27/04/2007

VIDA MARÍTIMA NA MINHA RUA

(Este é o peixe que canta "I Don't Know Why I Love You But I Do" ALguém me dá de presente de aniversário? É mês que vem...)

Uma das perguntas mais comuns em entrevista a um escritor é “quanto da vida real influencia na obra”. Mas ninguém nunca pergunta – e na minha vida eu acho que é mais assim que funciona – como a obra influencia a vida.

Minha vida imita minha arte, afoga-se, engasga-se nela.

Pensava eu, por exemplo, nas inúmeras referências às feiras de rua, peixeiros abrindo espinhas de mulheres, feirantes românticos preocupados com os peixes em seus dedos, Referências que são encontradas em meus textos há anos e anos.

E eu que nunca gostei de peixe. Muito menos comprava em feira. Hoje me pego vivendo situações olivianas, com uma feirante aqui na rua...

Há várias semanas que venho progressivamente abandonando qualquer outro tipo de carne e só comprando peixes. Nesse processo, fui me acostumando a escolher peixes na feira, ir além dos óbvios “de elite” e pedir cortes específicos, escolher as melhores partes...

Na minha nuca, há uma tatuagem de espinha de peixe, que fiz na Finlândia.

Feirantes homens gritam, são agressivos e eu não entendo como aquele método de ataque-e-venda pode funcionar. Acabo driblando os barbudos e chegando a uma mocinha rechonchuda, que me recebe com sorriso e sabe do que eu gosto.

Hoje, ela me deu um cartão com telefone e nome: Vera. “Me liga um dia antes, que eu separo o que você quiser...”

Saí com salmão, atum, badejo, pescada branca...

Mais tarde, a feira se desmontava, e ela, de galochas, esfregava o asfalto com cloro e sabão. Passei longe para ela não ficar constrangida de me ver com o esfregão em mãos...

Quantas vezes passei por essa rua e ainda senti o cheiro de peixe. Vi escamas que sobraram. Brinquei com quem estava comigo: “Essas escamas é porque aqui, há milhares e milhares de anos, era mar...”

E quantas vezes passei por essa rua, senti o cheiro de cloro e pensei comigo mesmo: “Hum, JT. Leroy...”

E você ainda acha que precisa de Universidade para entender literatura?

Plus:

- Alguns me perguntaram e confirmo: A primeira edição de “Mastigando Humanos” está esgotada sim. Mas já está vindo a segunda (espero eu...). De qualquer forma, ainda dá para encontrar o livro no estoque de várias livrarias.

- Ainda não sei quando minha entrevista com o Melamed vai ao ar.

- “Hannibal Rising” é o pior filme de 2007, até agora. Mas também não tenho visto muita coisa...

- Alberto Fuguet, escritor chileno bambambam, me mandou hoje esse email, sem maiores explicações: “congrats u are one of the 39 new hot writers of lat am!” Alguém sabe de onde ele tirou isso?

- Tenho visto todas as versões possíveis de “O Corcunda de Notre Dame”, por causa de uma tradução/adaptação. E até agora não entendi como esse livro chegou à Disney.

- Será que daqui a cem anos poderemos ter meu jacaré cantando num desenho, dublado pelo neto da Madonna?

25/04/2007



“A maleta aberta e vazia permanece respingada de sangue sobre a mesa. No chão, próximos aos pés de Salvatore, uma bolsa de náilon vermelha semi-aberta. Amadeu abaixa-se para abri-la e numa primeira revista não lhe dizem nada. São pacotes pequenos e bem fechados. Pacotes que ainda não se sabe, mas mudarão algumas vidas.”

