31/12/2009
(Artigo meu publicado na Folha, nesta quinta, 31/12)
Se 2009 foi o ano dos vampiros, 2010 será o ano dos zumbis. Seguindo a onda de filmes e séries de TV, a literatura estrangeira traz os mortos-vivos em romances de terror, juvenis, satíricos e até mesmo num romantismo açucarado.
São versões mais palatáveis desse subgênero, que até então era associado ao horror escatológico e ultraviolento, principalmente a partir da década de 1960, com a paranoia nuclear e filmes como "A Noite dos Mortos-Vivos" (de 1968, dirigido por George Romero).
No mercado editorial externo, é flagrante a enxurrada de livros tratando do tema. E, em 2010, vários deles serão lançados no Brasil. A Intrínseca, que publica os best-sellers da saga "Crepúsculo" aqui, já anuncia para o primeiro semestre o lançamento do insólito "Orgulho e Preconceito e Zumbis", uma sátira trash do clássico romântico de Jane Austen. A obra, do americano Seth Grahame Smith, foi publicada lá fora este ano e virou um best-seller instantâneo do "New York Times". É de pensar se Austen não está (literalmente) se revirando no túmulo.
A editora Record investe no público adolescente com "Loiras Zumbis", do americano Brian James, em que uma nova aluna do colégio percebe que as líderes de torcida são mais desmioladas do que parecem. É uma sátira de humor negro com tom lúdico, como vários filmes já vêm fazendo (vide "Fido", de Andrew Currie, de 2006, em que zumbis são tratados como animais domésticos).
Já o romance "Warm Bodies" (ainda sem título em português), de Isaac Marion, que a Leya lançará no Brasil no segundo semestre, deixa o humor (e o horror) de lado e investe numa visão romântica do tema. Narrado em primeira pessoa por um zumbi apaixonado, é uma espécie putrefata de "Romeu e Julieta", em que o amor é capaz de vencer todas as barreiras e até re-humanizar os mortos. Não é à toa que os direitos da obra foram comprados para o cinema pelos mesmos produtores de "Crepúsculo".
Na literatura brasileira, o realismo tradicionalmente domina, e elementos fantásticos ficam em sua maior parte restritos à literatura de gênero. Mas não poderia deixar de citar meu próprio romance, "O Prédio, o Tédio e o Menino Cego", publicado este ano pela Record, em que zumbis aparecem como alegoria de uma sociedade pós-apocalíptica imbecilizada. Alegoria que até me parece óbvia, nos tempos de hoje, e que também é reforçada pelos alardes ambientais e as novas epidemias. Os zumbis carregam essa imagem de infecção, das doenças transmissíveis entre humanos e animais.
É nessa linha que segue o ótimo thriller "Hater", do inglês David Moody, a ser publicado no Brasil em março pela Arx. Embora não seja precisamente um livro de zumbis, trata de uma epidemia que desperta uma raiva repentina e irracional nos seres humanos. Também está prestes a virar filme.
Mas quem quer ir ainda mais longe pode ir se preparando para 2011. A nova onda virá com uma maré que já está se esboçando e que é trazida pela lua cheia. Depois dos vampiros e dos zumbis, a sequência se dará de forma óbvia: será a vez dos lobisomens.
(Continuo aqui em Floripa, nessa felicidade pastosa... Boas viradas para vocês)
25/12/2009
O resultado do concurso: Primeiro lugar para João Lestrange.
Covardia. Não teve pra ninguém. Sorry, sorry, o primeiro desenho que recebi também foi disparado o melhor. Até fiquei pensando em maneiras de desclassificar o João. Não acho lá muito justo - pelo traço dele a gente já vê que é mais do que profissional. Mas regras são regras, ele ganhou e mereceu. Traço lindo. Visão bem pessoal dos sete personagens. E é um leitor fiel. Já me mandou outras ilustrações lindas que já postei aqui. Mas desta vez ele se superou. Parabéns!
(João, me manda seu endereço por email, please. Mando os livros assim que voltar de viagem. E você está na minha mira. Precisamos fazer um trabalho juntos...)
(Para quem chegou de pára-quedas, lancei um concurso na comunidade "Santiago Nazarian" do Orkut para quem mandasse a melhor ilustração, colagem, rascunho dos sete personagens do "Prédio, Tédio e o Menino Cego," valendo um kit com todos meus livros + um bônus inédito,)
Mas...
Do Thiago Cardoso, bizaaaaaaaaarro.
Como teve muita coisa bacana que chegou aqui, percebi que o pessoal se dedicou, senti todo esse amooooooor, resolvi dar um prêmio também para o SEGUNDO LUGAR. Para esse vale um livro só, ok? UM livro (dos meus) que o vencedor quiser.
Daí foi mais difícil de escolher...
Bem profissa também o do Igres Leandro.
Fabrício Barbosa tem pegada.
Caroline Suzuki mandou esse fofíssimo.
Pela bizarrice a Larissa Laira merecia...
Entãaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaao....
O SEGUNDO LUGAR: ALINE DANTAS.
Eu amei o desenho da Aline. Ela fez tortinho, como o prédio, e ainda me escreveu que fez os meninos sem pés porque não sabia desenhar pés. Achei um desenho simples, sincero, queridíssimo. E como eu sou o juri, ela ganhou.
(Aline, me mande um email dizendo qual dos meus livros você quer - só um! - e com seu endereço. Mando assim que voltar de viagem.)
Valeu a todo mundo que participou. Postei só os sete melhores (até porque, teve uns que eu não entendi...). Desculpe que não postei todos; não foram dezenas, mas mais do que eu poderia colocar aqui. A dedicação de vocês foi um presente a mais para mim neste Natal.
