26/03/2014

RUFANDO TAMBORES


Minha querida agente Nicole Witt é uma das três finalistas a melhor agente literária internacional na Feira de Londres. Os indicados aqui:

http://www.londonbookfair.co.uk/en/news-and-media/press/Press-Releases/INTERNATIONAL-BOOK-INDUSTRY-EXCELLENCE-AWARDS-2014-SHORTLISTS-ANNOUNCED-US-AND-INDIA-LEAD-THE-SHORTLISTS-/

Ela estará na feira com meu livro novo, que inclusive é dedicado a ela, e já tem sua apresentação em inglês no catálogo para a feira:

In Santiago Nazarian’s new novel Biofobia (“Biophobia”), a man is confronted with rampant nature, both within and outside of himself. André was once a rock star, but has lost everything: fame, money, love. When his mother dies, he returns to her house in the wilderness where family and friends take their pick of her earthly goods, leaving André alone in an empty house. André can hardly stand the increasingly weird situation. In the house, a thick branch crashes against the window, as if invading the place. Tap water begins to taste strange. Reality and imagination become indistinguishable, and when André’s nice, boring sister returns, André has disappeared. Or has he become one with the jungle? Using very intense language and much suspense and black humour, Nazarian takes the reader deep into the mind of his protagonist, asking what a man’s existence is made of.

Aqui no Brasil, o livro começa a ser vendido no final de abril. O lançamento sera dia 10 de maio (sábado). Em breve coloco os detalhes aqui.






"Prepare-se para o pior."


Já gravamos o book trailer, que deve ir ao ar semana que vem. Aguarde.


E na edição deste mês da revista Joyce Pascowitch tem uma entrevista bem bacana comigo na última página, aqui:




21/03/2014

DIAS PERFEITOS


Já estava na hora de a Geração Dez mostrar seu valor. 


O começo do século foi um período especialmente renovador para a literatura brasileira. Impulsionada pela internet e o facilitamento da autopublicação, uma nova geração de escritores conquistou um espaço (de mídia, de publicação) inédito no cenário literário brasileiro. As grandes editoras começaram a investir nos novos de uma maneira nunca antes vista. Proliferam-se os eventos literários e muitos alcançaram grande estirpe e projeção (vide Flip, Fliporto, Forum das Letras de Ouro Preto).

Uma década depois, muitos desses autores permaneceram, mas o furor esfriou consideravelmente. As grandes editoras perceberam que os "jovenzinhos" não vendiam tanto assim e muitas retornaram as atenções aos estrangeiros (caso, por exemplo, da Planeta, que no começo dos 2000 investiu pesadamente em novos autores, como eu, Cuenca, Terron, Clarah, Plosk e tantos outros). O "hype" sobre os novos escritores também diminuiu, ser escritor não é a bola da vez - eu diria que a "bola" acompanha o desenvolvimento da internet, que naquela época era eminentemente escrita e agora se baseia nos vídeos, fazendo o passe para os novos cineastas (vide essa geração de Esmir Filho, Daniel Ribeiro, Marco Dutra, Charlie Braun, Rafael Primot e tantos outros que gratamente renovam o cenário cinematográfico do país). 

 Por tudo isso, tem sido difícil identificar um volume considerável de nomes de peso na novíssima literatura brasileira. Sempre há gente publicando seu primeiro livro mas, sem sarcasmos, mantenho um olhar especial para os jovens autores, acreditando que tenham um ímpeto transformador maior. Os senhores escritores, mesmo aqueles que estão estreando hoje, tendem a reproduzir uma literatura já consolidada, para o bem ou para o mal. 

Nesse contexto surgiu Raphael Montes, um jovenzinho de 23 anos que já está lançando seu segundo romance pela Companhia das Letras, com elogios entusiasmados do (autor policial americano) Scott Turow na própria capa. 

