06/10/2015

O POP MALDITO



Joca Reiners Terron Santiago, existe algo em comum entre nós que é o fato de sermos identificados como escritores "pop". Em meu caso percebo desde o início que essa etiqueta sempre é usada de modo pejorativo, porém tenho a impressão que você enxerga isso de outra maneira, talvez benéfica (posso estar enganado). O que pensa disso?
Santiago Nazarian Curioso, Joca, eu tenho a mesma impressão a respeito de você. Digo, ao meu ver seu flerte com o pop é mais bem visto, você passa uma imagem de escritor de respeito, não só pela escrita como talvez pela questão da imagem em si, o visual, a idade, heterossexualidade, sua cara de mau. Eu percebo uma certa resistência à minha escrita não só pelos temas e pelo apelo pop assumido, como também pelo meu discurso, minhas tatuagens, humor, etc. De todo modo, isso talvez tenha me beneficiado de uma forma distinta da sua, formando um público leitor mais jovem. O complicado é estar sempre nessa fronteira, ser literário demais para ser comercial, e ser pop demais para ser levado a sério. É essa a minha veia, e minha esperança (ou utopia) é que aos poucos as barreiras, resistências e fronteiras venham caindo, até pelo tempo de carreira, os cabelos brancos que vão se acumulando, a decadência física que me leva a ser levado mais a sério.
Então, aproveitando a pergunta: o que espera, deseja e sonha para sua carreira de escritor a longo prazo?
Joca Reiners Terron Santiago, espero que você não esteja afirmando que sou levado a sério apenas por causa de minha decadência física. Já ouvi de um agente literário que não haveria maneira de meus livros interessarem a editoras estrangeiras, porque 1. sou feio; 2. não sou jovem. 3. meus livros são incompreensíveis. Nunca cheguei a entender se a afirmação foi essa mesma ou se tudo não passou de um equívoco linguístico ou erro de interpretação meu, afinal o agente estava interessado em me ajudar. Quanto à questão do pop literário, sempre o compreendi como uma etiqueta apressada. O mero uso de elementos da cultura popular de uma época determinada numa obra literária não torna essa obra pop, e poucos críticos se dedicaram a arrancar o tema da superfície. Por exemplo, dá pra inventar uma história de zumbi onde os mortos-vivos sejam escritores de terror como Machen e Lovecraft que voltaram para devorar cérebros de críticos literários. O resultado, acho, não seria muito pop, ou popular (pensando bem, talvez fosse). Das profundezas de minha decadência posso lhe assegurar, porém, que o teu futuro não será nada fácil. Primeiro, porque novos escritores surgem aos bandos todos os dias, e são todos bonitos e jovens e escrevem livros totalmente compreensíveis. Segundo, porque os livros, assim como seus autores, são considerados produtos, e nem sempre esses produtos devem ter a qualidade que nós, os velhos, gostaríamos que tivessem: que escrevam e contenham narrativas provocantes e um pouco loucas, que não tenham nenhum senso de responsabilidade ou de profissionalismo, que procurem ser originais, que transformem quem lê em algo diferente do que era antes de ler. Por esses e outros motivos não posso responder sua pergunta, pois só me considero escritor no tempo presente, enquanto estou escrevendo e onde o futuro não passa de ficção científica. É nestes momentos em que me sinto feliz.
Assim começou (por escrito) meu papo com Joca Reiners Terron, na série de encontros promovidos pelo Centro Maria Antônia, aqui em SP. Não estava entendendo o tom amargo de sarcasmo dele, até porque no mundo (literário) em que eu habito, os velhos ainda têm preferência e os jovens autores com ingresso permitido ainda têm de se adequar aos valores (e a decadência física) dos senhores. Felizmente, eu diria, porque acredito que, ao menos na literatura, o tempo age a meu favor.

O rótulo de "literatura pop" que Joca rejeita já me incomodou mais, no começo de carreira. Com o tempo eu decidi usar isso conscientemente para criar uma literatura com novas referências, novos universos, ainda que tratam de questões atemporais do existencialismo (o que rotulei de "existencialismo bizarro"). 

Ontem discutimos um pouco isso e além, com boa mediação de João Bandeira (o mediador marcado, André Conti, não pode vir por problemas familiares). Lemos trechos de nossos próximos romances e podemos responder perguntas de um público reduzido, mas interessado. Valeu.

Os debates seguem esta semana, em grande estilo. No fim de semana estarei em Búzios, na Armação Literária, numa mesa com Raphael Montes, mediado por Tiago de Melo Andrade. 

De lá, sigo quase direto para... Paris! De onde embarcarei para a Armênia com minha mãe (e Londres no final). 

Conto tudo por aqui.





NESTE SÁBADO!