Falando nisso, ganhei coisas (materiais) bem legais, viu? Roupas, um tabuleiro de "scrabble" (Sou bom pra caralho nisso, tá? Sério, sou campeão do meu bairro, hahaha. E adoro jogar), um livro de drinques e uma bolsa masculina (percebi que estou na fase das bolsas - já passei pelas fase dos sapatos - este ano comprei mochila, mochila pra laptop, mochila pra viagem, agora ganhei essa bolsa e se bobear compro uma sacola de praia amanhã, antes de viajar.)
Eu presenteei com muitos champagnes (para os amigos), uma cafeteira pra minha irmã, roupas da Osklen para um menino especial, um aparelho de som pra minha mãe e um cd de músicas natalinas gravado para todos:
- White Christmas – Hanson
- Santa Claus is Coming to Town – Frank Sinatra & Cyndi Lauper
- Jingle Bells – Ella Fitzgerald
- Winter Wonderland – Eurythmics
- Frosty the Snowman – Jackson 5
- Let it Snow – Dean Marty
- Christmas (Baby please come home) – Darlene Love
- Rudolph the Red Nosed Reindeer – Bing Crosby
- God Rest Ye Merry Gentlemen – Julie Andrews
- Petit Papa Noel – Jordy
- Little Drummer Boy – Johnny Cash & Neil Young
- Poema de Natal – Vinícius de Moraes
- So it´s christmas – John Lennon
- Silent Night – Sinead O’Connor
Estou indo hoje pra Floripa. Ainda não sei direito quando eu volto. Mas não demoro. Talvez poste uma coisa ou outra de lá. Que sou plugado, workaholic e obsessivo. Viajo de notebook.
Boas viradas para todos. Valeu meeeeeeeeesmo pelo carinho e prestígio; achei lindo.
22/12/2009
Aproveitando a época cristã e de viagens, mando continho meu, quase inédito (foi distribuído em formato de cordel pelos organizadores da Freeporto ao público de lá, no Recife, em novembro deste ano). É dos meus contos novos mais curtos (por isso torna-se viável colocar aqui) e entrará no meu primeiro livro de contos a ser lançado em 2011, pela Record.
Taí:
VOCÊ É MEU CRISTO REDENTOR
Eu estou sempre viajando. Eu nunca conheço um lugar a fundo. Eu olho para você, vestindo as meias, e sinto em seu olhar fugidio a decepção. Você não pode se apaixonar. Por isso veio para cá. Por isso se entregou na primeira noite. Você sabe que sou um turista, que nosso amor é condenado, por isso fez sexo comigo. E agora que seus hormônios foram decantados, seu colo do útero preenchido, sobra apenas a decepção de não poder e nem querer nada mais. Uma mulher como você não foi feita para isso. Você veste as meias sentindo a decepção daquele vazio. Eu nunca vou poder te preencher.
Mas eu também não me satisfiz. Sou apenas um turista. Visito as cidades e passo por você. Passo por cima. Você é meu ponto turístico. Mas não te conheço a fundo, nem depois de pernas abertas, nem depois de ânimos e hormônios decantados. A gente pode visitar uma cidade e se hospedar num hotel. A gente pode visitar museus e comprar souvenires. A gente pode até penetrar numa moradora local. Mas só se sente realmente em casa quando experimenta uma vida inteira, e uma morte por lá.
Por isso eu mato.
Você é minha Torre de Pisa.
Trouxe você há poucas horas, durou pouco. Você não sabia, mas eu bem sei, bem sei que o sexo é apenas uma ponte para chegar lá. Uma forma de te conquistar. Uma desculpa para nos trancarmos entre essas quatro paredes, ficarmos a sós, sairmos da vista dos outros turistas, dos flashes dos orientais, as filas que não levam a lugar algum. Viemos rápido para cá. E este é meu lar tanto quanto seu, um quarto de hotel. Nada pessoal. Você observa ao redor sem nada a captar sobre mim. Eu não moro aqui.
Você nunca me leva para casa. Você nunca me mostra o lugar onde mora. Seria interessante aprender onde vive, como vive, onde vive a mulher que eu vou matar. Mas não é seguro. Nem pra mim nem pra você. Decidimos que o melhor é irmos a um quarto de hotel, meu quarto de hotel. Eu também não moro aqui, mas este quarto é mais meu.
Preciso perder esse péssimo hábito de beber as garrafas d’água do frigobar, encher com água da torneira e colocar de volta. Por que faço isso, afinal? Eu não vou mesmo pagar. Sempre deixo os hotéis antes que a camareira possa entrar. Tenho pena dela. Tenho pena da camareira. Faço uma baita sujeira. Queria ser um homem mais limpo. Queria a polidez dos habitantes locais. Queria um estrangulamento rápido e seco. Mas faço uma sujeira danada, e sangue, e facada, e bato a cabeça da mulher na parede, e na pia, no espelho, no banheiro, a mulher vomita. É uma nojeira. É sempre assim. Eu nunca consigo. Eu sempre me empolgo. Deve ser como o sexo. O sexo estético e inodoro dos filmes pornôs ruins, e o que a gente faz nessa casa, nesse lençol. Por mais que eu tome banho, por mais que eu prenda a respiração, há sempre o cheiro fétido, orgânico, persistente do ser humano.
Que nojo.
Não, deve ser como o sexo. Deve ser como o sexo, depois de satisfeito. Bate aquele arrependimento. E você não quer nem mais olhar, dormir com sua Mona Lisa do Louvre . Sente nojo dos seus pelos. Nojo, dos seus pelos. Deve ser como isso, o sexo como a morte. Deve ser por isso que, depois de feito, eu sempre me arrependo. Eu sempre acho que nunca precisarei mais. Um chaveirinho no corcovado. Mas com os hormônios repostos, lá vou eu novamente. Fazendo turismo sobre você.
