27/01/2013

ON THE ROAD

Leo à esquerda, eu à direita. Hum.

Leo é um menino bem bacana, que escreve bem, e não só faz um blog sobre carona como cai na estrada para alimentar o blog, ou alimenta o blog porque cai na estrada, viaja na ponta do polegar e tem muita história para contar.

Conheci em Floripa, na virada do ano, pela minha querida amiga-amada Pira. Ele que vinha saindo de Belo Horizonte, a caminho de Buenos Aires, tudo na base da carona, agregando amigos. Depois dos dias que estivemos juntos, continuei seguindo seu percurso pelo Facebook, pelo site dele, com muita admiração, e uma certa inveja.


Nunca tive esse desprendimento. Nunca poderia viajar assim. Já viajei muito, e me hospedei em casa de muitas pessoas, mas essa nunca foi a prerrogativa. Na verdade, se eu posso escolher, prefiro ficar num bom hotel... com banheira. Eu sou fresco, admito, mas admiro quem não é. E admiro um menino bonito como o Leo, que está vivendo o auge da vida, viajando e documentando em grande estilo.

Então este é o post para passar o site dele, que se tornará um link fixo (detalhe que grande parte dos meus  links fixos são de escritores que só citam nomes de livros e restaurantes e falam que estão de férias até março. Vocês deveriam se envergonhar. Rá!)

http://leocarona.com.br



24/01/2013

Eu não moro em São Paulo

Um caminhão de leite capotou na marginal Pinheiros. O tráfego foi interrompido. O trabalho de resgate foi lento. E um longo congestionamento se espalhou pela pista expressa, pela pista local e pelas cercanias...


Mas eu não passo por essa via. Não tenho carro nem uso o transporte público. Quando saio de casa, é com meus próprios pés. Eu não me preocupo com o trânsito nem com a greve do metrô. Trabalho em casa. Moro sozinho. Todos os meus principais destinos estão restritos a esse bairro, essas ruas, dando a volta no quarteirão...


Acordo tarde e vou dormir de manhã bem cedo. Não faço fila na hora do almoço, nem volto para casa na hora do jantar. Eu não tenho medo da chuva ou do alagamento; moro no décimo andar, acima, alienado, alheio.

Essa cidade que você reclama não é a minha. Esse drama que você vive não me foi escrito. Espio tudo de longe, de leve, não me arrisco. Se não enfrento os perigos da cidade, como poderia conhecer suas delícias?

Nós freqüentamos a mesma livraria, mas chego quando está vazia. Fazemos compra no mesmo supermercado, mas eu vou tarde, de noite, de madrugada. Nós temos os mesmos gostos e procuramos um pelo outro, mas a gente nunca se cruza na mesma hora, nas mesmas rodas, nessa sua cidade, eu não moro aqui.

Ainda assim, eu conheço você. Imagino seu rosto, ouço sua voz em meus sonhos. Estamos sempre à beira um do outro e do abismo. Basta um acaso, um esbarro, que a gente se encontra ao mesmo tempo, no mesmo destino.

Preciso de um acidente, de uma armadilha. Prender você aonde eu possa chegar. Minhas palavras como mensagem na garrafa, jogada de uma ilha. Como um bumerangue, uma isca, um cão farejador para te resgatar.

Você mora em outra cidade. Você vive outra vida. Você vive em outros tempos, paralelos. Quero que venha morar comigo.

Eu não moro na sua São Paulo. Eu moro aqui, eu vivo sozinho. Vivo quase à beira, à margem, em outra cidade. Quero que venha morar comigo.

Um caminhão de leite capotou na marginal Pinheiros. Não houve feridos.


(Minha homenagem ao aniversário da cidade. Publicado originalmente na revista da Folha, em 08/06/2008. O mais bizarro foi que, dias depois, uma menina desconhecida me ligou às seis da manhã, conseguiu achar meu telefone, e acreditava que o texto era para ela. Preciso ter mais cuidado com o que meu bumerangue traz.)



16/01/2013

RASTEJANDO


Garoto maldito ou menino cego? (foto Rafa Rocha/Noize)

"Você deveria escrever outro tipo de coisa, mudar totalmente o estilo," dizem senhoras que gostam de mim, mas não gostam exatamente da minha literatura. Ou "parou de escrever aquelas coisas com zumbis?" me disse certa vez Marçal Aquino (sorry, Marçal, nunca vou me esquecer...). É gente que até acha que tenho talento, mas estou desperdiçando com bobagem. Eu acho o contrário, que falta "bobagem" escrita com talento. É meio por aí que eu vou. É meu "existencialismo bizarro."

