O PIRATA LETRADO
Interessante a matéria da Raquel Cozer hoje na Folha sobre dowload e pirataria de livros.
“Nos últimos anos, a chamada pirataria digital de livros vem aumentando o suficiente, em quantidade e velocidade, para pôr em alerta grupos que defendem os direitos autorais. Sem pesquisas relativas à quantidade de arquivos disponíveis na rede, a Associação Brasileira de Direitos Reprográficos mede o problema pelo número de denúncias de autores e editoras. O aumento foi de 140% em menos de três anos.”
Não imaginava realmente que a coisa já andava nesse ponto. A mim, parecia que os poucos que gostavam de ler ainda preferiam o papel. Talvez os que gostem de literatura ainda prefiram o papel, porque o grande volume de livros baixados é de bestsellers (a matéria começa citando Stephenie Meyer e Meg Cabot, autoras de "Crepúsculo" e "O Diário da Princesa", respectivamente).
Conversei sobre isso hoje com minha editora. Falávamos que a quantidade de livros baixados não corresponde exatamente a quantidade de livros que deixaram de ser vendidos; quem baixa esses livros não compraria na livraria, se não fosse possível baixar - porque não teria dinheiro, ou não teria acesso, ou não acharia que valeria a pena.
Aliás, essa coisa do “não vale a pena” me parece sempre a questão preponderante. Você faz lançamento do livro num bar, as pessoas vão, mas não compram o livro, porque acham caro, mas gastam esse mesmo valor lá, em bebida (quer dizer, a bebida vale, o livro não – por esse motivo mesmo no meu lançamento no Volt vai ser assim: quem COMPRAR meu livro ganha um drinque grátis e exclusivo, preparado especialmente pro evento, ok?).
Penso no meu caso, nos meus livros. Não sei de muita gente baixando, de livros meus circulando pela net. Talvez o contingente adolescente que me acompanha tenha interesse em baixar – não sei – e recebo muito email de gente na puta que pariu, que não acha meus livros (até porque muitas cidades não têm uma livrariazinha sequer, e as que têm estão abarrotadas dos bestsellers), por mais que eu tenha só publicado por editoras grandes, que deveriam ter uma boa distribuição. Daí penso se não seria melhor mesmo se esse povo pudesse baixar – ao menos me leriam (ou ao menos conheceriam minha literatura, que é bem diferente deste blog, por exemplo).
Eu só não posso disponibilizar eu mesmo porque, você sabe, o direito de distribuição e comercialização dos meus livros não é meu, é das Editoras. Eu estaria infringindo legalmente meu contrato com elas.
Então melhor que você compre mesmo.... Vai, é o preço de um drinque... Ok, de um bom drinque.... Ok, de uma garrafa.
Eu sempre prefiro ter o livro impresso, em papel, na cama, na estante. Penso em dizer que não gosto de ler na tela, que é cansativo, mas daí reparo que li e reli TODOS os meus livros na tela, e minhas traduções. Não sou daqueles que imprime para revisar, faço tudo na tela mesmo. Então, ok, dá para ler na tela numa boa, embora não seja o ideal. Eu não baixo livros pra ler. Nunca baixei.
E tem os e-readers, né? Aqueles aparelhos tipo palm feitos exclusivamente para leitura, que têm telas mais adequadas a isso. Acho que não são atraentes para a maioria das pessoas porque elas lêem um livro por mês (ou por ano?), o investimento não compensa. Mas e para quem trabalha com isso? Eu, que recebo pilhas e pilhas de originais aqui (em sulfite). Seria bem mais fácil ter tudo isso em arquivinhos, direito no meu e-reader. Quando eu viajo também, leio livros e mais livros para decidir o que vou ler. Seria mais fácil com um e-reader...
Hum, me compra um?
Conversei sobre isso uma vez com Ednei Procópio, editor e grande entusiasta do livro eletrônico. Ele aponta a utilidade dos e-readers em escolas onde não há bibliotecas, em comunidades carentes, onde não há espaço ou renda para se adquirir vários livros. Realmente é uma opção...
Mas isso tudo leva àquela pergunta: com o avanço dos downloads, os autores vão perder o pouco de suas vendas? Os direitos autorais, como ficam?
Na matéria da Folha, Marcelo Rubens Paiva aponta que "Na música, por mais nociva que seja, a pirataria pode até aquecer o mercado de shows. Agora, na literatura, a gente não tem outra fonte de renda que não seja o livro". Eu discordo. Mas é uma questão pessoal. O dinheiro que ganho com venda de livro não se compara com o dinheiro que ganho com outros trabalhos – tradução, matérias, roteiros, debates – meus livros me dão prestigio de escritor para conseguir esses trabalhos, isso sim, mais ou menos como um disco leva o público ao show do músico. E isso porque sou um autor que vende razoavelmente bem... dentro da literatura contemporânea.
Enfim, isso é mais uma reflexão aberta. Não tenho uma posição formada. Ainda acho que os downloads estão longe de ameaçarem editoras e autores, até pelo caráter conservador do público e do mercado, mas é sempre bom estar atento, acompanhar de perto, não deixar para quando os canhões piratas estiverem nas nossas costas...