COMO MARRETAR BATRÁQUIOS
Esta noite, terminei de ler John Fante e peguei novamente "A Crônica da Casa Assassinada", do Lúcio Cardoso, numa edição para lá de caprichada. Numa entrevista em que o Ésio Macedo Ribeiro fez recentemente comigo (em breve coloco o link aqui), conversamos sobre esse livro e me deu vontade de lê-lo novamente. Isso tem se tornado cada vez mais difícil, quero dizer, reler livros queridos, porque tenho tantos outros inéditos me esperando...
Estou longe de ter lido de tudo. Nunca li alguns autores ditos "obrigatórios", nem tudo daqueles que são fundamentais para mim. E cada vez mais tenho de ler contemporâneos, amigos, colegas, leitores que mandam originais. É um prazer e um privilégio, quando não se torna uma obrigação. Quando começa a me impedir de ler outras coisas, se torna assustador. É como eu digo, às vezes me sinto em frente aqueles brinquedos de parque de diversão, em que você tem de dar marretadas em cada sapo que aparece, e cada vez eles vêm em maior número e mais velozes.
Mas pior acho esses escritores "estabelecidos" que dizem "não ler originais", ou pior, "não ler contemporâneos". Para mim, eles estão pedindo para não serem lidos. Há pouquíssimo tempo eu era autor estreante, ainda posso me considerar autor iniciante, a repercussão que tive devo em grande parte a gente com pilhas enormes de livros que se dispos a me dar uma chance. O mínimo que posso fazer é dar uma força para quem vem atrás na fila.
Só que por pensar assim mesmo que eu me angustio. Geralmente recebo os livros e aviso que vou demorar para ler, para dar conta de tudo, poder manter também minhas próprias escolhas, mas fico vendo aqueles livrinhos ali, de gente tão ansiosa para ser lida, e acabo achando que Guimarães Rosa não precisa mesmo de mim...
E ainda tem as traduções, que acabam sendo uma leitura hiperaprofundada, que exigem muito de mim mas me dão um enorme prazer.
Eu gosto muito da prosa contemporânea norte-americana. Não vou chegar ao ponto de alguns, que dizem que eles escrevem melhor do que nós. Eu não concordo. Acho que os escritores contemporâneos brasileiros tem uma preocupação intensa com a forma. De maneira geral, trabalham as palavras e a poesia na prosa com mais afinco do que os americanos por exemplo, mas muitas vezes menosprezam a história. É aquela velha frase de que "toda história já foi contada", de que eu discordo com fúria. Talvez, pelos americanos terem uma "indústria cultural" mais estabelecida, principalmente no cinema, os escritores se preocupem mais em contar histórias, que possam ser posteriormente filmadas, sem preconceitos (aqui geralmente se diz de forma pejorativa que um livro foi feito "para o cinema", talvez seja pelo tipo de cinema que se faça com os livros brasileiros...).
Minha mãe também lê muita prosa americana contemporânea, voltava todo ano de Nova Iorque carregada de livros, e respingava alguns em mim. Quando comecei a seguir meu próprio caminho literário, resenhei alguns na Amazon (deus queira que as resenhas não estejam mais lá), até que um professor norte-americano – provavelmente vendo que eu não entendia nada do assunto, haaha – começou a me enviar livros de presente.
Dele eu recebi Tom Spanbauer, Eric Swanson, Peter Cameron, Jim Crace.
E fico feliz de estar seguindo com isso, traduzindo alguns autores que considero importantes (outros nem tanto) para o português. Minhas últimas resenhas na Folha também foram de autores estrangeiros (ingleses), com livros muito bons ("Terroristas do Milênio", do Ballard e "Michelângelo, o Tatuador", da Sarah Hall).
Atualmente, estou traduzindo um romance do cineasta Gus Van Sant (ficção, com ilustrações inclusive) e um romance escrito pelo Marlon Brando e o Donald Cammell.