22/05/2015
LITERATURA E CINEMA
Terça agora participo novamente do Sempre um Papo, dessa vez com meu querido amigo, bróder e supervisor Marçal Aquino.
Vamos discutir sobre literatura e cinema, o mercado de direitos autorais, as adaptações para as telas, técnicas de roteiro. Eu venho trabalhando cada vez mais com isso nos últimos anos. Marçal é dos melhores roteiristas do Brasil, já trabalhou em diversos filmes, atualmente é roteirista da Globo e está supervisionando o roteiro de BIOFOBIA, que estou escrevendo com Renato Ciasca. Eu vou ter de me controlar para não tomar o lugar de mediador, porque quero mais perguntar do que falar.
Também será aberto a perguntas do público e no final vamos autografar nossos livros mais recentes. Apareçam!
20/05/2015
O MESTRE CUCA E O COELHO
Nunca gostei de reality. Acho imbecilizante, não vejo qual é a graça de assistir um monte de gente burra confinada numa casa. Mas ano passado acompanhei toda a primeira temporada do Masterchef; Murilo era fã e me viciou– e ainda descobri que tinha uma antiga amiga, a Bianca, participando da disputa. Não sei nem se o programa pode se chamar de reality. É uma competição onde os participantes têm de fato demonstrar um talento – para a cozinha – onde o expectador aprende algo – sobre culinária.
Eu mesmo sempre gostei de cozinhar, vou além do
básico, já preparei até urso, alce, rena, quando morei na Finlândia. Mas o
Murilo é mais ambicioso, estudioso, leva a coisa mais a sério. E quando abriram
as inscrições este ano, ele decidiu participar.
Desde que nossa coelha Asda veio aqui para casa,
nos pegamos pensando se seríamos capazes de comer coelho novamente – nunca foi
das minhas carnes favoritas mesmo. Quando pensávamos no que seria um bom vídeo
de inscrição para ele, achamos que um prato de coelho seria um bom desafio. Murilo testou várias receitas e fez um divino. Colocamos
a Asda no comecinho do vídeo, meio como uma piada para chamar a atenção da
produção (já que nesse primeiro momento eles só poderiam ver, não poderiam
provar).
Funcionou. Eles gostaram do vídeo, chamaram o
Murilo e ele passou por várias etapas até ser chamado de fato para gravar o
programa. No dia da gravação, quiseram reproduzir a brincadeira que ele fez no
vídeo de inscrição. Relutamos um pouco, não pela segurança dela (ela ficaria comigo, na casinha de transporte, não
havia “risco” nenhum), mas pelo sensacionalismo. Murilo queria ser avaliado
pelo prato, não pela piada. Também era um pouco esquisito trazer um animal para
a cozinha. Como a produção insistiu, topamos. Convém dizer que eles fizeram
tudo para Asda ficar confortável e anteciparam a gravação do Murilo para ela
ficasse o menor tempo possível no estúdio.
"Quem ama come" |
Quando Murilo entrou para apresentar o prato,
fiquei do lado de fora. Então não tinha visto exatamente o que aconteceu lá
dentro. Mas entendi e gostei da mensagem que quiseram passar – de associar o
animal à comida servida, mostrar que aquela carne foi um animal vivo,
bonitinho, que poderia ter sido um pet, um membro da família. É um choque de
consciência, ou para se ter mais respeito pelo alimento ou para se tornar
vegetariano de vez. E se muita gente se choca com a ideia de cozinhar o próprio pet, convém lembrar que isso é normal para quem é criado em sítio, em fazenda...
Quem viu o programa ontem já sabe, Murilo ganhou o avental. E vocês vão poder ver como
de fato ele cozinha (se não puderem provar...). Torçam por ele. Asdinha está aqui, está bem e manda beijos.
15/05/2015
TREZOITÃO
Foi uma semaninha perfeita: mormaço durante o dia, frio e chuva só de noite. Fizemos trilhas, rodamos metade da ilha de bicicleta, comemos muito bem (camarões, lagostas, polvos), tivemos a ótima hospedagem da Ida na Pousada do Marujo, na Barra da Lagoa. Para mim esse é o tipo de viagem ideal: natureza, atividade física, conforto, boa comida… e um lôro.
Na Lagoa do Peri |
O bicho no mato.
|
Com Ida e Trishiya |
Não faltou, é claro, a clássica sequência de camarão. |
Falando em Murilo e comidas, quem já viu a chamadinha na TV já sabe. Murilo está no Masterchef Brasil, que estreia nova temporada terça agora, 22:30, na Band. Até a ASDA participou. É ver para crer.
Still do trailer. Será um tartar de coelha? |
Novo fôlego aos 38. |
08/05/2015
MINHA AVÓ
Dona Zília e eu, anos atrás. |
Hoje fui ao asilo visitar minha avó que acabou de fazer 89 anos. Levei lírios.
"Vó, sei que talvez seja tarde para contar isso, mas não poderia deixar a senhora partir sem saber realmente quem é seu neto. Eu... eu sou gay."