Finalista do prêmio Benvirá, publicou "Suicidas"em 2012, um romanção de trama policial que impressionou pelo fôlego. Ele já me escrevia como leitor e fui conferir a publicação. Escrevi sobre, aqui: http://santiagonazarian.blogspot.com.br/2012/09/romance-matador-nove-universitarios-se.html
Ficamos amigos e há alguns meses ele me mandou os originais de Dias Perfeitos, que acaba de ser lançado. 

Raphael reafirma seu talento para a trama policial, com enredo muito bem estruturado. O romance narra o relacionamento doentio de Téo - um estudante de medicina - por Clarice, uma aspirante a roteirista. A paixão inicialmente platônica se desenrola em sequestro e uma consequente síndrome de estocolmo esquizofrênica entre os dois. Em essência um road book fluminense, o "casal" passa por pousadas, praias e cenários diversos do estado do Rio, que carimbam a brasilidade do romance policial. 

O grande feito de Raphael é tão mercadológico quanto literário. Dias Perfeitos se encaixa num vácuo essencial da literatura brasileira: é ao mesmo tempo comercial e consistente; está longe ser alta literatura acadêmica, mas também não resvala nos clichês e na descartabilidade da mera literatura de entretenimento. Não é à toa que Companhia das Letras comprou o passe do rapaz e está investindo numa tiragem inicial de dez mil cópias (bem acima da média). E apesar do tema e da história, que flerta com a insanidade, o texto parece se colocar ao lado do leitor, jamais soando agressivo ou ofensivo. Talvez seja essa minha maior ressalva pessoal com o romance; eu torcia para que a coisa descambasse para o torture porn (o que certamente limitaria seu alcance); longe disso, Dias Perfeitos é até bem comedido sexualmente (considerando a premissa) e não deve incomodar o leitor médio.

Dias Perfeitos é uma leitura prazerosa, inteligente e com identidade muito própria. Abrindo portas para a "Geração Dez" (e para todos que estão aí escrevendo), Raphael Montes carrega a promessa de uma literatura brasileira de qualidade que pode finalmente ser comercialmente competitiva. Ganhamos todos com isso.  


 O jovem prodígio e o tio trevoso. 


18/03/2014

ALTOS VÔOS E QUEDAS LIVRES

Resenha minha, na Folha do último final de semana, para o livro de Julian Barnes. 

É fácil para um autor mundialmente consagrado, com mais de 30 anos de carreira e uma dezena de prêmios, tornar-se autoindulgente.
As pouco mais de 120 páginas de "Altos Voos e Quedas Livres" passam inicialmente essa impressão; uma prosa preguiçosa sobre balonismo, de um autor com fôlego de final de carreira.
Entretanto, o leitor que não for dominado pela própria preguiça pode logo notar que há algo além na obra mais recente de Julian Barnes, uma curiosa mistura de ensaios, crônicas e memórias, que ao final gera algo próximo de um pequeno grande romance.
"Você junta duas coisas que nunca foram juntadas antes. E o mundo se transforma", coloca ele no parágrafo inicial. E o livro se desenrola sobre isso: balões e paixões, um como alegoria do outro.
Dividido em três partes, começa com relatos sobre balonistas do século 19 na Inglaterra e na França; a paixão romântica por voar ao sopro do vento, já ameaçada pelas iminentes máquinas tripuladas "mais pesadas do que o ar."
Essa alegoria ganha mais fôlego na segunda parte, que se concentra no (fictício) romance da atriz francesa Sarah Bernhardt com o coronel inglês Fred Burnaby, dois balonistas que pareciam ser levados por ventos distintos.
"Animais rasteiros, às vezes chegamos tão longe quanto os deuses. Alguns voam por meio da arte, outros da religião; a maioria do amor. Mas, quando voamos, podemos cair. Existem poucos pousos suaves. Podemos nos ver batendo no chão com violência, arrastados na direção de uma estrada de ferro estrangeira. Toda história de amor é uma história de sofrimento em potencial."
Isso leva à terceira parte do livro, em que Barnes assume o tom confessional e discorre sobre o luto pela morte da mulher, com quem foi casado por 30 anos.
Então, os dois terços iniciais se justificam como uma delicada introdução ao cenário interno do autor. Triste, densa, mas sem nunca perder a leveza, a obra se revela um voo ligeiro e inesquecível.