Ana Paula Maia é uma pistoleira. Não sei exatamente se “no bom sentido”, pois então qual seria o mal? O que importa, é que ela tem munição, tem pontaria e não tem medo de apertar o gatilho, provando ser uma escritora matadora. Neste seu segundo romance, narra a saga de homens perdidos, assassinos, traficantes, cineastas da boca-do-lixo que tentam salvar suas peles sempre das piores maneiras possíveis. Tudo começa quando Amadeu, um decadente ator pornô, encontra uma sacola cheia de cocaína, no escritório de seu poderoso patrão. Tentando repassar a mercadoria, ele vai cruzando, trombando e atropelando personagens insólitos: Horácio, um pobre operário do cinema brasileiro; Edwiges D’Lambert, uma produtora manca e mafiosa; Gina Trevisan, uma boxeadora esmurrada pelas dívidas; além de, quem sabe, açougueiros, ladrões de órgãos, uma pompuarista cuspidora de fogo. É uma verdadeira guerra do submundo, que parece pronta a virar filme. Inteligente, divertido, kitsch, “A Guerra dos Bastardos” revela uma jovem autora que sabe muito bem o que está fazendo, e é disparado a melhor contadora de histórias desta geração. – Santiago Nazarian

Capa, trecho e texto de orelha do novo romance de Ana Paula Maia, “A Guerra dos Bastardos”, recém lançado pela Língua Geral. Além de assinar a orelha, eu ajudei a mocinha a dar o título (que estava implícito no texto, claro). Demorou pra ela lançar esse segundo romance, mas valeu a pena esperar, a edição está lindíssima, num formato menorzinho, com as bordas das páginas em vermelho. Já está na livrarias. (Mas cadê o meu?)

Esta semana também entreguei a orelha do romance de estréia da Victoria Saramago, “Renée Esfacelada”. Deve sair em breve, daí coloco a orelha aqui.

Antes que eu me esqueça, sexta agora, 21:30 na PlayTV (canal 21?) tem minha entrevista jogando videogame com Luciano Amaral. Acho que ficou divertido, confiram.

E já estou arrumando as malas para minha turnê latina, que começa daqui a quinze dias, por Chile e Argentina... Depois eu conto.

22/04/2007

O INIMIGO ELEGANTE

(Viu só? No meu tempo, isso é que era ser gótico de raiz...)


E se me disserem que você está enfermo,
recolhido em hospital, insone,
seu coração desgovernado à mingua,
que eu faço do meu amor anônimo?

Como faço chegar os beijos tantos,
O brilho, o riso, o abandono
como levo até você os meus temperos,
como cuido das suas dores, como?

(Poema de Elisa Nazarian)

Minha mãe lança seu segundo livro esta semana, na Livraria da Vila, um volume de poemas chamado “Feito Eu”. Convite abaixo. Vejo vocês lá.


Saiu este mês uma matéria grande comigo na revista Mag! Por ser uma revista de moda, eles se concentraram em questões que, ao meu ver, não tem tanta importância no meu trabalho, mas ainda assim tem umas declarações curiosas:

“Nazarian é um galã extremamente talentoso e tem um gosto musical e literário refinadíssimo. Se eu fosse gay, investiria nele. É homem pra casar.” – João Paulo Cuenca

(Cuenca, se a gente se casasse você me levaria para passar a lua de mel em Tóquio?)

“Os livros de Nazarian tinham de vir com pôster central pra gente destacar e botar na parede.” – Cecília Giannetti.

(Cecília, estava tentando vender essa idéia pra "G", que paga pouco, mas ainda assim mais do que os tradicionais adiantamentos do meio literário.)

E uma supostamente minha: “A vida gay é complicada. As pessoas não querem namorar, elas só querem ficar por uma noite.”

(Haha. Eu disse isso? Puxa, não pensava que isso fosse um problema...)

Hoje fui cobrir o show do Evanescence para a Rolling Stone. Minha opinião você lê na revista do mês que vem, mas achei interessante a legião de metaleiros mirins do público. Não eram góticos. Não eram emos. Eram metaleirozinhos mesmo, alguns com os pais. E o entusiasmo deles com certeza era o mais divertido do show.

