(Pichação sobre o viaduto Nove de Julho, SP)
A culpa é sua!!!
Me pedem para escrever sobre a eleição de Barack Obama, sobre a tragédia de Santa Catarina, sobre a vitória do Corinthians, como se eu tivesse opinião sobre tudo, ou uma opinião consistente, consciente, diferente, que mereça ser manifesta.
Eu passo meus finais de semana jogando Castlevania, minha gente...
Me pedem para escrever sobre a eleição de Barack Obama, sobre a tragédia de Santa Catarina, sobre a vitória do Corinthians, como se eu tivesse opinião sobre tudo, ou uma opinião consistente, consciente, diferente, que mereça ser manifesta.
Eu passo meus finais de semana jogando Castlevania, minha gente...
(Space-Space-Space-Firebombs, Firebombs-Firebombs-Space-Space, Space-Firebombs-Space-Space, Space-Heart-Axe-Space = Dracula)
E quando não falo mais nada, é porque concordo com você. Mas ainda rumino o pronunciamento em rede nacional do excelentíssimo Ministro Carlos Minc, da semana passada.
Teve toda aquela mensagem de “você pode fazer mais pelo meio-ambiente” (ou “o meio-ambiente é onde você está”, que parece ser o slogan que estão usando atualmente), que eu acho bem válida, isso se a sociedade já não estivesse totalmente equivocada nesse sentido, e o(s) governo(s) não contribuísse(m) ainda mais para fortalecer os equívocos.
O governo é espelho da sociedade, não foi planejado para ser revolucionário, nem fazer a gente pensar diferente. Não queira que um presidente de língua presa e quatro dedos aponte a você a direção certa. Você é que foi para a escola para isso.
A culpa é sua! E minha, nossa, do barraco que desliza a encosta, e do bebê que morre soterrado.
Sério, eu procuro ter consciência ecológica. Eu acho essa uma causa justa. Acho relativo proteger a família, a vida, até as minorias, mas não dá para ser niilista e querer destruir o planeta como um todo. E é isso que está se praticando, protegendo a família, a economia, até as minorias.
Foi isso o que matou os dinossauros.
Pisa! Pisa!
Chegamos agora à uma crise econômica mundial, montadoras quebrando, e o governo decidindo INJETAR DINHEIRO NAS MONTADORAS!!!
Puta merda. A culpa é sua!
Você que é o filho da puta que tira o carro todo dia da garagem, e prefere ficar uma hora no trânsito do que caminhar trinta minutos a pé. É longe? Não há transporte público? Você que prefere ficar uma hora no trânsito do que caminhar trinta minutos a pé...
Eu não culpo o governo porque o governo não tem culpa. O governo não tem personalidade, não pensa, não quebra nozes com os dente, são apenas as pessoas. E “as pessoas somos nozes”, eu, você e o Lula. E se você acha que políticos têm idéias próprias e exclusivas, então você acha que eles estão realmente acima. Saia da urna e vá para uma igreja. Reze para que Luiz Henrique da Silveira salve Santa Catarina.
A culpa é sua...
Que joga lixo todo dia na rua. Bituca de cigarro, que seja, que joga pilha no lixo, óleo na pia, não recicla seu lixo. Eu também não reciclo. Mas a culpa também é minha!!!
Aqui no meu prédio, não há coleta seletiva de lixo. É impressionante o que eu produzo por mês de papel (sulfite, limpo, reciclável), vidro (garrafas, vodca, que limpo até a última gota), adubo... Sinceramente me dói a cada dia que jogo 220 páginas de seu romance no lixo. Acho que eu deveria receber por isso. Acho que eu deveria levar cada garrafa de vodca ao mercado e só trocar o refil. Mas o que eu posso fazer?
Já toquei lá embaixo. Já avisei o porteiro. “Há algum catador de lixo – de braços torneados - alguém que vem buscar meu papel?” Eles não querem nem saber disso. Passo os dias na janela, fazendo aviõezinhos com seus poemas. Cada original que avalio, voa pelas ruas... e entope os bueiros, mata seus filhos. Cada frase sua ejetada tem mais efeito do que romances e romances que eu publico.
Os entusiastas da reciclagem dizem que é só um pequeno esforço, juntar as coisas em casa, e uma vez de semana levar a um posto de reciclagem. Levar como (?), eu me pergunto, de ônibus, de táxi, a pé pelo caminho da floresta? Não, DE CARRO!!!!
Quem utiliza o carro para fazer a reciclagem está tacando fogo em casa para matar as baratas.
Merchandising espontâneo, aguardando crédito em conta.
(Ah... Me esforcei tanto para criar uma alegoria melhor...)
Você enfiar seu palitinho de sorvete... no bolso, não vai adiantar mais nada para salvar o planeta. Precisa guiar o caminhão da Kibom para o fim da curva, atrás do barranco, no fundo do mar, numa cratera sem fundo.Vai ser necessário uma grande, filosófica, ideológica mudança de pensamento. Você vai ter de levantar a bunda da cadeira e caminhar, caminhar, caminhar (Isso eu já faço; e cansei de passar por “exótico” apenas porque caminho do centro até a marginal. Você faz isso de carro, eu sei, e leva mais tempo.)
Sem querer criar pânico, sem tirar gotas de chocolate do seu panetone, você precisa reformatar o seu cérebro.
Está chegando (já está passando, aliás) a hora em que vamos ter de ter a consciência ambiental como prioridade máxima. Você vai ter de tirar seus filhos do inglês, sua filha da ginástica, se não pode levá-los a pé. Vamos ter de usar papel-higiênico dos dois lados, e tomar banho de água salgada.
(Consciência ambiental não tem – feliz ou infelizmente – nada a ver com consciência animal. Vegetarianos e vegans são tão nocivos – ou mais – do que carnívoros nesse ponto. Não apenas pela questão do uso de poluentes – como o carro – mas pela praga da soja, a vaca dos desmatamentos.)
O que eu quero dizer é que é tudo paliativo, são todas medidas homeopáticas e equivocadas; se continuarmos com nossa alma de porco, nenhum gás nos fará flutuar. Eu acho que quem sonha com carro novo, com vitória de time de futebol e show da Madonna, não merece viver. E certamente está arrastando o país para sua cova. Está tudo interligado: carro – futebol – madonna – toda a ideologia dominante é que nos trouxe aonde estamos.
Sugiro a alternativa: patins – castlevania – sinéad o’connor.
Queria achar uma foto da Sinéad como Virgem Maria, no filme "The Butcher Boy". Não rolou, então fica só o Castlevania
Me desculpe, só podemos culpar os dominantes, se as alternativas (e patins, Castlevania, e Sinéad) não tiveram sua chance.
(Como leitura alternativa, sugiro “Sinal Fechado” Freire, Marcelino. Rasif, Ed. Record, 2008. Ouvindo: "Nothing Can be Done", Joni Mitchell)