29/11/2012

O PENETRA DO BRITPOP

(foto do Will Cavagnolli)

Em 1995, a Inglaterra vivia uma efervescência musical que a imprensa rotulou de "Britpop". Bandas como Suede, Oasis e Blur haviam estourado fazendo um som que remetia a grandes artistas britânicos (Bowie, Beatles, T-Rex e Smiths), com sotaque carregado e letras que descreviam o estilo de vida do Reino Unido.

O Pulp já existia há quase quinze anos, mas nunca havia feito muito sucesso. Lançara uma série de álbuns que iam do folk ao technopop, e que hoje em dia estão basicamente esquecidos (embora eu pessoalmente goste bem de "Separations", de 1992). A coisa começou a mudar em 1994, quando lançaram o excelente album "His 'n' Hers", produzido por Ed Buller (que já havia produzido os dois primeiros discos do Suede). As letras do vocalista Jarvis Cocker eram crônicas britânicas perfeitas. Daí foi só ele tirar os óculos e meter uma chapinha na franja para se tornar o mais novo herói do britpop.



"Different Class", de 1995, é dos melhores álbuns da época, que trouxe além do hino "Common People", grandes hits como "Mis-shapes", "Disco 2000" e "Sorted for E's and Wizz". Eu já gostava da banda desde o disco anterior, e lembro que a primeira vez que ouvi "Common People" foi no programa do Kid Vinil, na Brasil 2000, porque um amigo meu ligou e pediu para ele tocar para mim. (Pois é, 95, nada de Internet. Para ouvir coisas mais alternativas era nessa rádio, em lojas de CD especializadas ou no máximo no programa "Lado B", da MTV.)

Claro que Suede sempre foi minha preferida - sempre me identifiquei mais com os freaks do que com os nerds - mas Pulp foi das grandes bandas da minha adolescência. E eu nunca tinha visto ao vivo, até ontem.

O show no Via Funchal foi impecável. A banda é bem melhor ao vivo do que eu pensava. Jarvis Cocker continua em grande forma, em todos os sentidos, voz idêntica aos discos, grande performer, espevitado e simpaticíssimo, conversou o show inteiro com a plateia, tentando ler palavras em português de uma cola. Estava cheio, mas não estava lotado. Todo um povo da minha geração - indies trintões, na maioria heterossexuais. Fui com a Fabbie, ex-namorada do final dos anos 90,  e encontrei grandes amigos da época. Dançamos todos como se o século não tivesse acabado.


Fabbie era uma menina indie, que hoje se tornou grande empresária e produtora de shows, e amiga para a vida toda. 

Agora voltei a ouvir Pulp. A banda merece todo meu respeito. Pena que não lançam nada novo desde 2001 - a turnê é aquela coisa nostálgica de grandes sucessos. Mas não dá para negar a genialidade das letras do Jarvis:

"Don't bother saying you're sorry / Why don't you come in
Smoke all my cigarettes again / Every time I get no further
How long has it been? / Come on in now, wipe your feet on my dreams
You take up my time / Like some cheap magazine
When I could have been learning something
Oh well, you know what I mean, oh / I've done this before
And I will do it again / Come on and kill me baby
While you smile like a friend / Oh and I'll come running
Just to do it again" ("Like a Friend")


Ou 

You say you've got to go home
cos he's sitting on his own again this evening.
I know you're gonna let him bore your pants off again.
Oh God, it's half past eight,
you'll be late.
You say you've never been sure,
though it makes good sense for you to be together.
Still you bought a toy that can reach the places he never goes.
Oh, now it's getting late.
He's so straight.

Do you remember the first time?
I can't remember a worse time.
But you know that we've changed so much since then,
oh yeah,
we've grown.
Now I don't care what you're doing,
no I don't care if you screw him.
Just as long as you save a piece for me,
oh yeah ("Do you Remember the First Time"). 



Ou a letra de "Common People"

She came from Greece she had a thirst for knowledge,
she studied sculpture at Saint Martin's College,
that's where I,
caught her eye.
She told me that her Dad was loaded,
I said "In that case I'll have a rum and coca-cola."
She said "Fine."
and in thirty seconds time she said,

"I want to live like common people,
I want to do whatever common people do,
I want to sleep with common people,
I want to sleep with common people,
like you."