Você é meu porto desejado.
Espero você virar o rosto e dizer. “Quando você parte mesmo?” Espero que você se importe. Que insista um pouco mais, mesmo sabendo que eu vou partir, que pergunte até que dia, se tem mais uma chance, se pode mais uma vez, para que eu também possa passear mais uma vez sobre você. Comer novamente aquele peixe de água doce. Dar mais uma volta na roda-gigante. Um último mergulho na praia, antes da balsa partir. E você não pergunta. Você não pergunta? Se perguntar uma única vez, talvez eu possa deixar você partir. Se você quiser saber um pouco mais, talvez também se aprofundar na minha gruta do diabo, eu possa deixar você sair, e voltar. Mas você, como sempre, nunca pergunta.
É que não foi tão bom assim. Eu sei. Você foi minha estação de esqui - interditada. Podemos nos aconchegar no hotel, podemos aproveitar o fondue e a lareira, mas não estamos fazendo o que viemos realmente fazer, não fazemos o que realmente queremos. Minha tempestade de neve. Não posso dissimular em sexo o que eu realmente queria de você. Queria penetrar ainda mais dentro, me aprofundar ainda mais fundo. A gente nunca conhece realmente uma pessoa, a não ser que passe uma vida inteira juntos...
Você se prepara para levantar. Colocou as meias, a saia, o tailleur. Está de costas para mim. Coloca os brincos. Você não vai me perguntar? Eu continuo nu, deitado na cama, eu não te mandei sair. Sou apenas um turista, um viajante, não tenho nada para fazer. Esses cenários não me interessam realmente. Os seus museus não me trouxeram até aqui. Pode me dar mais uma dica de restaurante? Talvez me convidar para jantar com você? Quando você sair, se você sair, eu ficarei só com a programação da TV. Ficarei ouvindo os estalos dos outros quartos, casais se preparando para o teatro, e eu me perguntando o que vim mesmo fazer aqui. O que vim mesmo fazer aqui? Se eu deixar você sair...
Quero ouvir a última frase que tem a dizer. Quero saber. Quero ouvir seu sotaque, e qual seria a última coisa que você diria, acreditando que eu a deixaria sair. Mas tenho medo. Sempre espero até o último momento, para ouvir como você vai se despedir; talvez dar uma última chance, uma única chance, talvez a chance de você querer me rever; mas você não diz; você não diz o que eu quero ouvir; e às vezes eu me arrependo de ter esperado tanto tempo só por um “boa viagem”, “aproveite”, “preciso ir”. Tudo o que ouvi já tantas vezes, na mesma inflexão, com o mesmo dialeto. Às vezes tenho medo de você fugir. Espero demais, e às vezes, às vezes... uma ou duas vezes, na verdade, você apenas abre a porta e sai, sem se despedir. Nem me dá tempo. Então tenho medo de esperar o que estiver por vir. Tenho medo de esperar por essa última frase e ela nunca chegar, você ir embora antes, batendo a porta em mim. Preciso ser mais cauteloso. Preciso esperar o momento certo. Preciso agir antes que tenha passado o momento, antes de dar chance de você fugir...
Suas costas são dunas para meu buggy capotar.
E na verdade têm o mesmo gosto, o mesmo dorso, o mesmo cheiro de uma mulher da Escandinávia, com um perfume da Itália, salgada pelo Atlântico. Todos os pontos turísticos são iguais, se você é o mesmo a visitar...
Isso está se tornando cansativo. Me pergunto qual é o objetivo afinal dessa viagem. Como uma excursão a Roma-Madrid, Bruxelas-Bruges, Paris-Antuérpia-Amsterdã-Eurodisney, tudo em quinze dias. Como posso conhecer seu mundo a fundo, se você já está assim, já indo? Seu tom pode ser mais pálido. Sua pele pode ser mais fina. Sua curvatura pode ser um pouco mais sinuosa, insinuante ou um pouco mais contínua, mas na verdade tem o mesmo gosto, o mesmo dorso, a mesma fotografia impressa em minha retina.
Quem me dera poder escrever um guia de viagem com a verdade implícita. Vasculho meus guias de viagem, procurando a verdade implícita. Entre as páginas, por trás do serviço, talvez algum autor-viajante tenha encontrado o que eu procuro. O que eu procuro? A verdade implícita. Talvez algum autor-viajante tenha encontrado. Vasculho por entre as páginas e penso se alguma mancha de sangue pode ter laqueado o que eu preciso. Mas não posso consultar isso enquanto ainda estou aqui, com você, enquanto ainda estamos no pós-coito, os semens flutuando pelo quarto, e a manipulação das páginas afiadas de um guia só seriam vistas por você como mera insegurança e inaptidão de um turista.
Ah... Você é minha Polícia da Imigração.
Todas as fronteiras estão abertas para mim. Você sabe, eles só temem aqueles que querem ficar. Os carimbos de ida e vinda, entrada e saída, depõem, estranhamente, a meu favor. Perceba, eles não querem mesmo que eu fique com você. Raízes seriam como algemas, há toda uma política interna a me libertar. Quanto mais eu fujo, mais me empurram para longe, mais varrem a sujeira para baixo do tapete, como se nosso sêmen, nosso sangue, não fosse problema deles.
Você é meu aquecimento global.
Você se levanta. E senta. Cata as roupas dispersas pelo quarto – como um incômodo. Os saltos. O sutiã. A camisa. Eu só posso assistir.
Os canais a cabo nunca mostram o que eu preciso. Os mesmos filmes, em todos os lugares; séries em progresso, que eu nunca vou conseguir resgatar o sentido. Não importa para onde eu fuja, aonde me abrigue, onde quer que eu me esconda, as novelas serão mexicanas e os filmes de Hollywood...
