23/03/2011

FLORIPA
A ilha, ainda cicatrizando em mim.

Hoje é aniversário de Florianópolis – 285 anos, mas com corpinho e cabeça de 16. Lindo pelo corpinho, lamentável pela cabeça; e Florianópolis é assim mesmo, se recusa a crescer.
Há mais de dez anos eu vinha para cá como turista. Ano passado me tornei morador, fiquei um ano. Não só não me arrependo como acho que foi das melhores coisas que fiz na vida – por isso levo a Ilha tatuada em mim. A magia daqui só entende mesmo quem já veio. E alguns dos seus principais problemas também.

Parto hoje – coincidentemente neste aniversário – de volta para São Paulo, porque não poderia mais viver só de sol e praia. É demais, mas não é o suficiente. E Florianópolis pode até ser mais do que isso... mas não muito mais.

Vai então meu saldo, com o melhor e o pior que encontrei nesta Ilha. Claro que é uma visão pessoal. Muitos dos problemas que encontrei aqui são mais específicos da Barra, mas muitas das delícias também.

10 COISAS QUE ADORO

- Natureza: De longe, o melhor daqui. As praias, montanhas, lagoas, dunas, tudo incrível. E os bichos. Para mim há um atrativo a mais na diversidade da fauna que vi por aqui: cobras, lagartos, morcegos, lontras, leão marinho, pinguins, corujas, quatis, gaivotas, gambás, caranguejos, golfinhos e peixes, peixes, peixes... Em pleno verão, você nada na praia e vê peixes por todos os lados. Tudo bem que já foi bem melhor; a Lagoa mesmo está poluída em diversos pontos, em diversos dias, mas ainda se pesca por lá, se nada, eu já bebi metade da Lagoa praticando kite surf. Bem ou mal, a ilha ainda é preservada. Triste é acreditar que isso se dá graças a tantas limitações e atrasos que persistem por aqui, fazendo se perguntar se evoluir é ecologicamente inviável.

- Tranquilidade: Mesmo em alta temporada, reveillon e carnaval, você consegue sentar num restaurante à beira da praia, sem espera. Encontra diversos pontos vazios nas praias. Pode deixar suas coisas na areia, entrar na água, voltar e encontrar as coisas lá. Mas verdade que essa tranquilidade só fica em seu ponto ideal mesmo até março; depois se converte em... tédio.

-Privacidade
: Penso que eu nunca poderia ter feito isso, alugado uma casa sozinho, morado na beira da praia, no mesmo terreno dos proprietários, numa cidade, digamos, do nordeste. Eu nunca seria deixado em paz. Felizmente o espírito sulista respeita nossa privacidade e eu pude ter todo o sossego e retiro que procurava. Minha relação com os proprietários era cordial e distante. Minhas preferências sexuais, por exemplo, nunca foram questionadas.

-Segurança
: Embora eu tenha sido assaltado na primeira vez que estive em Florianópolis, em 2000, esta talvez ainda seja a capital mais segura do Brasil. Aqui na Barra mesmo, quem vem de São Paulo repara bem: os muros são baixos, os butijões de gás e varais de roupas estão ao alcance dos pedestres, tudo fica no seu lugar. Eu voltava regularmente de noite, a pé, sem o menor medo.

- Surfistas: Não há nada como os meninos manézinhos de praia. Não, nem as meninas. Essa herança genética dos catarinas traz os loiros mais bronzeados do planeta. E o sol, o surfe e o esporte mantém os corpos incríveis.

- Comida de Praia: Camarões, lulas, ostras, mariscos, tudo a preços bem acessíveis.

-Ritmo
: Isso só sente quem mora aqui. Não apenas as férias, não apenas no turismo, mas no dia-a-dia o ritmo é bem, bem mais tranquilo do que em SP, ao menos aqui na Barra. Todo mundo parece meio desocupado, talvez porque trabalhe com o mar, com o turismo, no seu próprio ritmo. Me fez desacelerar bem, sem perder meus compromissos. A gente vê que muito da aceleração é mais neurose do que prazo.

-Esportes
: Minhas opções aqui se ampliaram enormemente: além de ir pra academia diariamente (como eu já fazia em São Paulo), comecei a praticar kitesurf e fiz curso de scuba, fora as trilhas, caminhadas, nadar no mar, tudo com vistas incríveis. Depois de um ano aqui, recuperei finalmente a forma e o tanquinho.
- Insetos: Não há insetos... Tá, há insetos, mas nada do que se espera de um lugar de praia. Na minha casa , nunca tive problema de mosquitos, nunca vi UMA barata. Faz mesmo pensar se a Ilha toda não foi dedetizada.