Well what else could I do -
I said "I'll see what I can do."
I took her to a supermarket,
I don't know why but I had to start it somewhere,
so it started there.
I said pretend you've got no money,
she just laughed and said,
"Oh you're so funny."
I said "yeah?
Well I can't see anyone else smiling in here.
Are you sure you want to live like common people,
you want to see whatever common people see,
you want to sleep with common people,
you want to sleep with common people,
like me."
But she didn't understand,
she just smiled and held my hand.
Rent a flat above a shop,
cut your hair and get a job.
Smoke some fags and play some pool,
pretend you never went to school.
But still you'll never get it right,
cos when you're laid in bed at night,
watching roaches climb the wall,
if you call your Dad he could stop it all.

You'll never live like common people,
you'll never do what common people do,
you'll never fail like common people,
you'll never watch your life slide out of view,
and dance and drink and screw,
because there's nothing else to do.

Sing along with the common people,
sing along and it might just get you through,
laugh along with the common people,
laugh along even though they're laughing at you,
and the stupid things that you do.
Because you think that poor is cool.



Setlist do show

Do You Remember the First Time?
Pink Glove
Underwear
A Little Soul
Disco 2000
Sorted for E's & Wizz
F.E.E.L.I.N.G.C.A.L.L.E.D.L.O.V.E.
Acrylic Afternoons
Like a Friend
Babies
Party Hard
This Is Hardcore
Sunrise
Bar Italia
Common People

Bis:
 O.U. (Gone, Gone)
Razzmatazz
Live Bed Show
Mis-Shapes
Bis 2: 
Something Changed



Jarvis é foda. 

25/11/2012

OURO PRETO 



Ouro Preto foi lindo. Cidade linda, tempo lindo, e o Forum das Letras foi inesquecível. Os debates foram super interessantes, e pude estendê-los nas mesas dos bares, dos restaurantes, com editoras queridas, leitores lindos, escritores que são meus ídolos. 


Perdido pelas ruas de Ouro Preto. Sexta passei HORAS tentando encontrar o caminho de volta para o hotel. Essas ruas tortuosas, essas ladeiras acho que são as únicas coisas que impedem que o Forum seja prestigioso como a Flip. Afinal, fica difícil para os escritores da terceira idade transitarem por lá...


Só tinha ido à cidade naqueles tempos de escola, quando eu não tinha amigos e não gostava de viajar, uns vinte anos atrás. Fiquei impressionado como a cidade é bonita, gostosa, com os museus, barzinhos e cafés. Meio pedante dizer isso, mas me lembrou bem o clima dos bairros medievais europeus, como em Bruges, Barcelona, Tallin. Estava repleto de turistas europeus inclusive, e aquela petizada universitária. Deu vontade de ficar mais tempo. 


O Forum das Letras foi uma série de mesas e discussões centradas em "Como se Faz um Livro", com a visão de escritores, poetas e editores. Foi um evento eminentemente da Editora Record, sim, pelo menos uma vez a panelinha da Cia das Letras não dominou. E agora que já lancei 3 livros com eles, me sinto de fato um autor "da casa". Combinamos inclusive grandes planos para o ano que vem e o outro, aguarde...

Com  Livia, minha editora mais querida. 

Minha mesa foi com Bernardo Azjemberg e Fernando Molica, mediados pelo André Nigri. (Carpinejar deveria participar também, mas passou mal depois de uma operação e não pôde viajar. Parece que está tudo bem com ele). Bem bacana porque foi de fato um bate-papo sobre processo de criação de um romance, com nós três trocando experiências. Odeio esses debates em que cada escritor faz seu discurso, em que não há bate-bola, interação. Procuro sempre também quebrar a "quarta-parede", mostrar ao público que sei que eles estão lá, jogar a bola para eles. 



(Fotos do debate por Eduardo Troppia.)

O debate aconteceu no Cine Vila Rica, lugar lindo, imenso, e estava bem lotado. Sentar lá no palco, olhar para a plateia e já localizar leitores com uma pilhazinha dos meu livros no colo é o mais gratificante. E não, não é sempre que isso acontece. 


Plateia atenta. 

Consegui também assistir outros debates. Foi bacana ver o lado dos editores sobre algumas questões, o processo todo da produção do livro. Eu já participei de quase tudo - escrita, tradução, preparação de texto, projeto gráfico, capa, orelha, aparatos - mas nunca trabalhei numa editora, no dia-a-dia. É importante conhecer esse outro lado. 

Luisa Geisler, Livia e eu. 

