A VOLTA DA VACA LOUCA
Ana Paula Maia Minotaura, com todo respeito. Sou suspeito. Ana Paula Maia sempre foi das minhas preferidas, minha protegida quando eu podia proteger alguém - acabei até assinando a orelha de duas de suas publicações. Agora ela acaba de lançar pela Record seu quinto e melhor romance De Gados e Homens.
Edgar Wilson - personagem recorrente da autora - agora trabalha num abatedouro de animais. Sensível e de poucas palavras, tenta poupar o sofrimento com golpes misericordiosos. Até que se depara com estranho desaparecimentos de gado, que o coloca de vigília junto aos colegas de trabalho.
O que Edgar Wilson faz é encomendar a alma de cada animal que abate e fazê-lo dormir antes de ser degolado. Não sente orgulho do trabalho que executa, mas se alguém deve fazê-lo que seja ele, que tem piedade dos irracionais.
Mais do que nunca, Ana Paula investe em frases diretas, em imagens telegráficas, num estilo de prosa intimamente ligado ao universo dos retratados: masculino, objetivo, com uma delicadeza muito sutil enxergada mais no não-dito Se em Carvão Animal ela investia numa pseudofilosofia sobre o fogo, aqui ela deixa para o leitor o dilema moral do abate e consumo de carne.
Ainda há momentos deliciosos de humor - como "a guerra entre vacas libanesas e israelenses", que precisam ser separadas - e sou mais suspeito de dizer que grande graça está no personagem Santiago - tatuado, de cabelos compridos, junkie e hiperativo, que morou um tempo na Finlândia e abatia renas por lá. Acho que posso aceitar a homenagem.
Li o livro numa sentada. Numa noite. E se posso dizer que o maior defeito do livro é sua pouca extensão (126 páginas magras), é um bom defeito, porque se cumpre perfeitamente como uma breve novela, com um ritmo adequado à sua trama, de forma alguma apressado ou inconsistente.
Assim fico feliz de constatar realmente que esse é o melhor livro de Ana Paula Maia. O mais maduro - e meu favorito. Espero ansioso pela adaptação para o cinema.
Santiago abatendo renas na Finlândia.