Aperto o controle remoto. A televisão não acende. Aperto o controle remoto. Droga, não funciona. Sempre é bom ligar a televisão – programas de picar e fatiar vegetais em minutos – sempre é bom ter o ruído dos infomerciais para camuflar eventuais gritos. Preciso conter seu suspiro. Em seus soluços sentir-me seguro. Silêncio. Droga. Controle remoto sem pilhas.
Você se vira. “Se precisar de alguma coisa, tem meu telefone, não?”
Sim. Eu tenho. Você me anotou. Então é isso? É essa a despedida. É realmente uma despedida. Você está mesmo indo embora? É essa mesmo a última frase? É isso e depois a porta? Eu tenho seu telefone, você anotou para mim; mas você anotou antes do sexo, talvez agora esteja decepcionada. Talvez não queira mesmo que eu ligue. Talvez nunca quisesse, fosse só uma gentileza. Talvez você queira, e apenas deixe assim uma dica implícita, blasé. Como posso saber? Quais são os costumes locais? Qual é o guia de viagem sobre você? Me diga, como posso saber? Como posso ler em seus olhos, assim, puxados, estrábicos, claros, orientais, índigos-indianos, indígenas e moribundos? Como posso deixá-la sair assim, agora, com essa dúvida, se nem posso perguntar?
Você se vira novamente para frente. Costas para mim. Vai se levantar. Rápido. Eu. Rápido. Avanço sobre você com o cinto que se contorcia em minhas mãos e – uma volta, duas voltas – rápido, em volta de seu pescoço. Aperto.
Agora você se deu conta, minha Grande Esfinge de Gizé.
Você abre a boca para verbalizar, o que quer que seja. O que quer que seja, talvez você esteja apenas perdendo o ar. Eu aperto o cinto ainda mais forte, e ainda mais forte, e sinto a vida desprendendo-se toda de você. As cataratas do Niágara. Você abana as mãos tentando se prender ainda a ela, prende-la ainda em você.
Você é minha aurora boreal.
É rápido e fácil. Fácil e limpo. Eu falo, eu consigo. Em alguns segundos sua resistência cede, como seu corpo, fica sobre a cama. Eu relaxo o aperto e solto o cinto. Meus músculos flexores doem pelo esforço. Observo você – agora não mais – caída sobre a cama.
Agora estou sozinho...
Será que posso pedir serviço de quarto? Acho que vou ficar por aqui. Posso ligar para a recepção – deixe-me ver o cardápio – posso pedir um prato típico, a especialidade da casa. Mas os pratos de hotel são todos iguais...
O mensageiro nem iria perceber seu corpo morto sobre a cama. O mensageiro não iria querer bisbilhotar uma dama que dorme. Acabou de acontecer e seu corpo ainda é quente, morno. Suas maçãs ainda vermelhas, roxas. Posso pedir um jantar para nós dois. Uma garrafa de champagne ou um drinque típico. Mas os drinques são todos iguais... Estou tão cansado...
Algo pinga no banheiro aceso. Quartos ao lado abrem suas portas, batem. Pessoas chegam e partem, seguem para os espetáculos da noite. Acho que hoje vou ficar por aqui. Já perambulei demais por essa cidade. Se eu quiser serviço de quarto, preciso pedir agora.
(Em tempo: mesmo com o êxodo do Orkut, a comunidade Santiago Nazarian chegou lá aos 1000 membros, então estou sorteando um kit completo com todos meus livros. Você também pode participar. As instruções estão lá.)
20/12/2009
Se fosse um filme mesmo, seria a definição pra mim de "cheesy."
...mas é outro trailer fake, feito por fãs (como o do Freddy, que postei há alguns dias). Daí tá valendo bem.
Queria ver mesmo o filme do He-man (OUTRO filme do He-man).
17/12/2009
Meu aniversário deste ano, Alê, Fábio, yo, Strausser.
O ano já acabou? O foguete explodiu e você não viu? Eu estava tomando um ponche e o dia virou em meia-noite e tudo que era doce se acabou? Babou?
Antes que tudo se acabe (novamente!) resolvi fazer minha retrospectiva pessoal. Não venham me cobrar a resolução de Copenhague e a morte de Lombardi, meu blog é um blog pessoal. Antes de mais nada, manobro os trilhos que passaram por mim. Revi meus próprios posts e concluí:
Fábio, Strausser, Simone, Wesley, no Rio.
Fizemos a virada no Rio. Poderia ter sido melhor. Fomos a uma festa que poderia ter sido grande estilo, mas que acabou sendo festa do interior - fagulhas e pontas de agulhas. Ao menos ninguém deu OD.
A gente (eu - veja aí) trocou pneu dia 1 na linha vermelha. Roubaram um dos meus rins, mas eu não estava usando.
Terminei jogando DS num hotel ordinário à beira-mar.
Assim começou o ano...
Ah, sim, teve o show do Peter Murphy, o legendário vocalista do Bauhaus! Tudo bem que ele pode estar caidaço, mas a voz estava em cima, para mim ele estava em cima e é sempre bom ver essa gente pela primeira vez ao vivo. Foi uma realização na minha vida.
Com o Alê também fiz mais uma instalação no Sesc Pinheiros. Adoro fazer essas coisas. Fico feliz de fazer essas coisas. Principalmente porque não tenho menor talento pra essas coisas, e tenho todo talento pra essas coisas. Digo, não tenho menor talento para artes plásticas, mas adoro poder criar personagens, idéias, imagens e frases para alguém com talento executar plasticamente. Assim foi mais uma instalalação de artes plásticas que fiz com Alexandre Matos no Sesc Pinheiros.
