Londres, outubro passado. |
Não poderia deixar de ser... Londres teria de estar
na lista mesmo que eu não quisesse, eu não queria, ela se obrigou a estar aqui.
Fui pela primeira vez aos 16, fazendo intercâmbio
no sul da Inglaterra; naquela época, conheci a capital em breves viagens de fim
de semana, em que eu e meus colegas corríamos para aproveitar o tempo na Tower
Records ou no Museu da Madame Tussauds.
O tempo passou e nada mudou...
Londres acabou sendo das cidades em que mais
passei tempo na vida. Em 2002, vindo de um mochilão, acabei arrumando emprego
de barman numa boate e comecei toda uma nova carreira. No Brasil eu já era um publicitário formado, com experiência,
em Londres eu era um latino que sabia falar inglês.
Com Laurence, meu colega de bar. |
Comecei a trabalhar como barman sete dias por
semana.
Era assim que funcionava, os funcionários do bar
marcavam que dias podiam trabalhar; mas eu, como não tinha mais nada a fazer da
vida, marcava para trabalhar todos os dias, para poder me sustentar.
E com a lendária Dusty. |
E funcionava. Porque a maioria dos funcionários
era estudantes que tinham outras atividades ou queriam sair à noite. Eu era o
latino que estava sempre lá.
Com Simon, do Suede. |
Claro, eu tirei algumas folgas, um show do Suede,
um show do Sex Gang Children, mas em geral eu estava sempre lá, atrás do bar. Fora atender os clientes, também fiquei
várias tardes da semana lá ajudando a receber os caminhões e fazer o estoque. Era
divertido. Ser barman tem uma aura, né? Diferentemente de ser garçom, você está
protegido por um balcão, as pessoas vão até você, torna-se um certo status
dizer que é amigo do barman. Aos 24-25, idade que trabalhei lá, foi bem bacana
para mim.
Com meu guitarrista favorito de todos os tempos, Bernard Butler, e David McAlmont. |
O Ghetto se tornou uma boate hypada e marcou
história no elektro. Entre seus clientes, passaram Kate Moss, Bjork, Siouxsie,
Brian Molko, Boy George...
Mas isso também limitou muito minha experiência de
Londres à noite. Quando eu trabalhava lá, dormia quase o dia todo. Acordado de
dia, não tinha muito pique para turismo, não tinha muita grana, e também tinha
minhas tarefas na casa. Morava com três amigos brasileiros e um inglês num
sobrado em White Chapel, na zona leste de Londres, bairro típico de imigrantes.
Os canais de Camden. |
Naquele esquema, não daria para ficar mais do que
alguns meses. Voltei ao Brasil sem arrependimentos, com muita experiência na
bagagem. Logo comecei uma nova carreira como tradutor e escritor (meus dois
primeiros livros, Olívio e A Morte Sem Nome, foram escritos em
Porto Alegre, antes de meu período em Londres, mas publicados depois que voltei
a São Paulo).
carregando os caminhões com Rebecca, querida colega do bar. |
Ano passado tive uma breve passagem de quatro dias
na cidade, após treze anos longe. Não tinha obrigação alguma e preferi assim.
Tinha apenas de esperar o tempo passar até pegar meu vôo de volta ao Brasil.
Estava num final de viagem e também sem muito dinheiro, então preferi rever uma
Londres de leve.
E revendo a Rebecca ano passado, num barzinho em Camden. |
Reencontrei uma capital muito mais cosmopolita do
que eu deixara em 2002. Com um centro e um Soho impressionantes. Apesar de
estar com pouca grana e pouca disposição para balada, consegui aproveitar as
tardes em Camden, os passeios nos rios, canais e parques. Esse é um ponto
crucial que pesa na Londres da minha avaliação: apesar de ser uma metrópole
turística, é possível aproveitar programas tranquilos (vazios) e bucólicos
pelas paisagens em torno da cidade. Foi isso o que fiz.
Encontrei esse estranho parque ano passado, perto de onde me hospedei em King's Cross. |
O lado selvagem de Londres. |
O triste ano passado foi constatar o fim das lojas
de disco; sempre associei muito a cidade à música, minhas bandas favoritas vêm
de lá, mas o paraíso de grandes lojas de discos já não existe mais. Claro, não
existem em nenhum lugar, mas achei mais fácil encontrar novidades em Paris, que
ainda tem as Fnacs com grandes seções de música, do que em Londres.
Consegui comprar algumas coisas em lojas pequenas, mas ficou claro que as
vendas estão entregues à internet, e que para isso estar na cidade não faz
muita diferença.
Hyde Park |
Mas enfim,
Londres permanece como a cidade mais importante de todas minhas influências
literárias, musicais, artísticas, como a formação de mim mesmo. A breve
passagem ano passado me deixou com vontade de mais; é um lugar onde eu poderia
ser novamente feliz.