O inimigo de meu inimigo meu amigo é? |
Não votei na Dilma.
No primeiro turno, votei PV. No segundo, estava fora do país.
Como a maioria, acho o governo dela catastrófico. Há muito antevia a crise econômica; costumava prever que, se o Brasil perdesse a Copa, a crise começaria no dia seguinte. Não levei em conta as eleições, que camuflaram o estrago por mais um tempo.
Ainda assim, se eu não entendia que incompetência e impopularidade eram motivo para impeachment, a forma como tudo foi conduzido me forçou ainda mais a apoiar o governo.
Sou um belo exemplo da esquerda caviar. Branco, nascido e criado nos Jardins, em São Paulo, só fui trabalhar depois dos 18. Nunca passei fome, nunca estudei em colégio público, sou formado em Publicidade e Propaganda pela FAAP!, veja só!
E como tive acesso à educação, li bons livros, aprendi línguas, viajei, conheci outras culturas, não tive a cabeça formada pelo pastor da esquina. Ao meu ver, não há contradição nenhuma no termo "esquerda caviar". Exatamente pelas oportunidades e experiências que tive na vida que não posso apoiar a direita fascista que aí está .
Já fui um imigrante latino, num sub-emprego como barman, em Londres, onde dependia exclusivamente do meu salário para comer e pagar o aluguel. Já vivi na Escandinávia, "o verdadeiro primeiro mundo", para saber como pode funcionar bem um governo de esquerda à beira do socialismo. Posso jantar num restaurante caro, e também me enxergar no lugar do garçom. Sou homossexual, e sei como a defesa dos direitos dessa e de outras minorias não é uma pauta da direita.
Por essas e outras que a vida foi me levando conscientemente para a esquerda, sem dogmas, sem tradicionalismos, sem uma "fé desenfreada", simplesmente experiência de vida.
Há muito a se questionar sobre o quanto o PT de fato cumpre suas promessas, porém isso não é o suficiente para eu apoiar quem promete o que eu não quero para o país.
Ontem, acompanhando a votação do impeachment pela televisão, fiquei horrorizado. Por um breve discurso já se podia ver como é baixo o nível de quem está lá. Um povo limitado, despreparado, sem noção. "Pela minha família, por Deus, por meu neto Gabriel", era o tom frequente dos discursos pró golpe. Exaltado pela vodca (faltou o caviar), eu me peguei gritando aqui na sala: "Ninguém dá a mínima pra porra da sua família!" São uns valores tortos, que dão a entender que eles não têm ideia do que estão fazendo. Estão defendendo sua religião, protegendo os seus. Salve-se quem puder.
Não votei em Dilma. Não votei em Temer. Mas principalmente não votei em Eduardo Cunha - que não só representa todo tradicionalismo e burrice que abomino, mas carrega nas costas todas as acusações de bandido sem vergonha.
Sou branco, privilegiado, até um tanto elitista. E se não apoio a direita é porque não tem condições mesmo...