Acho curioso criticarem, boicotarem a Copa atual pela homofobia, misoginia, exploração. Futebol não foi sempre isso?
Fui daquelas crianças viadas com horror. E a total falta de
interesse, de talento com a bola minaram muitas das minhas relações sociais
durante toda a infância, até meados da adolescência. “Para que time você torce”,
é das primeiras perguntas que um menino escuta ao entrar numa nova turma.
Geralmente eu dizia “Corinthians”, só pela cor (porque sempre fui um
trevosinho); levou muitos anos para eu conseguir admitir: “Não gosto de
futebol.”
O fato de ser trevosinho, por sinal, é o que me salvava de
ser totalmente excluído, que me denotava certa masculinidade: gostar de filmes
de terror, HQs, videogame, ainda era considerado um traço masculino. E talvez
eu até pudesse ter sido mais popular, ter tido mais amigos, se não fosse pela
aula de educação física...
Na educação física ficava clara minha inadequação: ninguém me
queria. A clássica cena de dois meninos (os “dois melhores”) escolhendo seus
times e eu sobrando com os mancos, com os vesgos, com os gordos. Mal conseguia
tocar na bola, meio que eu fugia, e nunca consegui marcar um gol na vida.
(Alguns diriam que nem na literatura...)
(Até pouco tempo... até agora, acho, eu poderia ter dito que
na educação física eu só era bom em queimada. Mas fico pensando se era mesmo um
talento em fugir da bola, ou se os meninos nem se importavam em mirar primeiro
em mim. Eu só era um dos últimos que sobrava.)
Eu tinha um primo rico que era dos meus melhores amigos.
Quando estávamos só nós dois, a gente se divertia com o Nintendo, com o He-man,
Comandos em Ação. Quando tinha outros amigos – e ele era cheio de amigos – ele ia
jogar futebol no campinho da própria casa. Eu continuava na TV, até zerar o “Simon’s
Quest.”
Foi uma falha na minha criação. Na minha casa, nunca se teve
o menor interesse por futebol, nem os homens. Era dado um interesse exagerado
pelas artes. (E deu no que deu...) Futebol só se assistia em Copa do mundo, o
que pra mim era um martírio, não fazia sentido. Mesmo depois de entender minha
sexualidade, a hipermasculinidade dos jogadores nunca me foi um atrativo. Nesse
quesito, acho bem mais interessante as Olimpíadas, onde há de fato celebração
de diversidade.
(Nota: Essa ilustração foi outra feita pelo meu irmãozinho
Alexandre Matos, para um texto de jornal antigo, mais ou menos com esse mesmo
tema, que o jornal não quis publicar...)