Agora genial, fantástico, incrível (como sempre) é o novo cd do Rufus Wainwright, “Release the Stars”. Nessa atual onda de cantores-pianistas-dândis-solo que estoura na inglaterra (com gente como Mika e Patrick Wolf), Rufus prova que é de longe (quilômetros, na verdade) o melhor deles. Mas exatamente por isso, não é assim tão pop, vai continuar sem estourar e sem fazer sucesso, embora talvez este seja o álbum mais acessível dele.

Clipe do primeiro single, "I'm Going to a Town": http://www.youtube.com/watch?v=21hJ_8-eKFo&mode=related&search=

Para terminar, a história do Coreano que matou seus colegas e mandou um manifesto multimídia para as redes de TV: Se você tiver algum professor de sociologia de butique ou semiólogo de Faap dizendo que isso é um reflexo da nossa cultura de reality shows, blábláblá, escreva um poema fúnebre e o ameace de morte.

18/04/2007

“A NOITE É UMA VACA PRETA”


"Eu vou ajoelhar e rezar contigo..."

Sei que não é novidade, mas só conheci agora. A coisa mais spooky, bizarra e sinistra que já vi na net:

http://www.youtube.com/watch?v=P1PE4X4biCo

Vocês vêem só, vou para o Rio de Janeiro, capital intelectual do país, bebo com escritores, janto com poetas, “cultivo o vácuo” com performers e volto a SP com uma pérola dessas...

A viagem foi proveitosa. Muito proveitosa. Talvez mais proveitosa do que divertida, é verdade, mas isso ainda é uma coisa boa. Pude reencontrar amigos queridos, conhecer gente nova - como a jovem, talentosa e lindíssima escritora Simone Campos (sério, não esperava que ela fosse bonita assim. Se bem que ela é quase emo...) - e fazer contatos interessantes.

Hoje gravei o programa do Michel Melamed, “Recorte Cultural”. Só tínhamos falado por email, mas senti uma sintonia com ele, apesar de eu ter ficado bem perdido. Eu nunca tinha assistido (passa na TVE e algum canal a cabo), então tentei, a entrevista inteira, entender o formato do programa (se é que tem formato...). Mas foi interessante. Talvez a entrevista mais interessante da qual participei. Saíram coisas bem legais. Vamos ver o que vai ao ar... e quando. Quando souber a data, aviso.

Antes do programa, tentei me matar de alergia, envenenamento e intoxicação alimentar, comendo todo o tipo de crustáceos num restaurante com minha Editora. Não surtiu efeito (negativo) felizmente. Nunca me empanturrei tanto de lagostas. Delícia. Depois dessas posso reclamar do Rio?

Hum, bem, faltaram as beldades de Ipanema... achei a praia meio vazia, tudo meio vazio, a noite, os bares, as ruas... Estranho. Mas deu pra curtir as belas livrarias (porque o Rio ainda TEM livrarias como as de antigamente. Em São Paulo, são raríssimas). E um jantar com Antônio Cícero já valeu por tudo.

Só vou manter em segredo que me arrastaram pro “Buraco da Lacraia”.

(Vixi, está passando “Psicopata Americano” aqui na TV. Vocês já leram Brett Easton Ellis? É bom? Qual recomendam dele?)

A semana em SP já começa pela metade e estou correndo, pra variar. Mas quero ver se começo a nadar. Amanhã. De manhã. Cedinho. Será que consigo? Será que passo no teste dermatológico? Será que todas as lagostas, na última hora, não vão me empolar?

A noite é uma vaca preta e vou nessa. Beijos.


13/04/2007

ESPELHO MEU
Ilustração de J. Lestrange baseado na personagem "Ana Rosa", de "Mastigando Humanos" - jlestrange.blogspot.com - Essa ilustração já dispensa uns 5 mil caracteres do livro.


Depois que reformaram meu banheiro... Ok, voltei a falar do meu banheiro, e dos vazamentos do meu apartamento, blábláblá, ao menos assim não terei de me repetir em romance, LIVRO, que você comprará com sua grana suada e lerá com toda a dedicação do mundo, não? Não? Não?