Adorei também conhecer a "menina prodígio" Luisa Geisler e reencontrar o grande Antônio Cícero e o lorde João Gilberto Noll, que inclusive entrou noite a dentro comigo e mais uma pá de fãs, bebendo pelas ruas de Ouro Preto. 


 
Voltei para BH com Antonio Cícero, que além de magnífico poeta e letrista é das pessoas mais fofas desse meio. 


 É aquela coisa, o trabalho do escritor é solitário, o dia-a-dia isolado, então essas são as horas para trocar experiências e poder avaliar realmente como anda sua carreira, quem são seus leitores, como você está no mercado. Tem sido incrível perceber que algumas das minhas leitoras adolescentes, de dez anos atrás, hoje já se tornaram editoras. Num jantar de sexta uma editora inclusive me disse que estava "emocionada de me ver, porque fui um ídolo da adolescência dela". Esse é o belo lado de ter me tornado um escritor de meia-idade.

Noll trouxe uma porrada de jovens leitores. Mas meu fígado não pode mais acompanhá-los...


E o próximo grande evento já é no próximo domingo, dia 02, na BALADA LITERÁRIA, organizada pelo meu irmãzinho Marcelino Freire. Tenho um debate 11:30, na Livraria da Vila da Fradique Coutinho. Sei que é cedo, domingo e tal, mas é com Xico Sá e Efraim Medina Reyes, mediados pelo André Fischer, então não tem como não ser divertido.

Aparece lá, que é a última chance do ano para autografar meus livros mais recentes, comprar de presente de Natal e tal e tal.

A balada tem ainda várias outras mesas, shows, espetáculos, e o grande homenageado é Raduan Nassar. Começa agora, dia 28.

Programação completa:

http://www.baladaliteraria.zip.net/


21/11/2012

AGENDA 

Sábado agora estou em Ouro Preto - Forum das Letras - numa mesa com Bernardo Ajzenberg, Fabrício Carpinejar e Fernando Molica mediados por André Nigri. 18h, no Cine Vila Rica (Praça Reinaldo Alves de Brito, 47, Centro). 

Programação Completa http://www.forumdasletras.ufop.br/

E no domingo, dia 02, estou na Balada Literária, numa mesa com Xico Sá e Efraim Medina Reyes, mediados pelo André Fischer. 11:30, na Livraria da Vila da Fradique Coutinho. 

17/11/2012


UM BODE PARA CHAMAR DE MEU.



Eu não falo de amor.

Amor não existe pra mim.

No meu mundo as pessoas se matam, mas não se casam. Ninguém se casa comigo.

É engraçado quando me perguntam dos temas “homoeróticos”, mais ainda dos temas “homoafetivos” – onde está o afeto? Isso não me interessa. Ao menos, não como tema. Me interessa o conflito, a dor, a solidão, é sobre isso que quero falar. Por isso o silêncio. Por isso nunca me aprofundei nas relações (homo) amorosas, aqui no blog, nos meus livros...

Como um autor gay... Como um autor, e gay, às vezes me sinto devendo à militância. Não me sinto cobrado pela militância, não me entenda mal, ninguém me cobra nada porque literatura não tem importância, não faz diferença, mas eu penso que poderia estar fazendo mais, cada vez que um homossexual leva uma lâmpada na cara, cada um que aparece morto na rua, isso me interessa.

 E quando um colunista equivocado como J.R. Guzzo, escreve um artigo como o que saiu na Veja passada. Um desastre.

Entre outras coisas, ele fala que “casamento gay” não faz sentido por não gerar filhos, compara a relação entre dois homens com a de um homem e uma cabra (o que gerou uma série de divertida paródias da “comunidade” gay) e que os gays “não precisam mais levar uma vida de terror, escondendo sua identidade para conseguir trabalho, prover o seu sustento e escapar às formas mais brutais de chantagem, discriminação e agressão.” (!!!)

Eu não perderia tempo discutindo cada um dos pontos aqui. Porque isso já foi feito por gente mais centrada, e principalmente porque acho que quem lê este blog já tem o mínimo bom senso (espero). Também nunca gostei de pegar os assuntos do momento para tentar audiência. Isso aqui é o Jardim Bizarro, eu sempre quero expor algo diferente. Mas, enfim, claro que é um tema que me cutuca...

