas músicas”, me disse uma amiga. Não consigo pensar num motivo pior. Som horrível, com músicas que eu não gosto. (E se eu gostasse seria ainda pior, não tenho coragem de ir num bloco que assassina as músicas do Bowie). Também não fui pela bebida. Nem pelo sexo. Te digo, tenho um crucificado no coração.

Thi é amigo das amigas, de quando éramos clubkids...
 

Mas fui por boas companhias, no domingo, no “Explode Coração”. O Lucas De Assis Rossato o Marcelo Maluf, a Daniela Pinotti Maluf (que é a vereadora do carnaval). Acho que fui mesmo para ver o povo – não só os amigos, o povo mesmo, os corpos, as fantasias. É motivo suficiente e excessivo.

Marcelo e Daniela Maluf, casal 20 do carnaval.
 

Abri mão da felicidade para não enfrentar a decepção. Mas agora já passou. Passou o carnaval e o ano começou – queira nosso senhor. Que este ano não morro. No Halloween serei feliz.   

14/02/2023

O GATO OU O QUICO




Queria ter um cachorro...

Mas antes precisava de um marido.

É muita grana criar um bicho sozinho.

Fora que precisa de mais espaço. Para o marido e o cachorro.

Não ia aguentar um homem aqui o dia todo.

Ou um cachorro, pedindo pra sair.

Por isso que eu tinha coelho.

Mas os coelhos morrem cedo.

Os maridos também, quando a gente é gay.

Se alimentar direitinho, chega no máximo a uns seis anos.

O coelho e o marido.

O gato ou o Quico...

Não, com gato é diferente. Mas quem quer gato não precisa de marido.

Quem quer gato não precisa de amor.

Quem quer gato não precisa de espaço.

Mas eu preciso. Por isso nada tenho.

(Essas vontades não alimento.)

09/02/2023

BLOCO DO EU SOZINHO

Em outros carnavais...


Ai, os bloquinhos voltaram...

Investi tanto no apocalipse que agora não tenho mais condições de ser feliz.
 
Meu último carnaval foi em 2020, às vésperas do fim do mundo, eu faceiro-solteiro-sarado-esperançoso aproveitei como se deve. Subi no trio da Gretchen, puxei o cabelo da Cadillac, beijei desconhecidos e contraí sapinho.
 
Fui mais feliz no governo bolsonaro...

(Sou como a Regina Duarte, que foi mais feliz na ditadura.)

Depois, não teve mais o que se esperar, não teve mais pelo que lutar... Com a eleição do Lula, nem sou mais contracultura.

Agora não, não bebo mais, não trepo com estranhos, não tenho mais vontades.
Mas ainda gostaria de ter (tipo panetone, que ninguém gosta, mas se esforça.)

(Ou literatura brasileira contemporânea.)

Ainda tenho inveja dos que gostam. Só a inveja move meu bloco.
 
Para encerrar, uma questão vazia, só para provocar engajamento: Você é favor de oração nas escolas?

24/01/2023

GROW FOR ME

 


Ganhei essa linda planta no meu aniversário de namoro ano passado, há quase um ano. O namoro acabou há uns meses.

A planta resistiu bem – murcharam as flores, nasceram novas flores, ramos secaram, brotaram outros ramos -, até que, no saldo, foi mais morrendo do que vivendo, cada vez mais seca, como tudo por aqui...

Mas eu resisti. Sem namoro nem coelho, a planta era o que sobrava pra cuidar diariamente. “Vamos tomar um sol”, levava ela pra área de serviço. “Tá com sede?” colocava água. Ela nunca respondeu. Mas eu ainda tomava como uma analogia (ainda que batida) da minha vida. Quando melhorarem as coisas, ela vai melhorar. Quando ela melhorar, é sinal de que as coisas estão melhorando...

Agora parece que morreu. (“Não tava muito bom, tava meio ruim, agora parece que piorou”, como diz o poeta.) Uma mulher zelosa me diria para desistir. Mas fui pegar o vaso para jogar fora e senti meio quente, meio pulsante, pensei em todos os microrganismos que ainda podem estar aqui.

Talvez a planta ainda rebrote no tempo certo? Talvez os microrganismos tenham algo a me dizer. Eu posso continuar regando e esperando. Se música clássica não salvou minha planta, talvez haja esperança com Raça Negra?

06/01/2023

ABRINDO OS TRABALHOS...

 


Em fevereiro e março vamos discutir a escrita do romance. Serão 5 encontros (por Zoom) – 1 de introdução, 3 com grandes convidados apresentando seus processos de escrita e o último para debater os projetos dos inscritos. Teremos participação de Andrea del Fuego, ganhadora do prêmio Saramago; Raphael Montes, autor bestseller de policial e suspense, criador da série “Bom Dia Verônica” (Netflix); e Alexandre Staut, autor e editor especialista em descobrir novos talentos. Conduzindo o papo tem eu, Santiago Nazarian, autor de 12 livros publicados pelas maiores editoras do país. Informações no flyer. Mais detalhes por email. Inscreva-se já #oficinaliterária #literaturacontemporânea #romancebrasileiro

12/12/2022

MAIS UM ANO HORRÍVEL

Com Manal, leitora querida, na Bolívia. 