Depois que reformaram, quebraram, remendaram e rejuntaram meu banheiro, os pedreiros deixaram interruptores nus que ameaçam arrepiar os cabelos de efebos idem que, eventualmente, adentrem meu banheiro.

(eu sempre prefiro que os efebos permaneçam com as franjas caídas no rosto. Esta história de topete – alcinha pra boquete – não combina com meu sofá, mas, voilá, parece combinar com meus interruptores)

Aqui em casa já está tudo arrumadinho. Agora a faxineira vem sempre. Mando minhas roupas para lavanderia. Comprei móveis novos. Então por que não posso ter um banheiro arrumadinho?

Por que um rapaz como eu, que NUNCA recebeu instrução nesse sentido, tem de sair pelas ruas procurando ESPELHOS para banheiro? E primeiro ele tem de aprender que a simples tampa de tomadas e interruptores é chamada de ESPELHO, porque se ele diz “quero comprar uma tomada ou um interruptor”, os vendedores oferecem para ele outra coisa, como se ele não tivesse aprendido trigonometria na escola e sim a IDENTIFICAR ESPELHOS DE INTERRUPTORES!

(Por que, porra, nunca me ensinaram na escola qual é o nome dessa placa ordinária que cobre buracos de interruptores, e eu tive de decorar a tabela periódica?)

Pois bem, e, aparentemente, a não ser que eu esteja muito errado, a não ser que eu seja muito burro – porque nunca realmente estudei essa matéria na escola – é a coisa mais complexa do mundo achar um maldito ESPELHO para interruptores e tomadas de banheiro. As lojas em que eu fui – de materiais de iluminação, veja só, na Consolação – dizem “isso é difícil”. E, entendam, que eu saiba, se é que aprendi direito, ESPELHO é qualquer plaquinha dessas que tem envolta do interruptor, mesmo que não seja espelhada. Mas “é difícil” de achar. Então estou quase tirando a da cozinha pra colocar no banheiro.

(Ai, vocês viram como é difícil ser um homem solitário no mundo real? Esses dramas eu não poderia colocar em “Feriado de Mim Mesmo”.)

Da minha incursão por lojas de iluminação, voltei com um strobe pra casa.

Viu como o mundo conspira para sermos dândis-decadentes?

Falando nisso, já saiu a revista Joyce Pascowitch de abril, que tem uma belíssima matéria/entrevista que fiz com o Cauby Peixoto. Mais belíssimas ainda estão as fotos do Cris Ameln Von Ameln, que ilustram a matéria. Cris tem sido grande parceiro nas minhas matérias na Joyce e sempre registra o melhor. Confira


Nos próximos dias estarei no Rio, gravando alguns programas de TV e dançando o chachachá.


Tenho ralado tanto para ter tempo de fazer essa e as próximas (grandes, incríveis) viagens - e ainda tenho de procurar malditos ESPELHOS para interruptores - que não tenho tempo de mais nada. Nem mesmo o Lúcio Cardoso terminei. E faltam só 30 páginas...


Então vou lá.

10/04/2007

ZUMBIS DE PÁSCOA



(Siouxsie says: "Viu só? É só ficar sem lavar o rosto desde 78 que um dia volta à moda")

Vejam só como é útil ter um blog. Depois que minhas divergências com o calor foram manifestadas, encarregaram-se de resolver o problema e proporcionar um outono ameno aos paulistanos. Sinto muito que isso tenha se dado justo num feriado...

A única pessoa que vi no final de semana foi minha faxineira – que me agradeceu por ter dado o único ovo de páscoa que ela ganhou, mas eu mesmo não ganhei ovo algum. Nem tive almoço de família. Nem um abraço amigo, chuif. - depois que a faxineira foi embora, fiquei aqui trancado, esquecido, com o apartamento em ordem e eu me esparramando por ele, deitado no pufe, assistindo ao novo DVD da Siouxsie.

