ME GUSTA EL CHACHACHÁ
Gretchen boleten pisa no chicleten.
O que é um país malemolente, não petizada? Um escritor de respeito acompanha repórteres de uma revista de nu masculino ao show da Rainha do Bumbum, que já tem lá seus cinqüenta anos e... esconde muito bem a região do corpo que a consagrou!
Isso, sábado, show da Gretchen na Bubu Lounge. Ela sobe num palquinho improvisado, com uma calça branca quase até a altura do umbigo, bustiê branco à lá cantora do Calypso, e começa os hits de sempre, devidamente dublados. A gurizada toda levanta o celular, quase numa paródia hi-tech dos isqueiros de antigamente, e registra em fotos e filmes todo seu rebolado. Meu celular é objetivo, fala e escreve. Mas eu o uso para anotar cuidadosamente o set-list e as letras dessa poliglota das interjeições sexuais.
Gretchen agrada, faz sucesso, e me faz pensar que ainda hoje pode se apresentar em boates do Brasil todo com a casa cheia. Claro que ninguém leva a sério, nem ela, é quase uma cover velha de si mesma, mas assim parece mais fiel ao seu espírito do que nos anos 80, satiriza a breguice e a surrealidade de sua “música” e figura. Será que o Grupo Calypso estará fazendo o mesmo daqui a vinte anos?
Existe obviamente um carinho do público por essa que já é uma figura lendária da cultura popular brasileira. Em determinado momento Gretchen até sublinha uma nostalgia: “Essa música fazia as meninas aqui, quando eram pequenininhas, rebolarem de shortinhos. Os menininhos se escondiam no banheiro... e rebolavam também!” E começa a Melô do Piripipi.
Até quando Gretchen procura se mostrar “moderna”, com duas músicas novas, soa mais do que retrô: um “techno” com bases do começo dos anos 90 e coreografia de cabelon, como fazem os melhores travestis. Moderna mesmo ela consegue se mostrar ao apresentar sua filha Thammy no palco, que teve um breve período de aspirante a “Princesa do Bumbum” e resolveu se rebelar assumindo seu lado caminhoneira. Tudo no lugar certo.
Mas minha incursão aos insólitos palcos da noite gay não se restringiu ao “Freak Le Boom Boom”. Antes disso, sexta, acompanhei o show da travesti (como ela mesmo se denomina) Cláudia Wonder, no Glória.
"Não, isso eu não faço."
“Eu não sou uma dama, eu sou um travesti”- ela canta na sua faixa “hit” (“Travesti”), que não deixa dúvidas e dispensa eufemismos. Suas letras são sobre o underground paulistano, o submundo dos transexuais (ops, desculpe, travestis), como na faixa “Atendimento”, em que ela canta em resposta a uma ligação telefônica: “Faço. Faço. Não, isso eu não faço. Não, isso eu não faço.”
No caso de Cláudia Wonder, podemos sim levar a sério. Boas letras e ótimas bases eletrônicas (a cargo do duo Visavis). Talvez por isso mesmo jamais fará o sucesso de um Gretchen dos anos 80, mas afinal Wonder direciona-se para o underground, é mais elaborada e mais exclusiva.
E depois disso tudo eu repensei meus planos de colocar silicone num seio só, para contestar o falso equilíbrio do ser humano.
Hoho.
Para terminar, programa “Le Kitsch C’est Chic” de amanhã está especialmente chique. Temos entrevista com Esmir Filho, jovem cineasta, diretor de, entre outros, “Tapa na Pantera”, o primeiro clássico do YouTube. No som: Dan Nakagawa, Belle and Sebastian, Kwan, Fats Domino, Grace Jones e muito mais.
www.mixbrasil.com.br/radiomixbr (18h e 23h, terça)
(Gretchen no meu programa? Não, isso eu não faço.)