02/11/2015

ZÉ DO CAIXÃO


Estreou neste final de semana no MIS em São Paulo a exposição À Meia Noite Levarei Sua Alma, sobre o cinema de Zé do Caixão. Trechos de filmes, objetos de cena, figurinos e roteiros são apresentados numa espécie de labirinto, que é finalizado com um pequeno trem fantasma. Eu e Murilo fomos no sábado mesmo, na abertura, receosos se conseguiríamos entrar sem convite, visto as filas absurdas que têm se formado nas exposições do MIS (Kubrick, Bowie, Castelo Ratimbum e afins). Estava completamente VAZIA, talvez pelo feriado, talvez pelo tema. Conseguimos ver tranquilamente e ainda assistir a um debate em seguida.

A exposição, na verdade, não é grande coisa. Pequena, apresenta algumas curiosidades aos fãs, mas não creio ser muito didática a quem não conhece bem o universo do personagem e de seu criador. De toda forma é uma homenagem justa a José Mojica Marins, grande cineasta que nem sempre é bem compreendido.

O debate girou um pouco em torno disso - com Liz Marins (a filha do homem), Paulo Sacramento (que produziu o último filme de Mojica, "A Encarnação do Demônio"), Virgílio Roveda (assistente de direção) e Marcelo Colaiacovo (curador da mostra), mediados por Carlos Primati, jornalista especialista em horror. Discutiu-se muito sobre o reconhecimento de Mojica no Brasil e exterior. Primati apontou bem a falácia sobre as injustiças em relação a Mojica. Apesar de estar longe de ser uma unanimidade, poucos cineastas brasileiros têm tanta repercussão, receberam tantas homenagens e prêmios e são tão conhecidos (se não "reconhecidos") e cultuados como Mojica. A exposição no MIS é um dos exemplos disso.

O debate (foto de Patty Fang) (Mojica está bastante debilitado e não foi ao debate - mas soube que fez uma rápida aparição no MIS, mais tarde, quando já havíamos ido embora). 

Discutiu-se bastante também o rótulo de trash que o personagem e o cinema de Mojica receberam. Eu concordo em termos - embora os fãs exaltem o diretor como "gênio", o caráter artesanal de seu cinema às vezes resvala no trash das atuações, dos diálogos. Isso não tira o mérito de Mojica como criador. Há antes de tudo uma personalidade muito forte em seu cinema; ele conseguiu criar um universo próprio e fazer horror nacional de verdade. O clima surrealista, de pesadelo, que Mojica confere ao seus filmes é, ao meu ver, seu grande trunfo; e clima é o principal que um filme de terror precisa ter.

Por esses motivos o meu favorito é "Esta Noite Encarnarei no Seu Cadáver", o segundo da trilogia do Zé do Caixão. É bem divertido e tem um clima de insanidade além dos padrões. Estou longe de ser um especialista na obra dele, mas todo filme novo que assisto, me surpreendo com a ousadia. Fui assistir "A Encarnação do Demônio", no cinema em 2008 com um certo cinismo, meio preparado para achar engraçado, e me deparei com uma obra pesada, em grande sintonia com o melhor cinema de horror alternativo atual. Ao meu ver, o pior do filme é Mojica como ator, que por vezes se torna risível, e traz o carimbo de trash à película.

E as homenagens a Mojica não se restringem à exposição. Agora em novembro estreia no Space a série de TV baseada na carreira dele, com Matheus Nachtergaele interpretando-o e alguns amigos queridos meus no elenco e produção. Ainda não vi, mas estou ansioso.



Também será relançada a biografia de José Mojica Marins - "Maldito" - escrita por André Barcinski e Ivan Finotti, que eu tenho, li anos atrás e amei. Mas não perderei essa nova edição "de luxo" pela Darkside Books (que tem feito tanto pela literatura de terror no Brasil) com 200 páginas a mais (provavelmente atualizando a biografia até os dias atuais).

Olha que beleza de edição. 

E quem quiser se aprofundar ainda mais na carreira de Mojica pode participar do curso sobre o cinema dele, ministrado pelo Carlos Primati, também no MIS, a partir da próxima segunda. Já fiz dois cursos com Primati (de cinema de horror em geral e de cinema de horror nacional) e sempre é fascinante; o cara é um profundo conhecedor e apaixonado pelo tema. Informações aqui:
http://www.mis-sp.org.br/icox/icox.php?mdl=mis&op=programacao_interna&id_event=1957



Espero que tudo isso contribua com o espaço para o horror nacional, na literatura, no cinema. Eu cada vez mais tenho me entregado ao gênero (o filme de BIOFOBIA que estamos fazendo é afinal terror psicológico; meu próximo romance também será) e vejo com alegria amigos e colegas criando uma nova cena para todos nós.


ENTÂO VOCÊ SE CONSIDERA ESCRITOR?

Então você se considera escritor? (Trago questões, não trago respostas...) Eu sempre vejo com certo cinismo, quando alguém coloca: fulan...