Comprimindo os olhos, ela diz. "Não posso entender tudo o que se passa no mundo de hoje. Mas para mim você será sempre a mesma pessoa, meu neto."
Eu me aproximo para dar um abraço e um beijo. Ela estende a mão.
"Não vamos exagerar, né? Sabe-se lá onde você pôs essa boca..."
Postei ontem de noite esse texto no Facebook. Acordei com centenas e centenas de polegares, comentários e compartilhamentos, que continuam crescendo.
Santiago, você é um cara gente boa demais. Não é de se estranhar que sua avó também seja assim.
Lindo momento esse que vocês dois tiveram
Vó sendo vó. HAHAHAHAH
Gay é um rótulo estranho. Vc é sim um ser humano maravilhoso . E vc acha que ela não sabia? Ela é uma graça!
Fofa pela aceitação e sábia por suspeitar do beijo hahahahaahahahaah
Muito forte essa história! Mostra bem - e com humor - as contradições nossas em lidar com as diferenças… de ambos lados, neste caso. Parabéns por contar publicamente, Santiago Nazarian!
Longe de ser uma história verídica...
Minha avó vem de família armênia, tradicional, conservadora. Nunca trabalhou.Viveu sempre com conforto rodeada de empregadas - "Ninguém pode dizer que sou racista porque todos meus criados são de cor" - é uma das frases antológicas que de fato ela verbalizou. Depois que meu avô morreu, há mais de vinte anos, ela passou a vida viajando pelo mundo (ou pelo "primeiro mundo"). Até que o corpo e a cabeça começaram a deteriorar e ela foi ficando mais e mais trancada em seu apartamento no Itaim Bibi.
Há pouco mais de um mês ela se mudou para um "asilo". Ou uma casa de repouso de luxo, de fato. Os filhos agora se desfazem de um apartamento acumulado de relíquias, recortes de jornal do século passado, moedas mortas, francos, liras, cruzados novos. A empregada que estava há mais tempo com ela - mais de quarenta anos - morreu três semanas depois de ser dispensada - diagnosticada e morta de câncer nesse curto espaço de tempo. Minha avó resiste aos 89.
Nunca falei abertamente com ela sobre minha sexualidade - porque jamais poderia falar de qualquer sexualidade com minha avó. Lembro de uma vez que, criança, levei um tombo e falei rindo "ai, minha bunda!" Fui reprovado por ela por falar uma "palavra feia". Minha avó deixou de assinar a revista Caras porque tinha muito anúncio de lingerie...
Ontem fui visitá-la no "asilo", levei flores (não levei lírios, que são para enterro), conversamos amenidades. Ela falou dos bisnetos, minha sobrinha ("tão loirinha"), surpreendi-me até de ela achar interessante poder ter um bisneto mestiço (uma prima minha acaba de se casar com um japonês).
A história sobre a "confissão" é apenas uma história. Inspirada pela declaração do Ziraldo, claro. Declaração infeliz, sem dúvida, homofóbica, mas de um senhor de 82 anos, de outro tempo. Reforça a reflexão de que um escritor, um artista, não precisa dar a opinião sobre tudo, não importa tudo o que ele pensa, e que caráter não tem nada a ver com talento.
Só não digo que continuo admirando Ziraldo como artista porque... nunca admirei. Sempre achei os livros dele um porre. Desde criança. (Com a Ruth Rocha - a crucificada da semana passada por falar mal de Harry Potter - já é diferente. Lembro bem Marcelo, Marmelo, Martelo como uma de minhas primeiras leitura prazerosas.)
Mas digo que continuo admirando Lobão como compositor, por exemplo. Só deixo de ouvir as merdas que ele fala de política.
Voltando à história da avó, me surpreendeu a repercussão. Acho que tem um pouco a ver com o momento, a ligação com o Ziraldo. E o povo gosta de uma história de aceitação, ainda que torta. (Se fosse mais piegas, talvez gostasse ainda mais.) Jamais seria aquela a reação da minha avó. Ela jamais entenderia ou aceitaria, mesmo tortamente. Mas eu continuarei visitando-a com flores, até chegar a hora dos lírios.
No final, a repercussão desse post me lembrou a história do JT LeRoy (de que já falei tanto aqui), da autora Laura Albert, que criou um personagem fictício, com uma história biográfica de sucesso, que fez sucesso por acreditarem ser real. É o "Paradoxo de LeRoy". Ao mesmo tempo em que ela se orgulhava de sua história, não podia assumir a autoria, pois revelada como "história" não teria o mesmo impacto. "A realidade é mais interessante do que a ficção" é uma falácia em que os não-ficcionistas querem acreditar.
Conversando com Laura "LeRoy" Albert. Grande autora. |
04/05/2015
O VOO DA LIBÉLULA
Resenha que assinei na Folha deste sábado:
"Esse aí deve ser uma maravilha", disse meu namorado ironicamente ao ver a edição de "O Voo da Libélula", enviada pela Folha, na minha mesa de trabalho.
