FALO ENTRE OS DEDOS
Daí que eu estava lendo:
1) Não sei se todos estão acompanhando. Uma nova lei, que substitui a Rouanet (mas não acaba com ela, ao contrário do que os barões da cultura dizem) vai ser enviada ao Congresso Nacional. (...) Continuam nos colocando no guarda-chuva do “Livro e Leitura”. Eu cansei de falar contra isso nas reuniões que participei. Uma bosta isso. Livro é livro, é o produto. Literatura é o que vem antes: a arte literária. Livro é o produto industrial das editoras. Literatura pode se manifestar em outras formas: revistas, sites, cds, cds-rom, jornadas literárias, encontros de escritores com leitores, enfim, uma infinidade de outras coisas que não se resumem ao livro. – do blog do Ademir Assunção: http://zonabranca.blog.uol.com.br
2) Aí hoje eu voltei o meu bundão para o teclado e estou aqui dando o recado de que mais e mais eu acredito na comunhão desses malucos que saem de seus casulos e tomam a praça e os bares e os blOgues e os cinemas e os teatros a todo custo para movimentar o que não pode e não deve moscar ao relento essa nossa literatura que tanto nos custa e há de alegrar mesmo que por alguns raros momentos as nossas vidas. – do blog do Marcelino Freire: http://eraodito.blogspot.com
3) Os escritores são o que são genuinamente somente quando estão trabalhando na cela silenciosa e instintiva da solidão fantasmagórica - nunca quando estão ali fora, diligentemente batendo papo no terraço na Mercearia. – Ivana Arruda Leite parafraseando a escritora americana Cynthia Ozick, em seu blog: http://doidivana.wordpress.com/
Daí que eu estava pensando:
1) Concordo plenamente com o Ademir. E é importante ler o texto todo dele, se informar sobre as mudanças na lei e reivindicar que a literatura seja considerada como arte em si. Esse papo é velho. E controverso. Tem gente que acha que escritor não precisa de incentivo ou patrocínio, porque seu trabalho não tem gastos. Mas escritor não come? E os eventos literários, não têm custo? Acho um absurdo, por exemplo, direito autoral pagar imposto. A editora te paga 6 paus de adiantamento, você ganha 4 e pouco. Tenho preferido receber direito autoral como pessoa jurídica! É por isso que em toda nota de rodapé, em toda orelha de livro, em toda entrevista que se dá, se coloca “Fulano é escritor e...” (jornalista, publicitário, tradutor, professor.) Ser um escritor nunca basta, as pessoas precisam comer.
2) Daí, tem o Marcelino que, além de um grande escritor, movimenta a cena literária em eventos, promovendo novos autores e levando sua obra para os mais obscuros recantos do país. Seu lema é trazer a literatura para mais perto do povo, ao lado do chopp. Admiro. Mas não gosto de chopp. E escrevo antes de tudo para poder trabalhar sozinho, para poder fazer do meu modo. Prefiro passar a noite escrevendo um romance do que discutindo literatura em mesa de bar. O que acontece é que Marcelino acaba promovendo minha obra e a literatura contemporânea como um todo, mas tem cada vez menos tempo para ler, para escrever sua própria. Algumas pessoas até olham para mim em tom de zombaria – “haha, cinco romances publicados em sete anos?”. Sim. Era isso o que eu estava fazendo, escrevendo. Por que um ator pode terminar uma peça, uma novela, e começar outra, mas o escritor precisa de anos e anos de gap entre suas obras? Meus últimos livros levaram dois, três anos na escrita, mas estou sempre escrevendo. Estou sempre com um livro em mãos. Todas as noites tenho algo a acrescentar. Então minha posição sobre a visão do Marcelino é que eu admiro... mas não recomendo.
3) Por fim, Ivana e Cynthia disseram um pouco o que eu queria dizer. Por isso mesmo é importante a posição do Ademir e do Marcelino. O escritor precisa encontrar meios, antes de tudo, para realizar sua atividade solitária (e a analogia com a masturbação não é mera piada...). Precisa encontrar espaço e tempo, e isso muitas vezes significa dinheiro. Depois, precisa encontrar meios de levar essa literatura às pessoas, seja pessoalmente, seja através do Marcelino (hihihi), seja em eventos de mesa de bar, seja em palestras na Casa do Saber. Ou em blogs, bienais, cinemas, teatros e o caralho.
Porque por mais que a gente pense e repense nossa cultura, por mais que a gente escreva e reescreva sobre a SUA vida, por mais que o Milton Hatoum até seja considerado “Sir” por aqui, o país inteiro vai continuar dando muito mais importância ao Ronaldo... “Fenômeno”.