Vi Siouxsie and The Banshees ao vivo duas vezes – uma aqui em SP, em 95, e outra em Londres, em 2002. A primeira foi ótima, a segunda terrível, pareciam um bando de velhotes querendo mostrar que ainda podiam ser punks – agora Siouxsie deixou de lado o “Banshees” (que era basicamente ela e Steve Severin, o baixista), largou o “Creatures” (que é ela e o marido, Budgie) e assina os shows só com seu nome. Paradoxalmente, é nesse momento que ela parece dividir mais o palco com os outros músicos, em especial com Budgie, baterista. Ela ainda conta com uma orquestra inteira e um percussionista oriental. Saiu do punk geriátrico para se tornar o melhor que ela poderia: uma diva gótica-glam-globalizada.

O DVD é de um show de 2004 no Royal Festival Hall (onde eu já vi ao vivo um show do Suede, também com orquestra). Por assinar com seu nome solo, Siouxsie canta tanto músicas novas quanto músicas do Creatures e dos Banshees, entre elas, vários hits: “Cities in Dust”, “Christine”, “Kiss them For Me”, “Peek-a-Boo”. A voz dela não está na melhor forma (em músicas como “Face to Face” chega até a ser constrangedor, apesar da orquestra salvar no arranjo), mas sua performance é incrível, simpática e sensual e a fotografia do show é absurda.

O DVD ainda é recheado de extras, entrevistas, passagens de som, músicas extras. Fez com que eu resgatasse todos meus velhos cdzinhos do Siouxsie and the Banshees. Depois de eu ter redescoberto Peter Murphy, parece que 2007 é o ano de eu voltar às minhas raízes...

Para ver um clipezinho deste DVD da Siouxsie, da música “Godzila!”:

http://www.youtube.com/watch?v=G43r3F1pbAw&mode=related&search=

Então, voltando ao pufe, à Páscoa, ao esquecimento. No domingo resolvi sair brevemente para caçar meu próprio jantar de Páscoa, alugar um DVD, coisas assim. Encontrei as ruas vazias, um frio, uma melancolia, que só podia ser enriquecida pela presença de zumbis. No meio da Paulista, vendo os poucos transeuntes solitários que avançavam, tive a ligeira impressão de que eram zumbis vindo em minha direção. Queriam meu cérebro de ovo de páscoa? Cérebro com recheio de trufas. Cérebro com recheio na casca. Cérebro sem recheio algum. Minhocas na cabeça.

Cheguei em casa e recheei meu cérebro com licor de cereja. (E, devo confessar, troquei o DVD da Siouxsie pelas “Obras Completas” de Mr. Bean. É, eu gosto, devo confessar. )

Para terminar... Não vá chorar... não fique triste... não se aborreça... Sei que eu não estava falando sobre o “Le Kitsch C’est Chic”, é porque o programa... ACABOU. Sim, eu não estava mais dando conta de correr e ser produtor/locutor/jornalista/pauteiro. O programa, que era mais um hobby do que um trabalho propriamente, estava sendo deixado de lado e resolvi parar antes que virasse meia-boca de vez. Aproveitei e fiz o último com André Fischer, diretor do Mix Brasil, e vai ao ar semana que vem. Esta semana vai ao ar mais um programa sem convidados.

Talvez o programa volte mais pra frente, no Mix ou em outro lugar, mas por enquanto preciso dar conta dos outros trabalhos. Até porque mês que vem devo fazer uma viagem longa...

Mas sobre isso falo depois.

Hoje preciso de sexo... mas estou com tanta preguiça que acho que vou me arrastando até o quarto. Tentarei deixar a porta aberta, quem sabe... Durmo de barriga para cima, você faz o resto.

05/04/2007

"A PORTA SE ABRE"

(Foto de Cris Ameln/Joyce Pascowitch.)


