61 autores dá um peso. |
Lançamento importante, que já deveria ter sido feito antes, mas que chega em bom momento, e da forma como deveria.
Para quem não se lembra, há mais de uma década eu planejava lançar uma antologia de contos gays, com clássicos e novos; chamei para a parceria o Marcelino Freire, fechamos contrato com a Record, mas fiz a besteira de comentar com o Luiz Ruffato, que correu para lançar antes uma antologia com o mesmo tema - que, apesar de ter sido uma publicação irrelevante, acabou travando nossa publicação na época.
Em face dessa antologia que sai agora, vejo como meu projeto ficou velho, e que não faria mais sentido hoje.
"A Resistência" mistura gente demais, prosa com poesia, e confesso que desconfiava do saldo final - boas intenções não fazem boa literatura. Mas terminando o livro agora vejo como é importante para o projeto essa pluralidade de vozes; e tem mais coisa boa do que eu imaginava.
Há olhares muito literários e raros sobre a condição trans. Amara Amoira faz um conto inteiro no pajubá (linguagem do gueto), em fluxo oral, muito divertido e bem escrito. Juno Cipolla aborda o universo trans-masculino também com muito lirismo. E Laila Oliveira tem um ótimo conto de cross-dressing.
A charge do Laerte (na pagina interna), é bem bacana. Cidinha da Silva e Daniela Stoll têm contos lésbicos bem bonitos - a segunda com uma imagem belíssima da descoberta da homossexualidade num salto para a piscina "no caminho entre o ar e a água." Leonardo Tonus foca a expulsão de jovens gays num belo poema. Mike Sullivan faz bonito (como sempre) com um continho otimista (ainda que melancólico). E há outras coisas bem boas, algumas meio tolas-pretensiosas ou apenas panfletárias-imaturas, mas no geral, como eu disse, o saldo é bem positivo.
Talvez as duas maiores surpresas do livro sejam os contos de Jean Wyllys e de Raphael Montes. Wyllys faz um ótimo registro dos encontros nos tempos de "chat-uol" - fico surpreso de ele mergulhar (tão bem) na ficção, sem pretensões de fazer discurso; e Montes trata da cura gay de forma bem mais literária do que sua produção costumeira, no que talvez seja o melhor texto do livro.
(Ah, sim, e eu também estou lá com "Sonho de Uma Noite de Verão", quase um conto de terror, de um homem que levanta da insônia da madrugada para abusar do filho pré-adolescente.)
Trechinho do meu. (clica que aumenta) |
Só senti falta de explicarem melhor a "proposta" na apresentação do livro. O projeto inicial seria uma revista literária e o tema era "Para Além do Azul e do Rosa". Esse tema foi apagado, mas ainda aparece em diversos contos e poemas - então pode parecer estranho por que essa expressão aparece tantas vezes.
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