Não sou um homossexual nada radical. Não acho que todo homofóbico é enrustido. Prefiro nem acreditar na maldade dos comentários de gente como o Sr. J.R. Guzzo, (apesar desse nome um quanto tanto estranho...). Acho que na maioria das vezes é mesmo apenas ignorância. Cada um é apenas um, A gente não tem ideia do que se passa na cabeça do outro. O hétero que só fez troca-troca com o primo na infância não tem porque não achar que o primo continuou com aquilo por pura sem-vergonhice. Ninguém entende como nasce e se restringe o desejo.

Então não acredito mesmo que um hétero entenda pelo que passa um gay. Uma vida INTEIRA se achando diferente, tanto dos modelos sociais, midiáticos, quanto dentro de casa (pela maioria ser criada em famílias heterossexuais). O negro sofre preconceitos, e não pode esconder sua identidade, mas na imensa maioria das vezes encontra identificação dentro de casa, a família. O homossexual é mais ou menos como o deficiente, que nasce numa família tida como perfeita, mas não se espelha, só que com a vantagem/complicação de poder se esconder.

É ÓBVIO que ser gay hoje ainda é um problema. “BICHA”, “VEADO” ainda são xingamentos, dos mais pesados. Qualquer insinuação de relação gay ainda é considerada ofensiva ou engraçada. Lembro da minha última entrevista no Programa do Jô, ano passado, quando a plateia caçoou por ele ter perguntado se eu já havia pegado numa cobra. Uma brincadeira primária. Minha resposta foi: “Já, qual é o problema?” Tipo, tem algo muito extraordinário por eu ter pegado um pau? Hohoho, que engraçado. Ou que eu tenha chupado, dado; parece que todo mundo nasceu de mãe virgem. Se eu não fiz, sua mãe fez. Se eu não peguei cobra, peguei perereca, aranha, whatever – é mais engraçado? Pois é, ser gay ainda é piada de papagaio.

Hoje se fala que gay está na moda, usa-se expressões como “máfia gay”; eu acho tudo isso uma grande bobagem. Apenas está se reconhecendo que essas pessoas existem, em grandes números. Se houve uma moda, já passou, ficou lá nos anos setenta, sei lá, porque hoje o que é reconhecido como “estilo gay” é a coisa mais cafona que aparece nas novelas da Globo. Não faz parte da moda.

Também uma grande bobagem quem diz que “o que acontece entre quatro paredes não interessa a ninguém”, mentira. Sexualidade é muito mais do que isso. Dita a forma como pessoas se vestem, o som que ouvem, para onde saem, o que procuram no dia-a-dia. E sexualidade é fruto de relações afetivas. Então não é só gente que quer andar de mãos dadas na rua, que quer poder comprar apartamento junto, que quer garantir direito de herança e adoção, é gente que quer ser enxergada, mesmo que não compreendida.

A “propaganda do homossexualismo” bem que poderia existir. Do que esse povo reclama? Precisamos mesmo de mais procriadores? Estamos num mundo superpopuloso, deixe esses inférteis se juntarem, deixem adotarem as crianças sem pai. Deixem-nos se matarem com suas doenças, que seja. E que queimem no Inferno se isso é pecado – o problema é deles. No final só sobrará mais mulher para os poucos héteros comerem. Sério, nunca entendi, qual é o PROBLEMA para um hétero que todos os outros homens do mundo sejam gays?

Ser gay não é fácil, mas como quase tudo na vida, depois que se assume, que se acostuma, fica gostoso. Eu já tive namoradas, não posso dizer que nunca mais vou ter, mas hoje acho difícil de pensar numa convivência com uma mulher na minha casa. Não estou mais acostumado. Mas estou precisando de uma faxineira...

Como propaganda, posso dizer que a relação entre dois homens é bem mais fácil, mais igualitária. Ser gay também te dá acesso a um clube exclusivo internacional. Você pode ir para outra cidade, para o Peru (sem trocadalhos), para a Rússia, Japão e Finlândia que já terá algo em comum, já terá um ponto de contato com pessoas locais. Não acredito que eu poderia viajar como viajei, chegar em bares e boates e fazer amigos tão facilmente sendo hétero. Também não seria tão fácil levar mulheres desconhecidas para a cama...

Também tenho meus bodes com o “estilo de vida gay”, acho que os gays estão cada vez mais caretas, cafonas, coxinhas. A grande maioria adotando esse estilo caricatural “sou machinho”, idolatrando divas pavorosas, investindo na superficialidade. Mas talvez isso seja tudo sintoma dessa resistência da sociedade HT, uma forma de tentar se encaixar em padrões, ser aceito como "normal". 

