Click do Felipe Helmeister |
O escritor é um caçador solitário, mas este livro não estaria aqui se não fosse por um bando de gente tão louca (ou obcecada) quanto eu. Por isso agradeço primeiramente à minha agente, Siobhan Mitchell e sua assistente Sarah O'Connor pelas incontáveis leituras, correções e apontamentos nas dúzias de versões pelas quais o texto passou. Agradeço também à meu editor Robert Sullivan e todos na Evergreen Press - especialmente a Margareth Talbot, Clare Davis e Susan Montague (te devo aquele crumble) - pelo cuidado, paciência e carinho com que trabalharam este livro desde sua primeira ideia, há cinco anos. Não poderia esquecer de minhas talentosas amigas, a escritora Viola Corman, Deborah Sanders e Lupita Ramirez pelos valiosos conselhos durante a leitura - vocês detonam! Por fim não poderia deixar de agradecer ao meu marido, Bob Burns, que me deu todo apoio estrutura (e ouviu atentamente incontáveis leituras deste livro madrugada adentro) para que eu pudesse realizar este sonho. Você é o protagonista masculino da minha vida.
- Estes são agradecimentos fictícios (de uma mulherzinha...), uma versão condensada que criei, baseadas em tantos e tantos "acknowledgements" reais que encontro por aí.
Estou terminando a primeira versão de meu novo romance. Mandando para alguns "leitores beta", me perguntando quem poderia me auxiliar em questões específicas.
Nessas horas, sempre me lembro de "agradecimentos" como os acima, que encontro no fim das traduções de livros, com dezenas e dezenas de nomes de leitores, editores, agentes, gente envolvida na produção do livro. Talvez lá fora a coisa seja mais profissional. Talvez os livros que cheguem aqui para eu traduzir sejam o que tenham passado por um processo maior, mas sempre me impressiona a QUANTIDADE de gente que se dispõe a ler (mais de uma vez) os originais antes de o livro ser publicado.
Eu sempre tenho a sensação de que estou esmolando - "eu... queria pedir uma coisa... se não fosse incômodo... poderia... poderia dar uma lida no meu livro novo... por favor... me dizer o que acha...?" Mesmo quando me encomendam o livro, sinto um incômodo de pedir uma leitura de quem encomendou. Talvez seja um caso particular, porque o que eu escrevo não presta.
Ou talvez seja por conhecer o outro lado. Diariamente chegam na minha caixa postal, no meu Facebook mensagens de leitores-autores pedindo uma leitura, uma opinião, uma orelha. Não tem como dar conta. Além dos livros que leio para resenha na Folha, que faço leitura crítica para editoras, há o fluxo interminável de lançamentos de amigos, colegas, conhecidos. Eu procuro ler, tenho prazer e acho importante, mas se não me policio acabo só lendo literatura brasileira contemporânea. E quase só literatura brasileira contemporânea RUIM.
Esta semana me dei ao luxo de virar uma noite lendo Tolstoy ("Polikuchka", delicioso, e apenas 140 páginas). Depois me peguei culpado porque emendei num Chuck Palahniuk maiorzinho ("Haunted" - "Por que você perde tempo lendo mais um Palahniuk, Santiago? Tem uma dúzia de amigos que você ainda não leu. Tem aquele menino que te pediu uma frase pra contracapa. Que seja então Graciliano! Se é para ler estrangeiros que sejam os clássicos!")
(Isso quando não viro a madrugada jogando videogame...)
Verdade que muita gente que pede leitura/opinião quer na verdade elogio/editora. Suspeito que a maioria nunca tenha de fato lido um livro meu - "Adorei o Biofobia", vem na mensagem como para dizer "li o seu, agora leia o meu" - que acredite que eu possa ter algum tipo de influência em editora. Ano passado mesmo, escrevi para o material de trabalho de um jovem autor, dono de um conhecido blog de literatura, e depois que me dei conta: o blog dele nunca deu uma linha sobre meu trabalho.
Mas tudo bem. Às vezes compensa.
No final do ano recebi de um amigo (autor inédito) os originais de um romance, e quando me preparava para me retorcer em arrependimento por ter me oferecido, tive a surpresa de encontrar um grande texto. É raro.
Quando o texto não é lá grande coisa, a amizade fica comprometida. Dois bons amigos se tornaram amigos mais distantes depois que critiquei (em particular) seus originais. Ou acharam que falei merda ou se convenceram de "quem é ele para me criticar?"
Nunca é fácil. "Dar uma lida" para opinar exige dar duas ou três lidas, sublinhar passagens, anotar, depois escrever opiniões e sugestões (nesse meu último caso, deu três páginas de texto). E eu próprio não me considero apto a ensinar ninguém a escrever - não dou oficinas, não serei picareta de faturar com a ilusão alheia.
Esse talento de leitor - de parecerista, de orientador - deveria ser mais valorizado. Por aqui raramente se encontra isso, mesmo dentro da editora - raramente tive um trabalho de edição nos meus livros; alguns não tenho nem certeza se alguém lá leu, além do revisor/diagramador. Talvez seja essa a diferença lá de fora. Leitores beta são valorizados porque são pagos. As editoras pagam por as editoras ganham. Ou o autor mesmo tenha condições de bancar. É o autor quem mais ganha com isso. O autor e seus leitores gama, que pegam um livro mais bem cozido.
Esta foto ilustrará eternamente nosso ofício. |