Os conselhos mais valiosos, que me dão mais força e me fazem continuar, vão na direção contrária, de gente que acredita no que eu faço, como o Marcelino, minha mãe, ou a minha agente. Certa vez ela disse: "Você não é mainstream. O que você faz não é o que interessa ao meio literário agora, mas você tem de fixar sua personalidade, que as coisas mudam e o que você faz pode ser a grande coisa daqui a dez, vinte anos."

Pois é, a carreira literária é longa e o difícil é viver o dia-a-dia.

Lembrei disso porque a mesma coisa me disse uma produtora hoje, depois de uma reunião de roteiro. "Você tem de seguir fazendo o que você já faz, porque é isso que vai marcar sua personalidade e as pessoas vão te procurar por causa disso." Eles me procuraram por causa disso, um roteiro de uma série (de que ainda não posso falar), me procuraram por causa da pegada trevosa, o humor negro, kitsch.

Nos últimos anos, tem sido melhor escrever por encomenda. Garotos Malditos foi meio escrito sob encomenda, por mais que o projeto tenha sido criado por mim, fui pago para escrever, tinha um prazo para entregar, etc. A questão não é só a grana, a questão é sentir que o texto é esperado, solicitado, desejado.

Essa coisa de o escritor criar sozinho, ter total independência e materializar seu universo interno é lindo, no começo, mas para mim tem só trazido frustração - quando se vê que não muda realmente o mundo, que não muda nem a literatura, que vende pouco, que as pessoas tratam com o descaso de "mais um livro". Os próprios editores, na maioria das vezes, tratam o autor com tanto desdém, como se fosse um favor publicar seu livro. E, no começo, é tudo tão bonito, cada micro-resenha em jornal, cada GRANDE resenha. A gente imagina que será diferente...

A crise é da escrita, mas não se restringe aos livros. "Já pensou em escrever peça?" sempre me perguntam. "Você deveria escrever letra de música", até já me disse Antônio Cícero, e eu escrevo. Tem também os roteiros. Mas o escritor antes de tudo escreve livros - é sempre mais gostoso fazer livros. E a crise não está no formato, está na autoria.

Eu tenho achado que as pessoas estão cada vez menos interessadas no que eu mesmo tenho a dizer, então é melhor que me encomendem - seja o que for. Se tiver uma intersecção com o que eu faço, se eu conseguir trazer para o meu mundo, eu escrevo. Gosto desses desafios. É lindo os emails que recebo quase diariamente de leitores, mas como um bom negativista, digo que "o peso das derrotas é maior do que o das conquistas", e tenho um bom número de derrotas para me afundar. Principalmente porque já tive mais leitores, já tive mais vendagem, até já me encomendaram muito mais textos. Sei bem que não dá para se estar sempre no auge, mas entre saber e querer há uma diferença. E é triste chegar a dez anos de carreira numa curva decrescente.

Sinto que fazer diferente não faz diferença. As pessoas querem é se identificar, e eu não me identifico com quase nada.  O que eu tenho a dizer vai continuar causando estranheza - ou resistência - seja em livro, música, teatro ou roteiro. Melhor contar a história dos outros; ao menos paga minhas contas.

É nessa crise existencial-literária que cheguei aos 35 anos, 7 livros publicados. Achando que não conquistei muito além da aura de "Garoto Maldito", e já não sou mais garoto.

A pergunta agora é: "Aonde quero chegar?" [Instalação: Santiago Nazarian/Alexandre Matos, Sesc Pinheiros]

10/01/2013


PARA QUE SERVE UM BLOG


Parece que o povo esqueceu. Eu sei que não é mais o formato da moda. Mas para que manter um blog? Para o que o povo anda usando atualmente?

O blog lá no final dos 90 começo dos 2000 era um diário, desabafo, mural de jovens em crise existencial. Bacana. Legal que jovens em crise existencial tivessem um mural. Isso depois foi diluído nas redes sociais e essa função perdeu muito de sua função. Mas para mim, o blog ainda arquiva melhor os momentos importantes, as datas significativas.

O blog sempre foi um mural democrático para o usuário registrar sua opinião – sobre a vida, um filme, um livro, um evento. Servia aos críticos amadores e aos protestantes de ocasião. Um espaço para se expressar uma opinião às massas sem precisar passar pela edição de um jornal, de uma revista. Neste ponto é que eu acho que os blogs continuam mais vivos.