"Eu me considero um sobrevivente, praticamente um herói por ter completado os estudos, porque o sistema de ensino sempre foi tão radicalmente contra tudo o que eu acredito e sou. Eu simplesmente não entendo essa relação mestre-aluno, não faz sentido para mim; e essa relação, que já é absurdamente retrógrada, ainda é piorada com as condições de ensino no Brasil, onde os professores em si ganham tão pouco que muitas vezes têm menos acesso a possibilidades culturais do que seus alunos, e não se exige realmente que eles tenham uma grande bagagem. Isso, é claro, faz com muitas pessoas se tornem professores simplesmente para ter alguma posição de status – por menos status que os professores tenham atualmente- ou exercerem algum grau de comando. Muitos são frustrados intelectualmente e precisam do título de “professor” para se reafirmar, porque não teriam prestígio intelectual de outra forma. Querem mostrar sua força e só podem fazer isso diante de crianças e adolescentes. É claro que há exceções, assim como há grandes pensadores e artistas que paralelamente são professores, mas nós sabemos que isso é uma minoria quase fora de estatística. Até porque, a posição de “Professor” que se prega pressupõe uma genialidade que simplesmente não pode existir em quantidade numérica suficiente para atender ao número de alunos existentes" (Trecho de uma entrevista que dei recentemente.)


Estranhamente, essa questão do ensino, da posição do professor, esteve tão presente nesta minha semana - desde discussões que tive sobre a polêmica "Antônio Cícero (que conheci esta semana, e que posso considerar como um professor de poesia) X Luis Felipe Pondé (que foi meu melhor professor na faculdade)" até conversas que tive por MSN, textos que traduzi e coisas que escrevi em meu novo romance (sim, haverá novamente uma crítica ao sistema de ensino).


Deve ser por causa desse romance. Mergulhado nele, o mundo todo ao meu redor parece convergir para sua problemática; foi assim com todos os outros, acho que deve ser assim com toda obra que se cria de forma honesta, densa e intensa. E tem também o livro que estou traduzindo, que me suga de forma semelhante, embora não espontaneamente, para seus dilemas.


Ironicamente, segunda-feira próxima me encontrarei numa... SALA DE AULA, participando do curso de Pedro Paulo de Sena Madureira sobre relação escritores X editores, na Casa do Saber. Sou o convidado da penúltima aula - cujo título é "A Porta Se Abre" - representando um "jovem escritor". O último convidado é o Scliar, dia 16.


Eu mesmo nunca me senti capaz de dar cursos, aulas, oficinas. Me sentiria uma fraude. Acho que me sentia assim quando eu dava aula de inglês (em duas escolinhas vagabundas, que vocês conhecem bem, de nome). Eu era um PÉSSIMO professor. Imagine então eu ousar ensinar alguém a escrever? Sim, já me convidaram para ministrar oficinas literárias, e quando eu estava mais fodido de grana - mas por, decência, recusei.


(Oh, eu deveria dar aulas de culinária. Acabei de fazer uma pescada branca com wassabi e uísque que ficou absurda. É, atualmente só tenho comido peixe.)

Bem, estou indo agora gravar aquele programa hilário da PlayTv onde os convidados ficam jogando videogame. Estou pensando em levar meu Nes 8bits, para ver se tenho alguma chance, ehehe. Ainda não sei quando vai ao ar, mas aviso.

Feliz Páscoa, beijinhos.

Ps - Estou lendo "O Desconhecido", novela do Lúcio Cardoso, conhecem? Agora ressinto toda essa exaltação - também feita por mim - em torno de "Crônica da Casa Assassinada". "O Desconhecido" é uma narrativa muito mais restrita, em todos os sentidos. Mas nos bons sentidos é que ela me deslumbra. E de forma cortante... Leiam isso:

"Você sabe bem que nada sou senão uma caricatura do seu demônio."

Oh. Tenho encontrado tantas caricaturas por aí...

01/04/2007

“QUE FATALIDADE, MEU PAI!”*

(Foto: Ambooleg/2003 - De quando eu ainda era um jovem que sangrava...)


Oh, eu estava tão em paz com meus ursos polares...

Sentado em frente ao computador, de bermuda e regata, com minhas tatuagens devidamente hidratadas, consegui levar esse verão inteiro acreditando que nada estava acontecendo...