Não deu para ser feliz em 2022.

Foi  um ano muito difícil, de eterna luta, atrás de trabalho, de reconhecimento, de sanidade. Os trabalhos, que haviam se mantido estáveis durante a pandemia, desde o fim do ano passado começaram a miar, miar, e no começo do ano pararam de vez. Chegou ao ponto que eu não tinha mais pro aluguel, não tinha mais pros boletos, não tinha nem mais pra comer.

Tive que pedir help pelas redes, e a tristeza da situação só foi balanceada pela generosidade de alguns amigos, de muitos leitores e desconhecidos. Gente que me indicou para trabalhos, que me mandou ovo de páscoa, até pix recebi. No meio dessa crise, pifou minha geladeira, e uma querida surgiu do nada e me DOOU uma geladeira. Sem a bondade de estranhos eu não teria conseguido sobreviver...

(Tem gente que diz que eu só reclamo. Queria eu poder ser daqueles que é só gratiluz, que só compartilha sucesso e riqueza; quando eu posso, eu compartilho, mas tem sido raro... Por mais que seja constrangedor expor fraquezas e penúrias, se eu não exponho, nada acontece. Se eu não peço ajuda pelas redes, não arrumo trabalho, não tenho o que comer. Vivo sozinho, trabalho sozinho, todas as minhas relações são meio distantes. Meu único jeito de pedir ajuda é esse.. Só assim é que lembram que eu existo.)

Quando expus as dificuldades no começo do ano, muita, muita gente sugeriu que eu desse oficinas de escrita. Sempre tenho resistência - porque acho que é ganhar em cima do sonho do outro, com uma promessa que não leva muito a nada. Mas vamos lá, os boletos não param, então fui de oficina. 

Organizei nos moldes em que já dei, uma ou outra vez, não uma oficina de escrita, mas sobre escrever-publicar-divulgar, como funciona o meio literário e a carreira do escritor. (Muita gente me escreve com dúvidas sobre isso, mas na hora de PAGAR pelo conteúdo...)

A oficina que não foi. 

Criei dentro da plataforma da Balada Literária, do querido Marcelino Freire, e NINGUÉM se inscreveu. Tá certo que estava um pouco caro, R$ 600 pila por uma oficina não-presencial, mas deixou claro que oficina não é a solução. Alguns meses depois, em agosto, tentei de novo de forma independente, cobrando a metade do preço - assinei Zoom, patrocinei post, enchi o saco de divulgar - e consegui 8 alunos. Acabou sendo bem bacana, 4 aulas de 2 horas, todos os sábados. que sempre se estenderam além. Mas arrumar esses 8 alunos já foi tão sofrido, que se eu fizesse outra creio que ninguém mais viria...

Grandes discussões com alunos lindos. 

Tirando essas coisas que eu tive de inventar, quase nada. Dizem que os eventos literários voltaram com força, mas talvez meu momento já tenha passado. Não colhi nada de frutos das finais dos prêmios ano passado. Fiz DOIS eventos e só. Ao menos teve uns cachezinhos...

O Oceanos ao menos promoveu uns debates online (com cachê) e me chamou pro júri deste ano. O Jabuti cagou pra mim. 

O primeiro foi em maio, no Pantanal, a grande viagem do ano. Tive uma mesa no Festival América do Sul, em Corumbá (MS), que estava lotada e inesquecível. Consegui ainda dar um pulo (literalmente) na Bolívia, logo ao lado, atravessando a fronteira a pé, para almoçar carne de jacaré. Foram três horas fora do Brasil, mas posso dizer que fiz uma viagem internacional em 2022.

Ótima mesa no Pantanal, com Carla Maliandi e Márcia Medeiros, medidos por Wellington Furtado Ramos.

Em setembro, teve a segunda viagem. Uma turnezinha por três cidades do Paraná, pelo Sesc, que gerou ótimos encontros e papos. E foi só. Não viajei mais pra nada, férias, praia, nada. Nem na virada do ano, nem no meu aniversário - na virada do ano eu dormi e no meu aniversário não fiz absolutamente nada.

Ótimos encontros no Paraná. 

Todo esse tédio, toda essa depressão ajudaram na escrita, sim. Se passei quase dois anos sem escrever, em 2022 fluiu toda minha criatividade represada. (Mas é aquela coisa, as tristezas e decepções alimentam a escrita... que não alimenta nada... ou só alimenta mais tristezas e decepções...)