13/03/2014

PASSADO NEGRO

Eu, um adolescente exemplar. 


Terminei a madrugada ontem assistindo a Bastard Art, um documentário de uma hora e meia sobre a obscura banda gótica (se é que isso não é pleonasmo) Sex Gang Children, uma das pioneiras do movimento na Inglaterra. Tive lindos flashbacks de um período negro na minha vida, que em parte foi um período de ouro. 

Ser gótico no Brasil não faz muito sentido, mas faz mais sentido. As roupas pretas, maquiagem pesada, pessimismo e melancolia parecem sublinhar melhor por aqui o enfoque de contestação, sociopatia. No final da minha adolescência, no final dos anos 90, eu me aproximei bem do movimento, frequentando os clubes do centro e da periferia, fugindo dos carecas, raspando zero a sobrancelha e adotando todo tipo de visual discutível. 


Sobrancelha zero, com Fabbie, minha namorada na época, que hoje é uma linda, rica e poderosa empresária do meio musical. 

Eu era tecladista de uma banda de glam rock - Viva Violet - chegamos a fazer show no Retrô (na Santa Cecília), mas era todo mundo muito, muito ruim. Eu escrevia poemas, contos e fazia fanzines (que espero que estejam perdidos para sempre).Nessa época também fiz curtas na faculdade de comunicação. Foi o período que pratiquei "body art", mais como experimentação estética do que qualquer coisa. Um trabalho de fotos de auto-mutilação que fiz no centro de São Paulo atraiu atenção e gravaram um documentário comigo. Fiquei meio conhecido como "o menino que se corta". Escrevi/dirigi e atuei no curta Ame o Garoto que Segura a Faca, uma tosqueira tremenda, mas com uma fotografia e edição bacanas (de colegas de faculdade). É um passado negro, mas não renego. Ficaram boas lembranças, algumas cicatrizes... os vídeos em si eu espero que tenham sido perdidos para sempre também. 

  
Still de Ame o Garoto que Segura a Faca. É - eu sou essa espécie de Drag Marilyn Manson genérica - e isso é tudo o que vocês vão ver. 

Nessa época a internet ainda engatinhava, então para conhecer gente com gosto parecido, para ouvir as bandas era preciso recorrer às lojas de disco no centro, na Galeria, na Indie (loja na Pedroso de Moraes). Ainda tenho aqui uma porrada daquelas coletâneas terríveis da Cleopatra (gravadora gótica independente americana), através das quais conheci o Sex Gang Children (e acho que só isso. Não lembro de mais nenhuma banda desse selo que eu ainda escute). Também ouvia muito Bauhaus, Siouxsie and the Banshees, London After Midnight, Silverblood, Tetine (que era gótico), Einsturzende Neubauten, Marilyn Manson, muitas das quais pude ver ao vivo com o passar dos anos. 

Siouxsie assisti no Brasil em 95 (Olympia) e em Londres em 2002. O show do Brasil foi bem mais legal.

Vi o Peter Murphy, do Bauhaus, duas vezes aqui em São Paulo. O show do ano passado, só com sucessos da banda, foi inesquecível. 

Cheguei a sair para beber com amigos e o Einsturzende Neubauten antes do show que eles fizeram aqui no Sesc. O baixista da banda chegou (atrasado) com a gente ao show. 

E tem a história clássica da noite que passei num quarto de hotel com Marilyn Manson, banda, alguns amigos e um punhado de prostitutas, em 97. 

