20/10/2022

NOTAS SOBRE O APOCALIPSE SILENCIOSO

Eu sou uma pessoa sem sonhos...

Há uns dez anos, na verdade, não tenho mais nenhum sonho na vida.

É errado viver assim? Seria eu mimado-spoilt por meus privilégios ou apenas #gratiluz pelo que já conquistei?

Ainda tenho vontades, ainda tenho prazer nas pequenas coisas, como escrever, cozinhar, ouvir música, estar em contato com a natureza, e assim sigo. Mas às vezes acho que estou “quietly quitting”, para usar uma expressão do momento. Apenas tentando sobreviver... ou morrendo aos pouquinhos.

Ou talvez as pessoas vendam uma imagem errada do que deve ser o sonho, né? Ser famoso. Ficar rico. Morar fora... Esse era um sonho, mas nos lugares em que eu sonhava morar, eu já morei. Agora talvez haja o sonho de um lugar para morrer.
 
Pode ser um sonho, sim, ter uma casinha num lugar tranquilo e viver só do que eu escrevo, das coisas que a terra adubada dá... Mas esse sonho não parece uma aposentadoria? Aposentadoria pode ser um sonho? (Bem, no país em que vivemos, parece uma utopia.) Aos 45 do primeiro tempo eu deveria ter sonhos mais grandiosos, ou tudo bem?

(Às vezes vejo aqueles programas de casas lindas no GNT, e fico pensando como eu daria conta, como cuidaria do gramado, como tiraria o pó de todas as superfícies... Ser feliz é muito trabalhoso e caro.)

Eu não tenho como sobreviver à velhice...
 
(Nem motivos.)

Às vezes tenho a impressão de que você precisa desejar muito mais do que vai obter, porque se não deseja muito, não obtém o mínimo. Para conseguir pagar as contas, você precisa querer ser rico. As coisas mínimas nunca acontecem pra mim por acaso, de surpresa; muito menos as coisas máximas...

Mas eu vivo sob uma maldição...

Quem já usou muita droga sabe que o mundo real não basta, mas geralmente quem usou drogas demais conhece um Inferno que eu não conheço. Eu desisti do paraíso, de mansinho.
 
Admiro os amigos convalescentes na luta, admiro a força e a vontade que eu não sei se teria. Se eu acordo de madrugada com dores no peito, se vejo uma pinta estranha no queixo, eu fecho os olhos e espero que me leve rápido; não precisa ser totalmente indolor, posto que é morte, mas que eu não tenha de gastar o dinheiro público.

(Também não tenho nenhum, nenhum desejo para meu velório-enterro-funeral, sempre digo. Façam o que for mais fácil e barato. Joguem meu corpo no lixo. Joguem aos cachorros.)

#quietqutting #gratiluz

MESA

Neste sábado, 15h, na Martins Fontes da Consolação, tenho uma mesa com o querido Ricardo Lisias . Debateremos (e relançaremos) os livros la...