“Pode me dar uma opinião sobre um texto meu? É curto.”
Que pavor, que tensão, que responsabilidade terrível... Será que todo escritor passa por isso? Ler três, ou oitenta, ou duzentas páginas nunca é fácil . Sempre leva tempo. Sempre é um compromisso. Ao menos para mim.
Não tenho fórmulas, não tenho respostas, mas preciso encontrá-las. É diferente de ler por lazer, por estudo, até por trabalho. Numa leitura crítica ou resenha para jornal, eu dou minhas impressões – numa leitura para um colega eu preciso dar soluções. Ou ao menos sugestões, isso nunca é fácil.
Acabo de ler um desses. Um belo livro de apenas 80 páginas. E foram dias para ler, reler, tentar entender a estrutura, pensar em alternativas, colocar isso em palavras. (E claro, sem receber nada). Quando o livro é bom, é uma responsabilidade – será que estou à altura de sugerir algo? Ajuda simplesmente elogiar? Quando o livro é ruim, coloca-se em jogo o respeito e amizade – “Quem ele é afinal para criticar?” Bem, sou a pessoa para quem você enviou o livro.
Já tive amizades abaladas por isso. Falei o que o autor não queria ouvir. Talvez ele só quisesse elogios. Provavelmente só queria que eu indicasse uma editora. Desconfio que muitos que me pedem leitura nem tem mesmo porque me respeitar, nunca nem leram nada que publiquei. Só sei que quando recebo aquela típica mensagem de “Primeiramente, gostaria de te parabenizar pelo seu livro...” já estremeço, “também escrevo”, suo frio, “gostaria de saber se poderia ler um conto /capítulo /romance que escrevi,” eu sangro...
(Geralmente já paro no "primeiramente". Pavor. Fica a dica: nunca comece com "primeiramente...")
Quando aceito, fico com aquele arquivo latejando no HD. Enquanto jogo videogame, vejo um filme bagaceiro, enquanto me masturbo, sinto que há um escritor iniciante sentado na minha sala de espera.
Como autor, eu mesmo nunca sei para quem mandar, nunca quero pedir, incomodar. Sempre me admiro com os "acknowledgements" dos autores que traduzo - com dúzias e dúzias de nomes de amigos, colegas, editores, agentes, que leram "incontáveis versões" dos manuscritos. Talvez seja porque lá fora tenha alguma grana para as publicações, para as leituras críticas. Por aqui, muitos dos meus livros nem tenho certeza se o EDITOR leu; não gosto de pedir nem para meu marido, para minha agente, para quem ENCOMENDOU o livro. Imagina se posso me dar ao luxo de ter várias leituras, de diversas versões em processo. Sempre sinto que estou incomodando. Quem afinal se importa com o que tenho a dizer?