Os blogs continuam vivos atrelados a jornais, como colunas opinativas. Perdem um pouco do seu caráter independente. Mas ninguém quer mesmo estar sempre independente, sozinho, alheio...
Eu tenho este blog ultra independente há NOVE anos, veja só. A Raquel Cozer  (Folha) já tirou sarro por ser um blog 2.0. “ultrapassado” – hohoho – mas não é essa a graça? Para mim, a maior graça é essa de ser o mesmo blog há tanto tempo, por eu mesmo poder revirar o arquivo e achar tantos registros antigos, tantas impressões estranhas. A graça é eu poder fazer tudo sozinho (bem, com a ajuda de poucos amigos, como Alê, que deu um tapa no layout há 4 anos) . CONTINUAR é que me dá mais força, como um registro pessoal mesmo.

O blog não tem comentários porque eu não quero. Já teve. Na época, eu era um autor emergente e o anonimato fazia com que o povo aloprasse. Eu ficava mega, mega deprimido. Era muito trabalho filtrar os comentários. E hoje já há tantas outras opções para comentar. Não é necessário.

Já pensei em terminar várias vezes, é claro. E muito pelas pessoas que escrevem: “Adoro o que você escreve. Nunca li nenhum livro seu. Mas amo seu blog.” As pessoas se contentam com isso. Nâo que sejam coisas concorrentes, mas eu vejo meu blog como... como se eu fosse um massagista. E tivesse um blog. Daí escrevo sobre meu dia-a-dia de massagista no blog, sobre minha vida, daí o povo vem falar que é meu fã sem nunca ter sido massageado? Eu não entendo.

Não, o que eu escrevo aqui não é o que eu escrevo nos meus livros. Eu escrevo ficção. Não tem nada a ver com isso. É outra coisa, é outra linguagem, completamente diferente. Aqui não é trabalho, eu não tenho tanto cuidado, não estou criando personagens, não estou criando histórias, não estou fazendo literatura. Às vezes escrevo bêbado, não me preocupo tanto com o resultado final.

É esse povo que se diz “fã do meu blog” que me faz querer acabar com tudo de vez, admito. Posso estar sendo injusto. De repente minha ficção é insignificante, como vou saber?  De repente sempre sofri de um mau marketing/distribuição dos meus livros.  Mas sempre esperei que o blog fosse um veículo de leva-e-traz com minha obra impressa.

Porém... Porém o que me deixa mais frustrado é ver como hoje estou numa cruzada solitária entre os blogs de autores. ONDE ESTÃO? PARA ONDE FORAM? É claro que ainda há escritores com blogs por aí, mas fazendo o quê?

Eu quero saber suas opiniões, como escrevem, o que estão lendo. Quem está escrevendo isso?

Especialmente:

 Michel Laub:  devia tomar uma surra por postar aquelas coisas: “Um livro. Um restaurante, Um filme.” Isso interesse a quem, Michel? Que informação mão-de-vaca é essa? Você não é capaz de escrever uma linha sobre um livro, um restaurante, um filme que você gostou?

Ivana Arruda Leite: tomou meio a linha do Michel, só diz o que leu e gostou, mas sem dar resenha nenhuma, e posta dúzias de fotos de almoços (que também não são muito atualizados). Se vai indicar um livro: ESCREVA sobre o livro.

Marcelino Freire: já teve um blog que era uma agenda dos lançamentos literários da cidade. Agora fica no discurso “eu te amo periferia” que não comunica nada além de uma voz consciente pessoal. 

Ana Paula Maia: Optou pelo silêncio e só posta seus novos lançamentos. Se eu fosse esperto, aprenderia com você, Ana Paula, como não sou, estou aqui reclamando.

Nelson de Oliveira: fingiu que morreu e adotou um pseudônimo.

Sério, isso é um protesto. Onde estão os blogs de escritores? Nenhum escritor hoje pensa? Lê? Resenha? ESCREVE?! (Provavelmente vão me mandar os que ninguém conhecem... mas ok).  Me ajudem.  Sei que há um punhado de jovens seguindo com a bandeira, mas é só um punhado. 

E não me venham dizer que é férias - "que os blogs voltam em março?". Vão tomar no seu cu. Quem precisa tomar férias de blog é quem não merece os dedos que tem para escrever.

04/01/2013

NOVO ANO VELHO

Amigos em Floripa. 


O tempo não ajudou. A semana que passamos em Floripa, para a virada do ano, foi chuvosa, nublada, com até algumas noites frias. Mas o clima dos amigos com certeza foi a melhor coisa desse novo ano e do que passou.


