GODZILA SALVOU MINHA VIDA
Ahhhhhh... a guerra acabou. Ontem de noite tava tão gostosinho, tão aconchegante. Eu trancado em casa, todo mundo trancado na sua, as ruas vazias, só o barulho dos helicópteros. O friozinho. A sensação de cada um na sua, mas com alguma coisa em comum. Só faltava chover.
Imagine como será quando as ruas forem dominadas por zumbis? Ou quando o trânsito estiver caótico por uma invasão alienígena. Dias como ontem dão essa sensação, de estar vivendo algo histórico, como no dia do apagão, como na queda das torres gêmeas...
No dia 11 de setembro de 2001 eu morava em Porto Alegre. Entrei numa reunião com a Telefônica Celular de manhãzinha e saí com a Terceira Guerra Mundial começando. Todas as TVs ligadas em NY. Voltava para casa e via pelo caminho todo mundo sintonizado na mesma coisa. O Xou da Xuxa (ou sei lá o que era) estava suspenso. A sensação de que algo acontecia...
Ontem foi parecido. Eu aqui em casa de tarde, bebendo café, tomando coca-cola e traduzindo um filme, quando minha mãe liga e fala para eu não sair de casa, que a cidade estava o caos, todo mundo morrendo e decretando toque de recolher. Fui direto pra academia. Preciso estar em forma para enfrentar os mal-feitores, não é mesmo? Além do mais, passara o dia todo aqui em casa, estava pilhado e precisava descarregar. Melhor morrer de tiro do que de tédio.
Encontrei as ruas paradas pelo trânsito, pedestres aos montes, gente estocando água. Exagero. A academia estava aberta. Mas quando terminei e voltei para casa, já não havia ninguém na rua...
Pelo menos teremos Copa do Mundo em Breve, e eu poderei passear pelas ruas silenciosas novamente, ouvindo gritos e explosões dos torcedores trancafiados...
Só para piorar as coisas, um dinossauro gigante despertou e passou a destruir a cidade. Ninguém mais se preocupa com literatura e filosofia, só querem salvar suas vidas. Os jornais, a televisão, só falam nisso. Eu posso escrever sobre fome, posso ruminar existencialismos, mas todo mundo achará que são tolices e se preocuparão com as manchetes do dia. Assim, qual prédio foi destruído, quem foi devorado. E minhas enxaquecas e meu apetite? E minhas questões filosóficas? Todas pequenas. Todas inúteis se aquele enorme lacertílio destrói todo o resto. Ao menos é uma boa desculpa para meu desemprego. Todas minhas preocupações se tornam menores sob o peso de uma pata pré-histórica. O meu medo é que minhas prerrogativas também se tornarão. Eu, afinal, sou ínfimo diante daquele réptil que faz a cidade tremer. Por mais que sua força se concentre unicamente no físico, todos se curvam perante a ela. Enquanto que eu serei mais um frustrado. Literato.
Isso aí também é de "Mastigando Humanos", blablablá... É que estou naquela fase em que parece que tudo tem a ver com meu próximo livro. Blablablá.