O título um tanto quanto cafona não ajuda (o original francês, "Un Avion Sans Elle", se traduz literalmente por "Um Avião Sem Ela"). A chamada de capa também já afasta qualquer pretensão literária: "Duas bebês, um trágico acidente de avião, só uma sobrevive. Qual delas?"
Não se pode, no entanto, culpar a editora por vender o livro exatamente pelo que é: ficção cafona, barata e rasteira que justifica bem os "mais de 800 mil livros vendidos" (também com chamada na capa). É preciso avançar apenas algumas páginas para constatar de que tipo de romance se trata.
Fica a dúvida se a narrativa será divertida e instigante o suficiente para merecer a denominação de "page turner", daquelas que não conseguimos parar de virar as páginas até saber o final.
Infelizmente, "O Voo da Libélula" é moroso como mosca de padaria. Através de anotações de um detetive particular e ações acontecendo em tempo real durante a leitura dessas anotações, acompanha-se a história de "Lylie", a bebê sobrevivente de um acidente aéreo, que 18 anos depois ainda não têm certeza de sua identidade.
Lylie pode ser "Émilie Vitral", órfã de uma família humilde, ou "Lyse-Rose", herdeira de ricos industriais.
Sim, as 400 páginas do romance inteiro giram em torno dessa dúvida um tanto inverossímil. A partir daí pode se imaginar todos os desdobramentos novelescos: os ricos inescrupulosos tentando comprar a menina; a família humilde criando-a com dificuldades, mas com amor verdadeiro.
Uma das questões centrais do romance, inclusive, é o amor incestuoso que o possível irmão Marc Vitral nutre pela jovem. É uma colagem de estereótipos, com personagens bidimensionais que parecem ser descritos de maneira apenas a facilitar a adaptação cinematográfica.
O texto do detetive é tão policialesco que parece envergonhar até o autor, que se isenta, colocando personagens que criticam os recursos que ele mesmo se utiliza para manter o suspense.
O que pode se dizer de positivo sobre o "Voo" de Michel Bussi é que ele é bem planejado, sem turbulências, decola e pousa onde se esperava.
Afinal, acontece sempre em círculos, e a solução se torna bem previsível com uma área tão restrita para se manobrar.
O VOO DA LIBÉLULA
AUTOR Michel Bussi
"Esse aí deve ser uma maravilha", disse meu namorado ironicamente ao ver a edição de "O Voo da Libélula", enviada pela Folha, na minha mesa de trabalho.
O título um tanto quanto cafona não ajuda (o original francês, "Un Avion Sans Elle", se traduz literalmente por "Um Avião Sem Ela"). A chamada de capa também já afasta qualquer pretensão literária: "Duas bebês, um trágico acidente de avião, só uma sobrevive. Qual delas?"
Não se pode, no entanto, culpar a editora por vender o livro exatamente pelo que é: ficção cafona, barata e rasteira que justifica bem os "mais de 800 mil livros vendidos" (também com chamada na capa). É preciso avançar apenas algumas páginas para constatar de que tipo de romance se trata.
Fica a dúvida se a narrativa será divertida e instigante o suficiente para merecer a denominação de "page turner", daquelas que não conseguimos parar de virar as páginas até saber o final.
Infelizmente, "O Voo da Libélula" é moroso como mosca de padaria. Através de anotações de um detetive particular e ações acontecendo em tempo real durante a leitura dessas anotações, acompanha-se a história de "Lylie", a bebê sobrevivente de um acidente aéreo, que 18 anos depois ainda não têm certeza de sua identidade.
Lylie pode ser "Émilie Vitral", órfã de uma família humilde, ou "Lyse-Rose", herdeira de ricos industriais.
Sim, as 400 páginas do romance inteiro giram em torno dessa dúvida um tanto inverossímil. A partir daí pode se imaginar todos os desdobramentos novelescos: os ricos inescrupulosos tentando comprar a menina; a família humilde criando-a com dificuldades, mas com amor verdadeiro.
Uma das questões centrais do romance, inclusive, é o amor incestuoso que o possível irmão Marc Vitral nutre pela jovem. É uma colagem de estereótipos, com personagens bidimensionais que parecem ser descritos de maneira apenas a facilitar a adaptação cinematográfica.
O texto do detetive é tão policialesco que parece envergonhar até o autor, que se isenta, colocando personagens que criticam os recursos que ele mesmo se utiliza para manter o suspense.
O que pode se dizer de positivo sobre o "Voo" de Michel Bussi é que ele é bem planejado, sem turbulências, decola e pousa onde se esperava.
Afinal, acontece sempre em círculos, e a solução se torna bem previsível com uma área tão restrita para se manobrar.
O VOO DA LIBÉLULA
AUTOR Michel Bussi
TRADUÇÃO Fernanda Abreu
EDITORA Arqueiro
QUANTO R$ 24,99 (400 págs.)
AVALIAÇÃO ruim
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ENTÂO VOCÊ SE CONSIDERA ESCRITOR?
Então você se considera escritor? (Trago questões, não trago respostas...) Eu sempre vejo com certo cinismo, quando alguém coloca: fulan...