Íntegra da resenha que assinei na Folha, semana passada.
“A Entrega” é um filme dirigido por Michäel R. Roskam, com roteiro de
Dennis Lehane, baseado num conto seu. Com o lançamento do filme em 2014,
Lehane decidiu romancear o roteiro e o resultado é uma novela noir recheada de
clichês.
Bob é um “bartender solitário” que trabalha servindo bebuns e mafiosos,
tentando deixar para trás um passado obscuro. Uma noite, encontra numa lata de
lixo um filhote de cachorro vítima de maus tratos e resolve adotá-lo. O cachorro
redirecionará seu rumo na vida, ao mesmo tempo que o aproxima de Nadia, uma
mulher problemática também vítima de agressões.
Se o enredo está longe de ser brilhante e original, funciona como
representante de um gênero cinematográfico. Infelizmente, se como romancista
Lehane se tornou um bom roteirista, como roteirista não conseguiu dar vida ao
romance. “A Entrega” é um dos raros casos em que o filme é melhor do que o
livro, ainda que o filme nem seja lá grande coisa.
Além de clichê, o texto é raso e mal estruturado. Bob aparentemente é o
protagonista da história, mas o foco narrativo oscila constantemente, de forma
desequilibrada, migrando para personagens secundários que ganham uma
importância parcial sem nunca justificar o discurso indireto livre. A ideia de
“homem durão amolecido por cachorrinho” já é de gosto discutível, mas nem na
pieguice o livro consegue se apoiar. A relação de Bob com o cachorro não se
materializa e não justifica as ações do bartender no terço final do livro. O autor
não consegue dar uma personalidade ao cão, tornando-o o personagem mais
apagado da história. As metáforas são pobres, colocadas como comparações:
“começou a sacudir[...] como se fosse a cordinha de um motor de popa [...] Era
um som horrível como se ele estivesse inalando cacos de vidro [...] o rosto
esticado como uma espécie de máscara mortuária” – isso tudo apenas como
exemplos tirado de um único parágrafo.
No final, A Entrega se mostra um romance pulp dos mais baratos,
moderadamente divertido. Faz mais feio pelo nome do autor – que escreveu
“Entre Meninos e Lobos”, entre outros - e da editora que o publica aqui.
Avaliação: Ruim.