Também teve filha nova, a Jurema, que minha mãe adotou. Tudo bem que nos últimos meses, pelo que eu sei, minha mãe pegou mais dois cachorros novos, que eu nem conheço, porque ando ausente da casa de campo dos Nazarian. Mas a Jurema já faz parte da família. E eu adoro todo tipo de bicho.
Falando nisso...
Aí minhas editoras. Estou fechado com a Record até 2011. Mais dois livros. Um de juvenil (com a Ana aí da esquerda) e um de contos (com a Ana aí da direita).
E embora eu devesse ficar escrevendo, passei grande parte do ano cozinhando...
Acho que o melhor prato do ano foi mesmo minha lula a dorê. Apesar de ter feito belos risotos e ...
.... esse belo marreco recheado. Talvez o marreco recheado tenha sido o melhor, mas era gorduroso demais, como todo marreco (ainda mais que em seguida fomos ver uma peça de teatro que engordurou tudo mais ainda...).
E o amor...
Não esquecer que a revista Criativa deu o belo beijo gay meu e de Fábio, em página inteira na edição de junho, embora a militância nem tenha se dado conta. (Mix Brasil que cobra um beijo gay do mundo, nem percebeu...)
E a arte...
Teve também esse mega-ultra lançamento, mas ninguém notou... Nah, o livro foi bem comentado, pouco resenhado, o lançamento saiu em tudo quanto é lugar. Mas você não leu. Achei um pouco muito frustrante, principalmente porque teve gente muita bacana que o identificou como meu melhor livro, mas ele ficou num meio termo desconfortável. Preferia ter sido apedrejado. Isso é que dá não haver uma crítica consistente neste Brasil.
(Saiba que eu vou me vingar.)
De qualquer forma foi um grande orgulho. Trabalhei três anos nesse livro e fiquei feliz que saiu - pela Record- em grande estilo. Esta aí. E nunca foi para ser para qualquer um...
Teve mais um vez o Programa do Jô. Terceira vez. Ele já é brother e eu peço pra ele vir dar comida pro meu iguana quando vou viajar. Essa vez foi a que eu gostei mais; bem calcadada no universo do livro. Não vou nem falar que no dia de gravação tava uma chuva torrencial e eu fui acordado de última hora de uma ressaca daquelas...
Ah, Marimoon também já é brother. E dá comida ao meu canário... se eu tivesse um. Foi mais uma série de entrevistas que eu dei, e que de certa forma me frustaram por perceberam que é mais fácil eu aparecer cinco minutos em rede nacional falando sobre meu livro do que um ser humano passar alguns dias lendo de fato....
Mas faz parte!
Erika tá linda. Mas eu estava com um look tão 2007... (E tava mesmo! )
Fiz mais esse último SPFW com a Erika, de longe, dei uma entrevista bem bacana pra ela, mas me mantive meio longe desse mundo da moda., das festas... Aliás, me mantive longe do jornalismo em geral. 2009 foi um ano de muito, muito trabalho, de tradução, pareceres, críticas, tudo no meio editorial. Estou ainda fazendo a conta, mas acho que foram.... OITO livros traduzidos em 2009.
A diva do meu ano foi Ana Paula Maia. Seu "Entre Rinhas de Cachorros e Porcos Abatidos" é meu livro nacional do ano (pronto, dei!) e isso sem segundas intenções, porque não somos, assim, amigos, amiiiiiiiiiiigos, nem sei se ela leu meu livro... nem sei se gostou...
Enquanto eu flano...
Olha, de viagem este ano eu destaco o Peru. O Peru foi o mais legal, mais bonito, mais divertido. Fui à feira do livro de lá, participei de uma antologia e ano que vem lanço um livro ("O Prédio") um país surpreendente e estranho. Quero mais.
Também foi legal no Peru encontrar escritores que já tinha encontrado pela América Latina, Bogotá, Chile, Argentina. Aos poucos a gente vai sentindo que tem uma carreira internacional. Este ano senti que enraizei ainda mais minhas entranhas na América Latina. Melhorei meu espanhol. Bacana.
Dani Umpi também foi um grande amigo que fiz por lá, que já reencontrei por aqui. Escritor-cantor-performer e artista psicodélico. Saudades.
Leo Felipe é outro escritor que me convidou para um país inédito em 2009, Venezuela. Adorei conhecer... Quem sabe, eu volto.
Aqui em Campinas mesmo deu pra se divertir, com Marcelino Freire.
O pessoal do Recife organizou a divertidíssima Freeporto.
E agora no final do ano reencontrei em grande estilo grandes ídolos como João Silvério Trevisan e João Gilberto Noll. Pronto. Acabou.
Hum, foi pouco, não? Tudo bem que nem fiz questão de mencionar coisas tipo Bienal... Mas olhando assim, estou achando esse ano curto, acho que foi tudo muito mal aproveitado. Muito mal temperado para quem tem tanto sal nas têmporas como eu. Problema seu. Você me desperdiçou. Quem sabe em 2010 a gente não se acerta?
Fico por aqui, mas o blog deste ano ainda não acabou. Estou sempre online. Stay tuned para pseudo novidades. Semana que vem parto para Floripa, para pseudo-férias de verdade.
14/12/2009
Crítica minha sobre o livro de Michael Chabon, "A Solução Final," publicada na Folha de hoje (aqui, na íntegra).
Verão de 1944, sul da Inglaterra. A Segunda Guerra Mundial ainda não acabou, o país vive tempos de paranoia e as pessoas procuram ajudar umas às outras com uma solidariedade austera. Linus é um garoto judeu alemão de nove anos. Vítima de aparentes traumas, ele se tornou mudo e sua única ligação afetiva é com um papagaio cinza, que vive em seu ombro e repete constantemente números aleatórios. Os dois são adotados pelos Panicker, uma família da região que enfrenta problemas com o filho delinquente, mas vive em razoável conforto e em segurança.