Até quando saía na rua, em pleno almoço tardio, em direção à academia (porque eu praticamente só saía de casa para gravar meu programa e ir à academia), o sol me parecia saudável e, nos dias em que eu saía um pouco mais tarde, me queixava comigo mesmo das sombras já formadas pelos prédios nas ruas - sombras típicas de final do horário de verão - que impediam que eu me bronzeasse...

Mas nos meus raros contatos com os seres humanos, fui ouvindo queixas frugais do calor dos dias, e aos poucos aquilo foi me convencendo de estar um grau (Celsius) acima de simples papo de taxista.

Faz tanto calor assim ou são vocês?

E depois da última quinta-feira, quando mais um jovem escritor da Geração Noventa ousou sentar-se diante do meu computador, quando ele reclamou do calor em meu apartamento, quando me indagou ostensivamente por que eu não colocava afinal o computador mais perto da janela, passei a sentir o calor como todos os outros homeotérmicos deste país tropical.

Tchau, meus ursinhos polares...

E eu, que me sento na frente desta máquina, nesta casa, nesta posição, há mais de três anos, fiquei me indagando se não deveria realmente modificar a mesa do computador de posição, para perto da janela.

Não.

Porque próximo da janela posso me distrair com a realidade...

E o sol entrará com mais violência....

E as pessoas verão o que estou fazendo...

Além de que, meu iguana poderá escalar o rack e pular lá para baixo.

Precisamos sempre nos manter longe de janelas abertas, nós, animais tropicais.

Então não me preocupo com a posição do meu computador, mas me preocupo agora por não ter me preocupado, todas essas semanas, com o calor da estação. Serão problemas hormonais, endócrinos, neurológicos? Não, IDEOLÓGICOS! Porque, vejam só, desde quando, desde quando, me pergunto, desde quando aceitei o calor em meu coração? Desde quando deixei de me importar? Mais ainda: desde quando, passei a amá-lo, desejá-lo, persegui-lo por entre as sombras metropolitanas?

Eu sei bem. Desde quando passei a criar répteis, tanto nos braços como no apartamento. Agora já recebo o inverno com um arrepio...

“Ter um filho muda tudo...”

Assim, tentando recuperar um inverno ao menos ideológico, voltei a revirar os textos de Álvares de Azevedo, Isidore “Lautréamont” Ducasse e Mário de Sá-Carneiro. Esses jovenzinhos românticos que morreram antes de mim, em tempos em que a juventude (e a imaturidade) fazia sentido e podia ser apreciada como valor literário.

Para autores como esses, faz sentido o rótulo de “jovem escritor”. E lendo-os se percebe coisas tão incríveis que só podem ser feitas na imaturidade literária... Uma ingenuidade poética. Uma convicção apaixonada. Uma audácia admirável. Oh... Sabe-se lá mais o quê.

Eu, que me aproximo dos trinta, já não posso morrer de tuberculose, mas tento irrigar a juventude produtiva que me resta, para que ela me traga belos frutos, antes que eles finalmente venham ao chão com o inevitável (e detestável) rótulo de “autor maduro”.

Para terminar o post de maneira mais objetiva: “O Cheiro Ralo”. Bem interessante. Um clima bem particular. Com atores que já são praticamente personagens. Fotografia espetacular. Finalmente um diretor – Heitor Dhalia – que vem fazendo coisas realmente diferentes no cinema nacional. É um diretor para se acompanhar, principalmente porque pelos seus filmes tem-se a impressão de que ele é ligeiramente doente, o que para um artista é mais do que saudável.


A frase título do post foi a última frase de Álvares de Azevedo antes de morrer. Depois, tem a história que o cemitério onde ele foi enterrado foi inundado pelo mar, perderam-se as tumbas, mas puderam encontrar o local onde ele estava enterrado graças a seu cachorro "Fiel", pelo faro. Ohhhhh...

NESTE SÁBADO!