Eu continuo insistindo na diferença, e a favor da diversidade. A homossexualidade não devia ser problema dos héteros, dos evangélicos, de um colunista reaça da Veja. Eles não têm nada que se meter nisso. Se isso é um problema, é um problema nosso. Quero um bode para chamar de meu. 


11/11/2012

NERDS E UNDERGROUNDS

 Debate na Feira do Livro.

Fábio Yabu é um autor de livros infantis, roteirista de histórias em quadrinhos e criador de desenhos animados. Foi com ele minha mesa na Feira do Livro de Porto Alegre. Estava cheio, principalmente de "jovens nerds" (como eles se autodenominam) seguidores do Yabu e alguns leitores meus. Deu para falar bem de Garotos Malditos, do processo de criação, mas acho que a petizada nerd não é exatamente meu target, talvez eu seja udi-grudi demais para eles, mesmo num livro juvenil; talvez eu devesse levar essa coisa mitológica, vampirológica ou fantástica mais a sério, e não fazer livros tão debochados. De todo modo, não pude deixar de confessar: "Eu gostaria de ser um autor mais hardcore do que eu sou. Fico orgulhoso quando alguém diz que achou algum livro meu muito pesado. Mas não posso posar de excluído que foi abusado na infância. Sou um garoto dos Jardins criado a leite com pêssego." Haha

Tem sido interessante também as mesas que vêm montando para mim este ano (com Eliane Brum, Andre Vianco, Martha Argel, agora com o Yabu, e em breve haverá uma com o Xico Sá e o Efraim Medina). São pessoas que trazem novos públicos, novos temas e novas conversas - talvez porque também já tenha se esgotado o diálogo entre a "Geração Zero Zero".

Eu mesmo ando meio perdido. Ou meus leitores se perderam de mim. Não sei mais quem me lê, não sei para quem interessa o que eu já disse ou o que eu ainda tenho a dizer. Felizmente a crise criativa já passou (a existencial e a afetiva longe disso), e o próximo romance está bem engatilhado. Minha editora está esperando, minha agente está esperando, então dá para fazer acreditando que é para alguém, alguém além de mim.

Com Cris Lisbôa, na Lancheria do Parque. 

O resto da estadia em Porto Alegre foi só amor e alegria, apesar do calor insano. As meninas que mais amo no mundo estão aqui, então toda vinda é motivo de comemoração. Também deu para encontrar leitores mais do que queridos. Lindo por exemplo um Policial Militar que acompanha meus livros há tempos e apareceu na Feira para prestigiar. É ASSIM que deveria ser, a literatura fazendo parte da vida das pessoas reais, não só do seu mundinho autofágico. Eu não me alimento disso.


Eduardo é leitor fiel e grande garoto. 



Letícia, sempre linda. 


Taina, irmãzinha (do Thomas). 

Falando em se alimentar, como se come bem em Porto Alegre (e bem mais barato do que São Paulo). Como eu me acabo sempre que vou lá. Além das trasheiras da Lancheria do Parque, tem as trasheiras do Baalbek, meu árabe favorito. Lá é sempre parada obrigatória. E eu morava bem pertinho - isso, o prédio de Feriado de Mim Mesmo que dá vista para o pátio do Inmetro é lá do lado, na Avenida Paraná. Bons tempos...


Comendo como se não houvesse amanhã, porque não haverá. Dezembro vem com o calendário Maia para tudo acabar. 


08/11/2012

PORTO ALEGRE E ALÉM

Lançamento este final de semana agora, na Feira do Livro em Porto Alegre. Os livros mais recentes da Record (Pornofantasma, Prédio) também estarão lá, para quem não quiser comprar um juvenil.

Tem sido lindinho receber o feedback dos leitores adolescentes.Claro que todos perguntam se haverá uma continuação. Haverá se as vendas se justificarem (tanto para mim quanto para a editora), então é questão de quem gostou do livro divulgar por aí e ajudar a bombar. Eu gostaria de fazer um segundo (e talvez um terceiro..), já tenho um argumento bem delineado, seria uma experiência nova, e acho que o livro deixou aberto para isso. Gosto muito dos personagens, adoraria trazer o Ludo, Lupe e a patota toda de volta, embora seja muito difícil escrever um livro para adolescentes, um público específico, com esse filtro de "não estou escrevendo para mim". Por enquanto, estou trabalhando num novo romance "adulto". Não justificaria a editora lançar a continuação de um fracasso.

