Encontram-se nesta categoria [de “Mendigos culturais”] os artistas de rua, os atores de teatro, os músicos de bar e os escritores em geral. Todos artistas que têm de implorar por um pouco de atenção, por um pouco de reconhecimento, chamar o público como se estivesse pedindo um favor, pedindo desculpas, entregando sua obra de graça.
(Hum, mas confesso que acho sexy esses “palhacinhos de rua”, esses que jogam bolinhas, que fazem malabarismo. Tem uns bonitinhos aí pelos Jardins. Quero um desses pra mim. Quem sabe um atirador de facas? Quem sabe um engolidor de espadas? Cuspidor de fogo eu já tive. Cuspidor de fogo eu não quero.)
Nem coloco em questão o fato dos Mendigos Culturais não conseguirem viver só de arte. Esse não é o ponto. A questão é ter de mendigar um público. Obrigar os amigos, a família a assistir sua peça, deixar convite de graça, forçar a comprar o livro... Por isso tenho cada vez mais resistência a participar de eventos literários, fazer noites de autógrafos... (Festa de aniversário já não faço há anos, pior que mendigar público é mendigar amizade.)
A gerente da minha lavanderia sempre diz: "um dia você vai ser um escritor famoso", mas o que ela quer dizer com isso? Algum escritor de fato, alguma vez, consegue transcender a condição de mendigo? Será que ela reconheceria como famoso um autor como Milton Hatoum, que ganhou três Jabutis, um Portugal Telecom e foi traduzido pelo mundo a fora? Será que ela enxergaria Lygia como algo além de uma velhinha simpática? E será que João Gilberto Noll já teve de ouvir: "um dia você será o novo Paulo Coelho"?
Não, Dona Dirce, nós escritores seremos sempre mendigos, sempre precisaremos de leis de incentivo e apoios culturais. Sempre pediremos desconto na lavanderia, daremos nossos livrinhos de presente. E você nunca vai ler.
Um pouco sobre isso trata o filme “Nome Próprio”, de Murilo Salles, baseado na obra de Clarah Averbuck. No filme, a protagonista mendiga leitores, amizade e amor, tentando sobreviver apenas de sua escrita numa nova cidade. É bom. Ótimo até. Leandra Leal como Clarah/Camila está fantástica. E o tratamento naturalista do diretor funciona muito bem – me lembrou inclusive o (também ótimo) “Cão Sem Dono”, do Beto Brant, baseado na obra de outro jovem escritor gaúcho, o Daniel Galera. (Veja só, esses dois filmes aproximaram a obra dos dois, de uma forma que eu não consegui enxergar lendo os livros.)
“Nome Próprio” tem sido apresentado por alguns meios como “um retrato da geração blog”. Pode até ser, mas não é um filme da “geração atual”. O filme, apesar de tratar de uma realidade recente, já mostra uma realidade distante. Essa “geração web” já está conectada em banda larga, comunica-se em tempo real através de MSN e paquera pelo Orkut (todas coisas que não existem no filme). Qualquer filme que trate de realidade tecnológica, corre o risco de envelhecer rápido. E esse, por incrível que pareça, já tem um clima um pouco retrô. Mas esse pode ser um charme a mais. E o foco do filme não é a vida virtual, mas a vida interna da protagonista. Bem bacana.
Boo!
Outro que fui ver, claro, é o novo Batman. Achei um pouco chato. O Coringa é legal, e tudo, mas o filme é loooooooongo demais e continua sendo apenas um filme de ação. Um bom filme de ação. E eu não gosto de filme de ação. Meu Batman favorito continua sendo o “Returns” do Tim Burton, porque esse é mais um filme de fantasia, com um visual esplendoroso. Não sei quem vê aquela Gotham City do Tim Burton e pode achar melhor a Gotham City atual. O próprio Batman, hoje em dia é mais um ninja do que um super herói. Ele perdeu aquele ar romântico, irreal. Enfim, decepcionei.
(Mas, ok, o Coringa do Jack Nicholson ficou meio toscão. Meio seriado de TV demais. Esse novo é mais bacana.)
(Por falar nisso, agora me lembrei. Os produtores do filme "Nome Próprio" não fizeram uma campanha pedindo aos espectadores que assistissem o filme neste primeiro final de semana, ao invés de Batman? Não era uma coisa para garantir a continuidade do filme em cartaz? Muito bem, mais um para a categoria de Mendigo Cultural: cineastas brasileiros. )
Ao menos as coisas estão começando a melhorar por aqui. O cinema se diversificando, ao menos.
Embora tenha uns que insistam, né? Outro dia vi aquele trailler sobre o ônibus 174, dirigido pelo Bruno Barreto: "Contaram a história dos policiais, dos reféns, só não contaram a história do assaltante." Puta merda, vai ser desinformado assim na PORRA. Já existe um documentário longa-metragem de MAIS de DUAS HORAS contando essa história. Focando inclusive o lado do assaltante. Um documentário ótimo do José Padilha. Acho até desrespeito com ele fazer um trailler assim. Já deu, né? O povo não só não cansou de mostrar a realidade da favela no Rio de Janeiro como agora já está fazendo remake das histórias. Um pouco mais de fantasia, pessoal, um pouco mais de imaginação.
Mas algumas coisas ainda me dão esperanças...