Friozinho na Praia Mole. 

Não estou acostumado a viajar em grupo. Estou acostumado a viajar sozinho. E tinha combinado apenas com três amigos mais próximos, que foram agregando gente, agregando gente, e terminamos em nove, com mais um punhado de visitantes que vieram e foram. 

Meu 2012 foi muito tenso, eu ando muito tenso, e não posso dizer que o clima de praia tenha servido para eu relaxar. Isso porque praia nessa época é uma muvuca só; a ilha não é a mesma que eu reconheço, onde morei e venho sempre, não dá para fazer os mesmos programas, no mesmo ritmo, com a mesma tranquilidade. Além disso, houve alguns incidentes de fato pesados.  

Nem precisaria. Eu já embarquei tenso porque achei que tinha perdido a chave de casa (e do cadeado da mala). Depois que encontrei a chave, fiquei tenso por ter esquecido parte das roupas. E o tempo todo fiquei tenso pensando se o dinheiro ia dar. E me achando acabado. E lamentando o fantasma do Natal passado. Hoje em dia é assim, das pequenas às maiores coisas me deixam numa tensão obsessiva de que não consigo me desligar. 



Mas detesto ser uma má companhia e me esforcei para não transparecer e me lamentar para os amigos. Em grande parte do tempo, preferi ficar sozinho. Pude andar de bicleta, caminhar, nadar, isso valeu. Ter  um pneu da bicicleta furado - e empurrar durante uma hora até achar um bicicleteiro - foi das menores ansiedades, mesmo. Essas coisas de esforço físico acabam me dando um saldo positivo. O problema é sempre o tédio, o tédio...

Na prainha do Leste. 

No fim de semana, me encontrei com um menino que não via há tempos. E tivemos uma boa noite juntos. Mas no dia seguinte ele começou a passar mal, vomitar e nem conseguia mais andar com dores no corpo. Médicos na pousada cogitaram leptospirose, dengue, hepatite, e eu passei um dia inteiro cuidando dele, esperando alguma melhora, já que o trânsito da temporada dificultava qualquer viagem de emergência. Terminei às 5h da manhã do dia 31 com ele no hospital. Aparentemente, era só uma desidratação severa. Às oito da manhã saímos do hospital e ele foi embora para a casa da avó, que era o melhor lugar que ele tinha para ficar, apesar de ela ter alzheimer e não reconhecê-lo mais. E assim foi. 

Boys magia. 

Depois tive alguns dias de mormaço. A virada do 31 para primeiro foi bacana. Os meninos improvisaram uma ceia bem gostosa. Todos compraram champagne e espumantes. Eu fiz uma playlist de músicas tentando agradar a todo mundo (apesar de eu não conhecer a maioria) e fui recompensado com todo mundo cantando uma música ou outra, todo mundo satisfeito, ninguém pediu para pular nenhuma música (mesmo em algumas coisas de gosto duvidoso onde reconheço que segui o padrão "festa de firma"). 


Nosso show da virada. 

Olha a playlist completa da nossa ceia de reveillon: 

Dance, Dance, Dance - Lykke Li
Polite Dance Song - The Bird and the Bee
Beautiful Ones - Suede
This Love - Maroon 5
Cant Take my Eyes Out of You - Zard
Garoto Maroto - Alcione
Festa do Interior - Gal Costa
Descobridor dos Sete Mares - Tim Maia
Taj Mahal - Salomé da Bahia
Sorte Grande - Ivete Sangalo
Fugidinha - Michel Teló
Tudo Pode Mudar - Metrô
In My Arms - Kylie Minogue
A Alegria Voltou- Cachorro Grande
Iê Iê Iê - Arnaldo Antunes
Tomorrow Never Knows - The Beatles
Let Forever Be - Chemical Brothers
Ready for the Floor - Hot Chip
Circuit Breaker - Royksopp
Phoenix - The Prodigy
Voyage Voyage - Dessireless
Don't You Want Me - Human League
Silent Morning - Noel
The Promisse - When in Rome
Girls Just Wanna Have Fun - Cyndi Lauper
Boys Don't Cry - The Cure
Maria - Blondie
Modern Love - David Bowie
Fullgas - Marina Lima
Ovelha Negra - Rita Lee
Oito Anos - Adriana Calcanhotto
Ding Ding Dong - Les Rita Mitsouko
Oh Yeah - Yello
I Go to the Doctor - Tetine
Ragatanga - Rouge
He-man - Trem da Alegria
She Bangs - Rick Martin
Americano - Lady Gaga
Maria Sapatão - Chacrinha
A Pipa do Vovô - Silvio Santos

Virei o ano de charuto na boca, para ver se me traz... dinheiro, ao menos. 