A Record também está investindo mais no Garotos Malditos, e começou uma campanha nas estações de metrô em São Paulo e em busdoors no Rio de Janeiro. Obviamente, como sempre, eu cuidei dos textos, e torço para que não fique só nisso. Sei bem como é fundamental o trabalho de uma editora por trás do autor, não apenas em questões publicitárias, mas para colocá-lo em eventos literários, feiras, bienais, para fazê-lo se tornar premiável e respeitado. Eu já ouvi da boca de editores como fizeram esse e esse jovem autor bombarem. É claro que são autores de talento, e os editores os escolheram por isso, mas é uma escolha... E não basta uma boa editora, você precisa estar nas graças dos melhores editores dessa boa editora para não ficar como mais um no catálogo. Como você acha que um livro bizarro (ainda que excelente) de um jacaré de esgoto repercutiu tão bem quanto Mastigando Humanos, pela Nova Fronteira, até hoje, bem ou mal, a editora que mais apostou em mim?


Lestrange, ilustrador do Garotos, me manda seu flagrante do Ludo no metrô Consolação. 


A segunda versão do banner de divulgação. 


Isso tudo pode servir de fermento aos amargos e provar que toda essa geração é fabricada. E isso pode servir de lição aos ingênuos e provar que nem só o talento é vitorioso. Mas o melhor seria que isso não servisse para nada, porque o importante é cada um escrever o que sente independentemente de se vai cair nas graças dos editores, dos marketeiros, dos acadêmicos, tudo parte da mesma droga. Faça o que você acredita. Porque no final SEMPRE vai dar errado.

06/11/2012


RETRATO DO ESCRITOR ENVELHECENDO


Ninguém pode me dizer que não sou aceito pela academia. 


Ser escritor é muito pouco. E ser escritor é um pouco vergonhoso.

Quem precisa de mais uma história sobre um escritor em crise? Por que a história sobre alguém que escreve poderia ser interessante? A história de um escritor é invariavelmente a história de um perdedor, mas quais seriam as histórias dos vencedores? Paulo Coelho, Lair Ribeiro ou Augusto Cury? “O Vencedor Está Só.” Marcelo Rubens Paiva certa vez me perguntou se era uma tendência atual escrever sobre depressão. Mas se não for sobre o fracasso, o desastre, a perda, qual é a graça? A arte se alimenta da crise.

Mas estou divagando...

Ser escritor é muito pouco. E eu ainda me lembro, há uns dez anos, como eu tinha orgulho em me declarar escritor. Era uma novidade para mim mesmo, e era uma novidade. As pessoas ainda não estavam acostumadas com os “escritores jovens, tatuados”, esse foi o mote de algumas das primeiras matérias sobre mim. Nas apresentações informais, eu era visto com desconfiança. “Escritor? Já publicou algum livro?” Agora sim, agora... sete, isso, já publiquei sete (eu já começo a me perder nas contas, escrevendo o oitavo). Mas agora eu não engano, agora não sou tão jovem. As pessoas perguntam, eu digo que sou escritor, e elas acreditam sem mais perguntas. Agora não tem tanta graça.

Mergulhador ou X-man?

Se você não publicou até os trinta anos de idade, desista. Nenhuma conquista é válida depois disso. O mundo não precisa de mais um escritor tiozinho, careca, barrigudo, com peso nas costas.... E o senhor de respeito, acadêmico, pré-pós-supra-graduado não faz mais do que a obrigação em escrever, para que seus pares o leiam. O jovem escritor de sucesso é mais louvável. E mais feliz. Porque qualquer sucesso para um jovem escritor é uma conquista. Cada convite mais proveitoso, cada possibilidade mais possível. Você pode virar a noite na farra em Parati, e acordar produtivo de manhã cedo para uma mesa na FLIP. Leitores e leitoras querem dar para você não só pelos seus dotes literários. Cada palavra escrita é espontânea, toda ficção é de fato vivida. A literatura muda sua vida e isso é o suficiente para você acreditar que ela poderá mudar o mundo. Mas isso só até os trinta, mais ou menos, e olhe lá, pouco além dos vinte e oito. Se você não foi um escritor de sucesso ainda novo, só lhe resta o suicídio.

Haha. Ok, ok, estou sendo muito fatalista. Não desanime, não desanime...

