04/12/2019

PESSOAS NORMAIS



Crítica que assinei na Folha em 03/12



Connel é o atleta popular. Marianne é a garota esquisita. Durante o ensino médio eles engatam um romance secreto – e seguem com idas e vindas durante o espaço de quatro anos em que se passa a história, de 2011 a 2015, até o término da universidade. Por vezes Connel se torna o recluso esquisito; Marianne vira estrela da faculdade; então o contexto muda, mas a relação entre os dois permanece, num misto de amizade colorida e amor livre.
“Pessoais Normais” é a segunda obra da jovem irlandesa Sally Rooney, de vinte e oito anos, que estreou com “Conversas Entre Amigos” (lançado no Brasil em 2017, pela Alfaguara) e se tornou um fenômeno literário, publicada em mais de uma dezena de países e finalista do Booker Prize. É compreensível: sua escrita é sofisticada, fluida e, acima de tudo, eficiente. Ela inicia capítulos com saltos no tempo, para então recapitular e mostrar como as coisas chegaram até o momento presente. Os diálogos diretos são inseridos no texto sem separação de aspas (ou travessões, por aqui), como se toda sua escrita tivesse essa falsa despretensão coloquial. E esse o traço que mais salta no romance: falsamente despretensioso.
Rooney tem mestrado em literatura americana, e isso é flagrante não só na estrutura do texto, como no universo que retrata. Apesar de o livro se passar na Irlanda, não poderia ter um tom mais de high school americano, com as divisões entre os alunos, o bullying, o bailinho de formatura em que o menino precisa convidar a menina.  Com frequência surge um estranhamento quando o livro cita Dublin ou as viagens dos dois protagonistas pela Europa, nos lembrando que o livro não se passa nos EUA. Isso não é um problema em si, mas é um dos sintomas de a autora querer retratar “pessoas normais”, fazer uma “escrita normal”, eficiente, reconhecível e premiável. Ela não se arrisca, joga seguro – não há estranhamento, não há loucura, falta personalidade.
                Longe de ser um livro ruim, “Pessoas Normais” é, no final das contas, um livro de menininha - um bom livro de menininha. Mas espero que não crie escola – não precisamos de mais escritoras escrevendo normalzinho assim.

Avaliação: bonzinho. 
               


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