Até que outro hóspede da casa dos Panicker, o sr. Shane, é encontrado morto. Recebeu um golpe
atrás da cabeça e o papagaio desapareceu. A polícia inicia sua investigação. Teria Shane tentado roubar o papagaio e sido morto? Surpreendido o ladrão e assassinado por isso? Seria um crime passional, por um possível romance entre a sra. Panicker e o sr. Shane? Os policiais seguem o caso solicitando a ajuda de um velho apicultor, que guarda um passado de investigações e, quem sabe, não é o próprio Sherlock Holmes no final da vida.
Essa é a insólita premissa da novela de Michael Chabon, "A Solução Final", publicada originalmente em 2004. Uma obra de ficção revisionista (que se aproveita de personagens e tramas criados por outros autores) e que mistura crônica histórica, trama de detetive e até piada de papagaio. Se a mistura é homogênea, não chega a ser saborosa. Falta profundidade à crônica, perspicácia à história de detetive e graça na piada. Mesmo o óbvio talento do autor com a escrita ralenta-se pela tolice da história; as experiências literárias não fazem jus ao que está sendo contado. Já a investigação limita-se a observações óbvias e anagramas banais que podem ser desvendados de primeira pelo leitor.
Americano de 1963, Chabon escreveu, entre outros, o romance "Garotos Incríveis" (levado às telas em 2000) e "As Incríveis Aventuras de Kavalier e Clay" (que recebeu o prêmio Pulitzer de 2001). Também foi um dos autores do argumento do filme "Homem Aranha 2" e escreveu livros assumidamente de fantasia e juvenis. Aqui, em "A Solução Final", o autor parece tentar uma experiência literária que não engrena e conclui-se preguiçosa como suas 112 páginas.
Felizmente, Chabon nunca dá nome a seu velho protagonista. O leitor pode se aproveitar do benefício da dúvida. Ainda que haja certo lirismo no retrato do investigador que está no final da vida, não se pode deixar de pensar que Sherlock Holmes já esteve em muito melhor forma.
(ruim)
10/12/2009
Esse é um trailer feito por um fã, mas já dá um pau no trailer do verdadeiro remake de "A Hora do Pesadelo". Adorei esse Freddy em chamas.
06/12/2009
(Publicada esta semana na capa do caderno de cultura do Jornal "O Popular," de Goiânia. Gracias ao leitor André, que colocou o texto na íntegra lá na comunidade do Orkut)
Caminhos de Santiago
Rogério Borges
Santiago Nazarian é um escritor jovem, prestigiado e que está entre as estrelas da nova geração da literatura brasileira. Aos 32 anos, ele acaba de lançar seu quinto livro – O Prédio, O Tédio e O Menino Cego (Ed. Record) –, um romance em que elenca personagens envoltos em metáforas que, numa fase difícil da vida, mostram como bons e maus sentimentos podem interagir e até se complementar. O que marca, porém, este novo trabalho de Nazarian não é a temática, mas o que o autor faz com ela. Aí está a diferença entre quem sabe escrever e quem pensa que sabe. Nazarian sabe e seu maior talento é imprimir um ritmo seguro e atraente às narrativas. É assim neste mais recente livro e foi assim em seus títulos anteriores, como Feriado de Mim Mesmo e Mastigando Humanos. Tocando em feridas sem ser panfletário, abordando assuntos polêmicos sem transformar sua literatura em bandeira de grupo, criticando a intolerância sem se isolar em guetos, o autor vem construindo uma obra consistente e interessante. Nesta entrevista ao POPULAR, Santiago Nazarian dá sua visão sobre a arte de escrever ficção, informa quais são suas fontes de inspiração, opina sobre inadaptabilidade e preconceito e revela que não tem saudades da infância.
Muitos de seus personagens caracterizam-se por não se enquadrar em padrões, por ser marginalizados. Como é criar seres que não querem ou não conseguem se adaptar?
Meu tema básico – de todos meus livros – é a construção e a preservação da identidade. O indivíduo tentando sobreviver numa sociedade massificada e imbecilizada pelo cotidiano (como nos três primeiros livros) ou por ataques de dinossauros ou zumbis (que surgiram como uma alegoria pop desse embrutecimento, nos dois últimos romances). Acho que essa visão do outsider é bastante natural para um escritor – que já é um excluído e pertence a uma minoria por princípio. Eu ainda tenho outros potencializadores dessa diferença por ser gay, por ter valores um pouco diferentes da maioria... Mas a verdade é que todo mundo pertence a algum tipo de minoria, todo mundo tem seu grau de marginalização – por ser gordo, por ser negro, por ser pobre, homossexual. A questão é que a maioria das pessoas – talvez muitos dos escritores, inclusive – busque os pontos em comum, busque o que nos aproxima, não o que nos diferencia. Eu sempre procurei ressaltar e expor as diferenças, o individualismo, a identidade. E isso se deve basicamente à minha criação, onde a diferença era verbalmente ressaltada. Todos na minha família próxima – pais e irmãos – são artistas. Então sempre houve essa valorização da diferença. Mas ao mesmo tempo, eu não posso me considerar marginal no quesito socioeconômico. Nunca estudei em escola pública, cresci em casa com piscina, fui pra Disney... Se isso tem um lado alienante, tem o outro de estar ouvindo sobre Kafka na sala de jantar.
Nas suas narrativas há a denúncia da intolerância entre as pessoas. Vivemos em tempos inóspitos?