Sex Gang Children eu consegui assistir em 2002, em Londres. Lembro que cheguei bem cedinho (porque achei que estaria lotado; não havia ninguém) e encontrei o próprio vocalista, Andi, no banheiro. Me apresentei como fã brasileiro e ele começou a falar de futebol. Consegui um disco autografado e o empresário ainda perguntou se eu queria trabalhar de roadie para a banda (assim, meio na brodagem, com uma ajudinha de custo...). Eu já tinha um emprego razoável de barman. 

O show foi absurdo - principalmente porque assisti pastilhado; na época fazia tudo pastilhado (ecstasy, isso). A banda só tocou músicas novas (do excelente disco que lançaram em 2002, Bastard Art), depois voltaram para o bis com Andi anunciando: "Vocês foram muito pacientes. Este não é o bis, é a segunda parte do show!" Daí tocaram todos os "sucessos", com direito a Andi cantando "Sebastiane" no meio da plateia (de meia dúzia de pessoas). 

Esse show foi lançado oficialmente pela banda, num DVD de filmagem bem amadora. Para mim, vale como lembrança afetiva. E eu até posso ser avistado rapidinho. 

(Recentemente eles lançaram um novo álbum de estúdio, Viva Vigilante, que estou escutando agora e está me parecendo bem divertido.) 

Essas bandas, essas histórias é que me dão força para acreditar que o importante é fazer o que se acredita, que o sucesso é discutível, que você pode ser um artista obscuro de porão, mas ainda fazer parte da história, mudar a história... ao menos de um adolescente perdido do outro lado do oceano. 

Para quem está chegando agora, o som do Sex Gang é uma mistura de punk, gótico e cabaré, com vocais esganiçados e letras sofisticadas. Escuta só uma das músicas mais lindas deles: 

)

E para quem se interessou, o documentário inteiro sobre a banda está aqui:

)



 19, com corpinho de defunto. 



05/03/2014

OLHE PARA MIM

Resenha minha publicada na Folha desse final de semana. 

Linda, loira, influente e premiada, Jennifer Egan parece ser a encarnação perfeita da escritora norte-americana contemporânea de sucesso. Suas obras refletem isso, invariavelmente trazendo uma visão crítica do mundo dos ricos e famosos, como em "A Visita Cruel do Tempo", ganhador do Pulitzer.

"Olhe para Mim" é um romance anterior, de 2001, mas que já habitava esse universo e trazia uma estrutura semelhante, alternando o foco narrativo entre diversos personagens.

O foco principal (e mais interessante) desse está em Charlotte, uma modelo decadente que sofre um acidente de carro e tem seu rosto reconstituído. Ainda bela, mas irreconhecível, tem de recomeçar na carreira aos 35 anos de idade, passando por toda uma sordidez que ela já não suporta mais.

A premissa é apetitosa e gera momentos cruéis, que carregam a maior bandeira do livro, de crítica ao mundo das aparências.

A outra metade do livro é dividida entre uma série de personagens relacionados ao passado de Charlotte, que nem sempre se desenvolvem e só pretendem cumprir a função de trazer "pessoas comuns" ao leitor, formando uma prosa virtuosa e esquizofrênica. Liberta dessa tendência macro-narrativa, Egan poderia gerar uma série de contos e novelas de impacto mais certeiro.

A escolha do que se critica já revela ao que se dá importância. E Egan parece estar se firmando como uma crítica do banal. Habilidosa, inteligente e eficiente, segue uma sólida tradição americana, com um texto estruturado com a maestria de quem fez o dever de casa, mas que pessoalmente não tem muito o que dizer.
Uma espécie de Brett Easton Ellis sem lasers, seu olhar é antenado e por vezes visionário —o livro é de 2001 e já antecipava várias correntes atuais dos reality shows. Ela vê o que está aparente, mas não traz um universo novo.

Se a intenção é ter uma ótima previsão crítica sobre os tempos atuais, ponto para ela. Se a intenção é mergulhar no universo próprio de um autor, olhe para outro lado. "Olhe para Mim" é alta literatura artificial a serviço da superficialidade.

Avaliação: Ruim. 

NESTE SÁBADO!