Mas, bah, não leve a sério. Afinal, quem quer ser escritor?  É muito pouco ser só um, e o escritor é ainda um ser mais limitado, solitário, trancado num quarto. Era por aí que eu pretendia que o post fosse inicialmente. Acho que hoje, mais do que orgulho por ser escritor, eu tenho orgulho por também ser escritor, no meio de tantas coisas, entre tantas outras vidas. Ser só mais um escritor de respeito, senhor de idade, é pouco, não me cativa.

E pensava em tudo isso hoje de manhã, pedalando em Florianópolis, onde ser escritor não faz muito sentido. Lá eu sou mergulhador, surfista, às vezes até argentino. Ontem pedi uma caipirinha na praia, o rapaz preparou, perguntou se estava boa e eu respondi: “Está ótima, e olha que já fui barman.” E me soou como uma mentira, um passado tão remoto, uma vida ancestral, mas naquela hora eu era. Bronzeado, tatuado, cabeludo, certamente eu convencia mais como (ex) barman (e argentino) do que como escritor. E eu até já fui um barman argentino. Em Londres, tatuado, galanteador e latino, não fazia a menor diferença se minha cidade natal era Floripa, São Paulo, Buenos Aires ou Rio.


Em Helsinque, eu só pude ser latino. No máximo um genérico de argentino. Mas eu continuei sendo o escritor melancólico, já não tão jovem, trancado num apartamento. Uma coisa Feriado de Mim Mesmo abaixo de zero. Em Florianópolis eu tenho mais vida. Cumprimento a mocinha da farmácia. Corro para combinar o mergulho com o casalzinho submarino. É realmente uma outra vida, e ainda é uma vida minha, apesar de eu não morar mais lá. Nunca vou esquecer um diálogo que tive com a mocinha da peixaria, no começo do ano passado, que já publiquei aqui:

Hora do almoço, estou conversando com a mocinha da farmácia, a mocinha da peixaria me chama.
Ela: Olha, hoje trouxeram lula. Já mandei limpar pra você [porque sei que você gosta].
Eu: Dá dois quilos... E mexilhão.
Ela: Marisco? Mexilhão é gringo que chama...
Eu: O nome é mexilhão. Marisco é o genérico, todos esses moluscos de casca do mar, berbicão, vôngole...
Ela: É nada.
Eu: Tô falando, sou biólogo.
Ela: Você é biólogo? É biólogo nada!
Eu: Tá... mentira.
Ela: Você não tem cara de biólogo. Tem cara de surfista. E surfista marrento.
Eu (saboreando como elogio): Hum... Ok. Mas a coisa do marisco é verdade.

Ficou para meu folclore pessoal eterno.





Ainda engano, diz aí?

Muita gente me pergunta - você me pergunta - por que eu volto, por que eu voltei, porque não fiquei em Florianópolis para sempre. Mas é pouco, não me basta. Não posso viver só na vida de praia. E, bem ou mal, a vida em São Paulo me dá mais condições de manter uma vida esporádica por lá. O trabalho está aqui, a cultura está aqui, a grande maioria dos meus amigos está aqui. Assim tenho conseguido ir uma vez por mês, ou a cada dois meses. Chego lá e pedalo, pedalo como louco (sexta passada pedalei da Barra à armação e voltei - 6 horas seguidas). Às vezes consigo mergulhar e fazer kite surf. Sempre encontro amigos queridos, a familinha local, é uma vida paralela, enfim. Quem dera eu pudesse fazer isso com tanta frequência em Helsinque, Londres, até em Porto Alegre....

 Sábado, não de surfista marrento, mas de mergulhador lânguido. 


A próxima viagem para Floripa ficará para o reveillon. Isso, será lá, com amigos daqui, de São Paulo. Vamos juntar esses dois mundos. Antes disso tem Feira do Livro de Porto Alegre, tem Forum das Letras de Ouro Preto, coloco em breve as datas aqui. Me esforçarei para passar como escritor de respeito, ainda que bronzeado, espero. Espero que bronzeado, espero manter ao menos a cor, nessa cinza, cinza realidade...


 Em Floripa também tenho uma família e filhos. Levei de São Paulo uma abóbora debaixo do braço, dentro do avião, para entalharmos nosso Halloween. Pois é, Floripa é o tipo de lugar que você não consegue comprar nem uma abóbora para entalhar. Está explicado porque não fiquei por lá. 

NESTE SÁBADO!