Por incrível que pareça, eu tenho uma visão bastante otimista nesse campo. Acho que hoje há muito mais espaço para a diferença, com toda essa segmentação, a internet, centenas de canais a cabo. Na minha adolescência, os diferentes ainda estavam isolados. Hoje o moleque esquisito do interior do Mato Grosso pode montar um fotolog, postar vídeos no Youtube, escrever um blog e virar uma celebridade alternativa em São Paulo, encontrar “sua tribo”. Mas não foi com essa realidade que eu cresci, talvez então por isso uma intolerância se reflita nos meus textos. Eu não estou escrevendo especificamente sobre hoje, não estou escrevendo sobre ontem. Estou escrevendo sobre um tempo e um universo próprios, reflexo de tudo isso que vejo, que vivo e que vivi.
Narrativas que falam das dúvidas e decisões de adolescentes e jovens costumam ser associadas ao gênero romance de formação. Como você situa seu último trabalho neste sentido?
Eu gosto do romance de formação. E uma das grandes influências desse meu livro novo é um romance de formação clássico: A Fábrica da Violência, do Jan Guillou. Mas eu também tenho um pé forte no pop, no trash. Então prefiro definir como “existencialismo bizarro”.
Estilo direto de narrativa, mas com muitas subversões. Como é trabalhar estes níveis da criação literária, mesclando inovações do estilo com algumas tradições?
Eu me sinto muito confortável nesse universo. Escrevo com prazer, então é tudo muito natural. E eu deixo fluir todas as minhas maiores influências. Eu não tenho filtros – como acho que já tive – de pensar: “ah, não, talvez isso não seja tão literário” ou “talvez isso seja literário demais, talvez seja um pouco pedante”. Nos três primeiros romances eu ainda quis tornar flagrante minha densidade e consistência, então não havia muito espaço para o humor, para as referências, para a brincadeira. Em Mastigando Humanos foi o contrário, eu quis tentar ser o mais lisérgico, debochado e pop possível. Agora acho que estou chegando a um equilíbrio. E um equilíbrio formado por todo meu repertório, tudo o que me constitui.
O que você guarda dos tempos de adolescência? Aquelas experiências o inspiram a escrever?
Não tenho a menor saudade. Principalmente, não tenho saudades da infância. Não passei fome, não sofri grandes traumas, mas era uma criança muito tímida, não socializava, não gostava das coisas de que os meninos gostavam... Acho muito cruel essa fase da infância, de não poder ser quem realmente é, de ter de se enquadrar; até porque você não tem plena consciência ainda da sua identidade e cumpre um papel que esperam de você – e, claro, você não pode arcar com sua própria vida. Na adolescência, principalmente uma adolescência mais avançada, você já começa a assumir sua identidade. Por isso considero essa uma fase mais especial, ainda que dolorosa e difícil. Mas acho que a juventude, quando você já mora sozinho, pode arcar com sua própria vida, e ainda está em plena forma física, é a melhor fase da vida.
Você é um autor reconhecido por seus livros, mas que não abdicou de escrever em seu blog. Como avalia esta relação entre suportes diferentes para a criação literária? Blogs podem ser literatura? O livro de papel vai acabar?
Literatura de blog pode ser literatura, mas no meu blog não é. Lá eu falo de livros que li, de filmes a que assisti, de eventos em que vou participar, de coisas que escreveram sobre meus livros. E, na verdade, minha história com a internet – ou com o blog – veio depois da minha história com a literatura. Eu criei o blog depois de publicar A Morte Sem Nome porque achei que precisava desse espaço para divulgar meus lançamentos, ter esse veículo independente de expressão e, por que não, autopromoção. Acho importante para o escritor de hoje. É uma forma de o leitor o achar, saber mais sobre você, seu universo e seus livros, antes de comprar. Mas eu uso o blog principalmente para isso, não o contrário. Já recusei fazer matérias e participar de exposições sobre blogs porque meu interesse principal é que o blog leve as pessoas aos meus livros (e aos livros, filmes, músicas, peças de que gosto). Quanto a se o livro vai acabar, não creio. Acho que há espaço para literatura em papel e na tela.
Seu trabalho desperta o interesse de grandes editoras, fazendo-as disputarem seu passe. Como é trabalhar com este respaldo e com esta responsabilidade?
Normal. Na verdade, desde o segundo livro publico por grandes editoras (Planeta e Nova Fronteira). E as editoras não interferem no texto. Inclusive elas não querem ter esse trabalho, elas querem o mais pronto possível, para diagramar e distribuir. Não considero “uma responsabilidade” publicar por uma grande editora. Meu texto está lá, já escrito. Se ela comprou, é porque acha que tem possibilidades comerciais. Eu ajudo no que for possível, mas vender é responsabilidade da editora. A minha é escrever; e quando assino um contrato de um livro, já cumpri essa minha parte.
Já ouvi gente dizendo que seus livros são melancólicos. Você concorda? Você é melancólico?
Sim. Talvez seja até uma coisa meio classe média, esse tédio, esse ar blasé. Não posso fugir disso. Eu gostaria de ser mais hardcore, de ser mais pesado talvez, mas consigo me aproximar mais de uma apatia, de uma melancolia. Acho que isso funcionou bem em Feriado de Mim Mesmo, que é um livro muito calcado no tédio. Eu sou muito entediado, até por ser hiperativo. O mundo corre muito lento pra mim.
Os autores brasileiros costumavam reclamar que não era possível viver de literatura. Hoje, alguns deles declaram que o cenário já mudou. Você vive de sua literatura?
Sim. Acho que hoje o escritor é visto como um “detentor de conteúdo espontâneo” que permite que ele sobreviva. Por exemplo, uma revista mensal queria fazer uma matéria sobre a Hebe Camargo, mas a Hebe não queria dar entrevista. “Chame o Santiago, que ele pode escrever sobre a Hebe sem nem falar com a Hebe!” Eu vejo isso de forma muito positiva. Eu acho que o escritor tem uma função diferente do jornalista, até do cronista; ele pode escrever sobre o que não está lá, sobre o que não existe. E as pessoas, os veículos estão cada vez mais carentes desse conteúdo. A informação está por todos os lados, as pessoas precisam de algo além. Isso amplia as possibilidades de trabalho para o escritor. Eu vivo dessas coisas e muito de tradução, que também é um trabalho intimamente ligado com minha literatura, me ensina muito e que eu gosto.
