26/08/2010

APERITIVOS...


“A ilha há muito estava encalhada na mancha negra do mar. Sem peixes nem possibilidades. O barquinho pesqueiro de Sebastião atracado a cracas. Sua barraca à vista de vista nenhuma. Ele e sua esposa vendendo cerveja, vendendo torresmo, vivendo de um bar pequeno quase sem clientes, praticamente sem peixes, sem camarões consistentes nem iscas de mariscos para servir aos turistas. Sem temporadas. A riqueza do petróleo, as promessas de outrora se dispersaram numa mancha ocre por toda baía. Ninguém entrava, ninguém saía. Até a visita de um navio fantasma.” - Eu Sou a Menina Deste Navio

“O guepardo continuava olhando para mim. O guepardo continuava me olhando com aquele olhar de guepardo. Você sabe como olha um guepardo? Com aquele olhar desconsolado. Como se te jantar fosse um destino inevitável. Como se chorasse a carnificina que há em sua sina. Algo como lágrimas de crocodilo. Por isso seus olhos pintados. Nada de crueldade. Nada de sadismo. Te como com lagrimas nos olhos, lhe diria.” - As Vidas de Max

"No meu aniversário de catorze anos, ganhei um buquê de lírios. Achei lindo. Primeira vez que eu ganhava flores. Presente do meu primo Paulo – primeira vez também que ele comprava um presente com o próprio dinheiro. Mas minha mãe disse que eram flores fúnebres, flores de enterro. Não me importei. Aos catorze anos a ideia de morte me era tão abstrata quanto a fotossíntese, e certamente quando eu morresse não faria diferença para mim quais flores estariam sobre meu caixão. Os lírios mereciam minha gratidão. Coloquei-os num vaso antigo que nunca servira para nada, e dentro do meu quarto, sob a janela, ao lado da minha cama." - Trepadeira

"A cidade não tinha cinema. Não tinha teatro, nem boate, nem shopping. Os velhos e os solteiros ocupavam os bares. Os shows eram raros - no clube ou num palco montado na praça – shows de cantores sertanejos. Para as famílias, o ponto de encontro era a igreja. Para os adolescentes, restava apenas o cemitério." - Marshmallow Queimado

"Eu vou e volto. Voltamos em silêncio, um de frente para o outro, na sala. A vodca está fazendo efeito e até Scott Walker parece embargado. Lá fora, nada se ouve. Onde estão os zumbis? Diabos, onde está nosso drama? Não é possível que o apocalipse seja assim, tão silencioso. Costumávamos ouvir rojões na Avenida Paulista. O mundo comemorando, torcidas e foliões festejando, e nós achando que eles estavam apenas tudo implodindo. Como uma partida da Copa do Mundo pode gerar mais ruído do que o Armagedom?" - Apocalipse Silencioso


"Sou apenas um turista. Visito as cidades e passo por você. Passo por cima. Você é meu ponto turístico. Mas não te conheço a fundo, nem depois de pernas abertas, nem depois de ânimos e hormônios decantados. A gente pode visitar uma cidade e se hospedar num hotel. A gente pode visitar museus e comprar souvenires. A gente pode até penetrar numa moradora local. Mas só se sente realmente em casa quando experimenta uma vida inteira, e uma morte por lá. Por isso eu mato." - Você É Meu Cristo Redentor

"O Príncipe caminhava mancando sobre poças de sangue. Lágrimas nos olhos, suor e cansaço, todos seus soldados estavam mortos. " - "Todas as Cabeças no Chão, Menos a Minha!"


Trechinhos de contos do meu próximo livro. Isso, não falei aqui? Será meu primeiro livro de contos, contos longos, ou um livro de histórias. Alguns são basicamente contos de fadas, a maioria é praticamente conto de terror; tem zumbis, vampiros, lobisomens, dragões, príncipes, navios fantasmas, jacarés e piranhas assassinas. Não é um livro juvenil. Bem menos humorado do que os anteriores. É um livro bastante sexual. E as histórias todas podem ser contadas antes de dormir, ou numa mesa de bar, não fazem sentido apenas escritas. Ou lidas. São contos de enredo. Catorze contos de enredo. Ou histórias. Histórias de sexo e morte. E espero que também satisfaça aqueles que me pedem: "tem algo pra adaptar pro teatro?" "Tem algo pra adaptar pro cinema." Espero que satisfaça todos aqueles atores e diretores que me procuraram dizendo: "Gosto muito dos seus livros; não quer escrever comigo um roteiro da MINHA história?"

O livro se chama PORNOFANTASMA, que é o título de um dos contos e o conceito de todos; já estou trabalhando com o Alê na capa. Será uma foto. O lançamento... prometido pela Record para o primeiro semestre de 2011. Vamos ver. Estou trabalhando no último conto, entrego daqui a um mês.

Pensa que minha vida é só kitesurf?

ENTÂO VOCÊ SE CONSIDERA ESCRITOR?

Então você se considera escritor? (Trago questões, não trago respostas...) Eu sempre vejo com certo cinismo, quando alguém coloca: fulan...