- Vida gay: Saí muito pouco de balada aqui, mas sempre havia opções... Longe, no centro, mas havia opções. Isso por Florianópolis ser uma cidade turística e uma capital (ainda que pequena). E a vida gay se intensifica incrivelmente no verão. A Mole vira uma praia gay e a Barra vira o pouso. O carnaval estava absurdo: bichas e mais bichas por essas ruas, eu encontrando metade do baixo augusta. Divertido conciliar a vida de praia com isso.



10 COISAS QUE ODEIO


- Transporte público: Florianópolis também tem o “pior índice de mobilidade urbana” das capitais brasileiras, seja lá o que isso signifique. Para mim, na prática, significa que não há ônibus, não há táxis, apesar das distâncias e morros indecentes. Basicamente para ir de uma zona para a outra da ilha, você tem de voltar ao centro (que fica no oeste). Está no leste e quer ir para o norte? Tem de ir ao centro. Pegar dois ou três ônibus é o básico, e as viagens levam facilmente duas horas. A opção do táxi inexiste, é indecente de caro e você não encontra nas ruas. Situação normal você ir a uma festa, clube ou show num ponto distante e na saída não ter UM ÚNICO táxi. Ou você vai de carona, ou arruma carona, ou se ferra.

- Inverno: Não apenas é frio, é nublado, pesado, triste, deprê. Tudo fecha, as pessoas desaparecem, e você (ou eu) que mora à beira da praia fica a ver pinguins, literalmente.

- Ruas: Hum, falei que além de não haver ônibus ou táxi, não há calçadas nem mesmo acostamento em grande parte das vias que ligam os bairros?

-Trânsito
: Não há trânsito... exceto no verão, quando só há trânsito e fica inviável transitar de carro ou ônibus. As filas na Lagoa chegam a horas e horas. É um inchaço que a cidade não tem planejamento e capacidade para absorver. Tudo bem, vou a pé.

-Isolamento
: A ilha é muito grande, tem os morros, não tem transporte, isso tudo potencializa o isolamento, cada um fica no seu bairro. É demorado e difícil ir ao centro. Quem mora no centro também tem preguiça de vir até a Barra.

- Comida: Ok, já falei da comida de praia como um ponto positivo, mas a verdade é que é só isso. Petiscar camarõezinhos à beira-mar, tomar uma caipirinha, e só. Os cardápios são todos iguais, tudo baseado em frituras. Algum drinque além da caipirinha (de limão) já é difícil. E não há doceiras, não há padarias. Ou há algo que se assemelha de leve. Sofri este ano para encontrar um croissant. O salgado oficial da Ilha são aquelas empanadas medonhas.

-Os Cachorros
: a Barra da Lagoa deve ser a praia campeã mundial de cachorros sem donos. Você pode imaginar que não demorou um mês morando aqui para eu ter minha primeira micose...

- Vida Cultural: Não existe. Ok, me disseram que há UM cinema bacana, que fica sei lá onde. Há também uns outros... dez, na cidade toda, passando os blockbusters. Teatro nem precisa falar.

-Serviços: Os manezinhos têm uma relação conflituosa com o turista. Precisam dele, mas não gostam. E tratam mal. E mesmo para quem mora aqui, o serviço é lento e dispersivo. Isso poderia ser relevado – é uma cidade de praia afinal. O problema está também no que é oferecido. Mercadinhos pequenos, com produtos vencidos, preços altos, muita coisa que não se encontra. A Barra não tem NENHUM supermercado, o que às vezes faz falta. E mesmo a Lagoa não tem NENHUMA grande rede. Comprar chocolate aqui é um suplício. Minha academia também, no centrinho da Lagoa, carinha para os padrões daqui, deveria ser boa, mas não tem SEQUER um vestiário, só um banheirinho com um chuveiro elétrico. Ah! Falei que a Barra não tem agência de correio? Nem banco nenhum? Nem caixa eletrônico de NENHUM banco?
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-Moda
: Ok. Cidade de praia. O problema é quando o povo resolve se vestir...


E é isso. Agora é aproveitar o último dia. Nublado, mas com algumas aberturas. Vou ver se ainda consigo mergulhar...

NESTE SÁBADO!