Um escritor jovem desperta curiosidade ou desconfiança?
Ambos. Talvez eu esteja chegando na fase ideal; não sou mais um moleque, então já há mais respeito, e ainda tenho certo frescor... Eu não posso reclamar do reconhecimento que já tive, mas quero sempre mais. Ainda há prêmios a ganhar, e leitores a colonizar.
04/12/2009
O filme dos irmãos gays apaixonados desde a infância.
Primeiro porque essa idéia de um mundo hiper-idealizado, irreal, soa bacana em teoria, mas na prática rende apenas um filme piegas. É uma água com açúcar só, uma sessão da tarde para o público gay. Talvez se eles tivessem carregado um pouco mais na dose (de idealização), pudesse se tornar interessante, não sei. Na primeira cena em que Julia Lemmertz aparece, para abraçar os filhos pequenos em câmera lenta, até fiquei na dúvida se o filme não era uma sátira.
Depois porque eu acho que o grande atrativo do filme está aí, para o público, gay, uma relação bonita entre dois homens lindos, mas como eles não me apetecem, o filme não me fisgou. (O loirinho até que é meu naipe, mas acho broxante essa coisa de gay masculino...)
Dizer que o filme discute algo além, que poderia ser qualquer outro tabu é uma besteira. O filme não discute nada (até porque não tem conflito, todo mundo aceita a relação). Mas ainda acho válido. Fui ver no Frei Caneca (aqui do lado de casa) e obviamente só tinha gays na sala. Acho que muitos gostaram, acharam bonitinho, e não acho que tudo precisa ter profundidade, drama e sangue; só que a mim não pegou.
Talvez minha conclusão final sobre as duas obras seja que eu não gostei do filme, mas acho legal existir; e gostei da peça, mas acho que não precisava...
29/11/2009
(ei... pode-se considerar este post propaganda espontânea, ok?)
27/11/2009
Música do ano.
Conheci o Camera Obscura há poucos meses, apesar de ser uma banda com mais de dez anos. O álbum é bacaninha, e essa música (que ainda não virou single) é matadora. Principalmente porque a letra não faz sentido algum:
There are flowers in my house
[And] I bought them myself
No surprises in my record collection
You must have thought I was someone else
I'm still afraid to get lost in a city I might explore
But I'm not afraid to have an eloquent boy at my door
At my door, at my door, at my door
You want to be a writer
Fantastic idea
You say you've never seen America
I really think you'd like it there
Maybe you should travel with me
Is this the best idea?
Because you've never seen a Redwood
And you've never touched a Deer
A deer, a deer, a deer
A deer, a deer, my dear
Are swans deceiving us all?
I for one should know
I've never felt myself so graceful
And I've never swam so slow
So slow, [so] slow, so slow
So slow, so slow, so slow
[So slow, so slow, so slow]
Esse eles lançaram no começo do ano, e não teve pra ninguém. É um tanto kitsch, bem gay, às vezes resvala até no drag, mas ainda assim é perfeito-perfeito.
Sorry, sorry, tenho muitos amiguinhos tocando, gravando cd, fazendo música da melhor. Mas ninguém chegou perto de Filipe Catto. Em 2010 ele estará no poder.
22/11/2009
Momento histórico: João Silvério Trevisan, eu, João Gilberto Noll. Hoje.
Ahhhhh... Está acabando a Balada Literária. Ótima, ótima, ótima. Divertida, reflexiva e provocativa. Foi uma série de mesas, shows e discussões literárias, que se estenderam pelos bares e pela noite, como tem de ser.
Melamed, Dani Umpi e Nazarian: manguaçados.
Eu tive o privilégio de apresentar a mesa de João Gilberto Noll, contando um pouco da minha história (literária) com ele, fazendo perguntas e abrindo para o público, que compareceu em peso, mesmo sendo às 11h da manhã de um domingo. Vendo o Noll falar, dava vontade de sair correndo de lá e sentar na frente do computador, para escrever. Mestre. Depois fomos almoçar.
Alê (meu ilustrador) agora é ilustrador dele, em dois livros juvenis.
Também assisti a duas mesas com jovens (e experientes) poetas. A primeira com Binho, Analu Andriguetti, Hugo Guimarães, Jesús Ernesto Parra e Maria Rezende; a segunda, com Chacal, Nicolas Behr, Dani Umpi e Michel Melamed.
Umpi, Melamed, Chacal, Behr.
Foi ótimo perceber que, na poesia - até por absoluta necessidade de sobrevivência - as formas e os temas estão muito menos estagnados, há muito mais possibilidade de brincadeira, do pop, de irreverência do que na prosa (brasileira), que ainda é tão formal, tão conservadora.
O grande poeta anárquico Jomard Muniz de Britto.
Xico Sá.
Também foi bacana ver toda a organização do evento, a quantidade de público, gente ótima anotando frases, pegando autógrafos, tirando fotos. Dava até para se sentir na Disney dos escritores. E tinha uma gente bonitinha, viu? Coisa rara em eventos literários...
Acho que por este ano é só (de eventos literários). Espero que o ano que vem continue com tudo. Os trabalhos em si (tradução, crônicas, contos e pareceres) prosseguem. Vou inclusive viajar no final/começo de ano para Floripa de notebook, porque não vai dar pra parar. Mas assim que é bom.
Por aqui no blog, continuamos, porque não tiro feriado de mim mesmo.