Sem ter mais o que fazer, nos primeiros meses do ano comecei e terminei uma novelinha, que foi vendida para a Companhia das Letras e deve sair no primeiro semestre do ano que vem. Tem uma estrutura bem diferente de tudo o que já fiz - estruturada só em diálogos - e é um retrato dessa geração atual, militante, não-binária, que sabe contra o que lutar, mas não o que defender. Será mais um grande fracasso... ou um fracasso mediano. 

Falando nisso, mês passado tirei do armário um infanto-juvenil que havia sido engavetado, "O Príncipe Precoce". Com a dificuldade de encontrar uma nova editora para ele, resolvi experimentar uma publicação independente, em ebook e impressão sob demanda, pela Amazon, com a parceria do irmãozinho Alexandre Matos nas ilustrações. NINGUEM comprou (bem, poucas dezenas, mas teve centenas de joinhas nas minhas redes). Ainda tá lá para quem quiser, baratíssimo, de repente uma hora engrena. Por enquanto, considero (mais) uma experiência fracassada. 


Em ebook aqui: https://www.amazon.com.br/Pr%C3%ADncipe-Precoce-Alexandre-Matos/dp/B0BLGDR995

Daí veio OUTRO livro, outro romance, que comecei a escrever mês passado. (Porra, entreguei romance pra Companhia em março, comecei a escrever outro em novembro - não tem nada de outro mundo; pra mim, escritor é quem ESCREVE.) Mas esse ainda deve levar um tempo. É um romance bem baseado na minha infância nos anos 80, talvez o mais próximo que eu já tenha chegado da autoficção. Por enquanto ainda está meio sem estrutura, os capítulos surgindo como lembranças, em ordens aleatórias, mas já engrenei na escrita diária, então acho que dá um livro, a médio prazo. 

De traduções, este ano fiz mais versões para o inglês, que pagam melhor (ou deveriam pagar), mas levam bem mais tempo pra mim. E só vieram coisas pequenas, infantojuvenis, trabalhos de 500, 600 reais. Fiz bastante tradução pra dublagem - que foi algo novo, indicação de um colega querido, que me deu essa puta força quando eu mais precisava. Mas também longe de me salvar, mais trabalhinhos de 500 pila. Tem vindo tudo assim, picado, que não cobre nem meu aluguel. A gente tem 20 anos de carreira, fala 5 línguas, se especializa, mas só surge trabalho de 500 pila. Estudar pra quê, né? Pra ser Uber!

E estamos aqui falando de trabalho, de falta de trabalho, de falta de dinheiro, mas e na vida pessoal? O que meu ano deu? (com trocadalhos)

Bom, eu nunca tenho muita vida pessoal, né? Se não acontece muita coisa na vida profissional, na vida pessoal menos ainda. 

Eu estava namorando, até dois meses atrás, mas tivemos que acabar. Fomos nos distanciando, nos víamos cada vez menos, e eu não reconhecia mais a pessoa com quem eu estava - e não foi só pela transição de gênero. Às vezes parece que a gente conhece mais a pessoa no começo do namoro, porque projeta tantas coisas, tem uma visão equivocada. Com o tempo, com a intimidade, a pessoa vai se tornando mais estranha, mais diferente, até você achar que não tem mais nada a ver com você...

Mas foi um término tranquilo, sem dramas. Ela é uma ótima pessoa e eu só quero que dê tudo certo, estou aqui para o que ela precisar. 

No momento, não penso em namorar nunca, nunca mais. Estou cansado, desesperançado, pensando em morrer e me aposentar...


Pequeno se foi. 

Não tem mais namoro e não tem mais coelho. Gaia morreu no final do ano passado e ainda faz falta. No começo do ano veio o Pequeno, coelho do Ayrton Montarroyos, que perguntou se eu não podia cuidar por uns meses. Foram 9 meses, um hóspede muito bonzinho, educado, que não deu trabalho nenhum, mas também não deu amor. Totalmente ao contrário da Gaia (e da Asda), ficava o dia inteiro quietinho, na dele, sem interagir. Ayrton enfim levou embora, há poucas semanas e não penso em pegar mais bicho nenhum. Mal consigo cuidar de mim...

E as perspectivas para 2023... São as piores. Sei que muita gente apostava na eleição do Lula, mas eu na verdade fui de Bolsonaro... MENTIRAAAAA (tô querendo me diplomar em auto sabotagem). Acho que ano que vem vai ser MAIS difícil, mais penoso. Lula pegou um país totalmente quebrado. Derrotado, Bolsonaro jogou um fodasse total, cagou na economia, mijou na educação (me pergunto em que condições Lula vai encontrar o Palácio da Alvorada). Não vai ser fácil colocar tudo nos eixos e acho que não dá para esperar felicidade em 2023. 

Em 2025... quem sabe. Mas eu não devo chegar até lá...


AMOR EM TEMPOS DE GUERRA

Esta semana reli O Diário de Anne Frank para um trabalhinho. Impressionante como é mais relevante do que nunca – não só pelo relato de guer...