Fora isso, foram caipirinhas e caipirinhas na praia. Camarões. Deu para pegar uma cor. Ficamos todos na Pousada Marujo (http://www.guesthousemarujo.net/), hospedados pela Ida, que é literalmente uma mãe para mim nesta ilha, e sempre é meio mãe de todo mundo. 

Uma mãe. 

Foi uma boa experiência viajar com tanta gente, depois de tantas viagens sozinho. Constatei o óbvio: que não dá para esperar por companhia para as coisas a que me acostumei a fazer sozinho. Tipo, ninguém estaria disposto a pedalar 4 horas seguidas, ou caminhar 12 quilômetros. Se eu tivesse amigos com essa disposição física, certamente não seriam pessoas com quem eu conseguiria conversar, rir, beber. Por mais que eu queira, não dá para esperar que o outro queira fazer as coisas do meu jeito. É preciso encontrar um equilíbrio comum, ou simplesmente continuar fazendo sozinho, coisa que fiz muito esses dias. Mas já é lindo ter amigos que respeitam isso, que me entendem e me dão esse espaço. Como eu disse: os amigos foram a melhor parte. 

Amigo gatão que lê Kerouac na praia. 

Foi cada um no seu quadrado. Ou cada um no seu retângulo, se consideramos o IPhone. O atual estado dos gays é assim: perpetuamente plugado no Grindr, Scruff e outras redes sociais/aplicativos de pegação. Eu tenho, claro, já escrevi sobre isso aqui. Mas não consigo me divertir muito. Não tenho vontade de encontrar ninguém, não encontro ninguém, então acessar não se torna um hábito obsessivo. ISSO, ao menos, não se torna um hábito obsessivo. Mas a galera toda estava sempre assim, sempre com o IPhone na mão, chegando as mensagens, na praia, na pousada, no restaurante. Acho apenas curioso; não me incomoda. 

Mas houve ainda outro incidente, meio cômico, um pouco assustador, em que quase fui linchado. 


Amigos à beira de uma reserva florestal...

Hoje de noite, saindo da pousada, vejo crianças gritando. Me aproximo e vejo que é um filhote de cobra coral. Pego um pedaço de pau e tento verificar se é uma coral verdadeira (era), então tento espantar a cobra para longe.

"Dá na cabeça dela."

"Joga no terreno dessa vizinha chata."

"Mata! Mata!"

Tento mostrar a eles que não é um bicho agressivo (que não avança de volta dando o bote, apenas se afasta). Argumento que ela come insetos e faz parte do equilíbrio ambiental. Chego até a dizer que é um bicho de Deus.

"Se isso é um bicho de Deus, que bicho é do Diabo?" questiona um.

"Pôneis," afirmo.

Sigo empurrando a cobra por vários metros, com as crianças ao meu redor segurando pedras, querendo atacar o bichinho, e eu dizendo para não matar. Finalmente ela encontra um buraco no solo e se esconde. Eu me afasto, achando ter cumprido minha missão. Caminho até uma lanchonete. Um negão 4X4 vem atrás de mim.

"Que história é essa que você jogou uma cobra no terreno onde tem um bebê?"

Digo que só espantei a cobra, que faz parte do equilíbrio, que é um animal de Deus e por fim que matar animais silvestres é crime. O negão (era um negro grande, não estou sendo politicamente incorreto) diz que vai chamar a polícia. Sorte minha, eu já estava pronto para uma surra. Entro na lanchonete, faço meu pedido e vejo um povo se juntando, se juntando. Homens, mulheres e crianças com enchadas, foices, tochas acesas... (Ok, aí já é um pouco de exagero, mas you got the point, foram se juntando mesmo os pais das crianças). 

Acabei saindo por portinha lateral, dando a volta no quarteirão para voltar à pousada. Agora tenho medo de voltar aqui e ser linchado. Se alguma criança for picada por uma cobra nesta ilha eu estou fodido. 

Ainda consegui registrar a belezinha. Também vi um teiu enorme hoje, mas esse fugiu com as próprias patas. 

Assim começou meu lindo ano de 2013 - ano da serpente, veja só. Já pode acabar? Amanhã volto a São Paulo e não sei o que me espera por lá. O pior é que acho que NADA me espera por lá. 


Franzindo pelo sol, não de infelicidade. 


NESTE SÁBADO!