A VIDA LOUCA DE MICHAEL LOVEMichael (ao centro) e sua patota.Michael Love sobre a visita da Marta Suplicy à Loca, em 2000: Eu tava querendo que ela fosse embora pra eu poder me colocar, pra eu poder ficar animada. Eu tava careta, bem fofa, não tinha tomado nada, e eu queria encher a cara e ficar bem bêbada. Eu achei ela muito fria, muito uó, mas educada, linda, poderosa, achei ela ótima, votei nela e é isso.
Haha. Trechinho do livro “Tragam os Cavalos Dançantes”, escrito pelo jornalista Lufe Steffen, contando a história do Grind, as noites de domingo da Loca.
(Para quem não conhece, o Grind é uma festa que foi criada há dez anos, na boate paulistana A Loca, pelo DJ André Pomba. A proposta da festa era tocar sons alternativos - principalmente rock, gótico, pop inglês – para o público GLS. Hoje em dia parece bem normal, mas na época não existia nada assim por aqui – havia as casas de rock alternativo com “tendências”, como o Madame Satã, Retrô, Torre do Dr. Zero, mas não eram abertamente gays, nem seu público podia se assumir.)
Bruno, Marcela e eu.
Meio estranho, hein? Um livro pra contar a história de uma festa semanal que ainda existe, numa boate que ainda não fechou? Exatamente. E faz sentido, para quem sabe a quantidade de histórias que já rolaram por lá (e, diga-se de passagem, pelo projeto hoje estar tão distante da proposta inicial). Aliás, apesar do Grind ainda existir, o livro trata da noite sempre no passado, com um tom saudosista, como se os primórdios do Grind (há apenas dez anos) já permitissem um distanciamento histórico. Isso é bem sintomático dos tempos nostálgicos e reciclantes que vivemos atualmente, onde se resgata o passado recente com uma estranha arqueologia pop.
Rody, Fábia e Theo.
Mas enfim, não sejamos tão rigorosos assim, o livro é bem divertido. Formado exclusivamente de depoimentos de seus freqüentadores (eu, inclusive) e funcionários, traz algumas boas histórias. Aliás, as histórias pontuais são o mais interessante do livro (mais interessantes do que a história da noite em si). Por ser uma biografia “oficial”, omite muita das coisas mais pesadas que rolaram (e rolam) por lá, mas ainda assim tem cenas bizarríssimas, como sobre as performances que aconteciam no palco:
Pomba: Decidiram proibir as performances. Tava realmente uma coisa radical, o Christian F., por exemplo, falando que ia se matar no palco....Tinha outro performer que queria matar um gato no palco, era o Dalton, que fazia um personagem chamado Isabella. Queria matar o gato e fazer uma possessão Quer dizer, tava ficando um negócio...
Aníbal (diretor da Loca): As performances deram muito trabalho, tive alguns problemas com os performáticos. Porque eram meio exagerados. Tinha um que queria matar um gato, matar um gato no palco. A gente falou: “não, de jeito nenhum.” Ele falou: “Não tem problema, o gato é meu!”
(Numa dessas performances teve um rapaz que acabou incendiado, cheio de queimaduras. Minha própria irmã fez uma performance lá uma vez, cuspindo fogo, mas ela é profissional...)
Marcela, Ambooleg e Leandro (do Multiplex).
Esses são os melhores momentos do livro, quando várias pessoas contam uma mesma história. Lufe articula muito bem os diálogos entre os depoimentos. Talvez por sua experiência como cineasta, ele consegue materializar bem os discursos e tornar vivas as experiências relatadas. Dá quase a impressão de ser um bom roteiro de documentário.
Pomba, tirando uma casquinha minha. Mas no final, o livro me deixou com a impressão de que poderia ter ido além. Talvez ter contado a história da Loca como um todo (não só do Grind), ter esperado o fim da boate, para revelar maiores podres,. ou até mesmo se concentrar mais na biografia de alguns de seus personagens ilustres. A hostess Michael Love, por exemplo, eu acho que daria uma bela biografia. E seria muito interessante saber como é a vida dela e de algumas figurinhas carimbadas de lá
FORA do circuito.
Alisson Gothz
Também poderia ser mais ilustrado, ter mais fotos. Tudo bem que isso encarece bem o produto, mas se poderia pensar numa edição totalmente ilustrada - incluir flyers, fotos de todos os personagens - ainda que em PB, principalmente pelas “figuras” que passaram por lá.
Eu e Alessandra.
E preciso dizer que os meus depoimentos são das coisas mais sem graça do livro – hahaha. Aliás, o livro às vezes toma um tom de coluna social bizarra que não deve ter a menor graça para quem não freqüentou o lugar.
Ambooleg, no banheiro (Polaróide PB)
Eu, é claro, estive desde o comecinho. Foi um lugar importante pra mim. Era realmente uma noite que eu freqüentava praticamente todo domingo, onde encontrava sempre as mesmas pessoas, formava amizades. Podia ir sozinho, porque sabia que sempre ia encontrar amigos. E o som era ótimo. Lá por 98, 99, era dos poucos lugares onde se podia ouvir David Bowie, Suede, Placebo...
Erika, Marcelo, Fábia, Pri e Nina (minha irmã).
Também era um lugar democrático, misturado. Voltado para os gays com bom gosto musical, e onde o estudante da FAAP ficava amigo (ou mais) da traveca da Zona Leste.
Cid, fulana, Marcelo Garcia, Thalia, Ambooleg, Adriano Cintra (CSS) e eu.
Hoje em dia, não sei. Me parece uma noite mais convencional. Também a novidade passou, surgiram várias outras casas iguais, uma multidão de mauricinhos invadiu o lugar depois que ficou hype... Talvez eu já tenha ido demais e não agüente mais ouvir “Groove is in the Heart”. Eu também deixei de ser tão baladeiro. Meu fígado não agüenta tanta bebida, tantas drogas... Faz uns bons meses que não apareço por lá, mas qualquer hora eu experimento, até porque moro do lado.
André e Marcelo SM
Então vão aí minhas melhores lembranças pessoais do Grind:
- Quando acabava cedo, tipo meia noite, acendiam as luzes, mas ninguém ia embora. Daí o Pomba tocava Ricky Martin, Trem da Alegria e todo tipo de tosquice... e o povo adorava (o que, basicamente, gerou a Trash 80’s).
- Quando minha irmã fez performance cuspindo fogo.
- As vezes que eu discotequei chapaaaaaado e errei tooooooodas as viraaaaadas.
- Quando a Tônia Carrero apareceu lá de pára-quedas e todo mundo achou que era uma drag.
- Quando a Gretchen fez show grávida de oito meses.
- A noite em que levei o DJ Tommy Turntables, meu chefe em Londres, e DJ do Popstarz, para tocar.
- Uma vez que encontrei uma jovem escritora e apresentadora brasileira... Ela olhou pra mim e disse em sua plena cariocagem: “Drogaxxxx, você tem drogaxxxx?”
Paula Rita (a "Apresentadora de Maiô") e uma outra que não sei o nome...
E este post hoje não é por acaso. Além do lançamento do livro do Lufe, A Loca está fazendo 13 anos. Estamos na véspera de um feriado aqui em SP, então de repente você se anima pra ir.
Mas não me chame.
Obs – Para quem quer comprar o livro, é uma edição independente, não se encontra nas livrarias e parece que só vende por email: tragamolivro@yahoo.com.br - Pois é, parece que ainda NÃO vende na própria Loca. Faz sentido?
Obs 2 – As fotos deste post não estão no livro, são do meu acervo pessoal.