29/05/2011

MOACYR SCLIAR E O GUEPARDO.

Aos catorze anos, fui jogado ao mar...

Nah, nem tanto.


A divulgação ainda anda meio lenta, eu ando meio lento, muita coisa na vida real, mas tenho recebido impressões bem entusiasmadas dos leitores sobre PORNOFANTASMA.



Além do conto título, o favorito parece ser "As Vidas de Max", conto nascido das minhas leituras de Moacyr Scliar e Yann Martel.

No meu aniversário de catorze anos, fui jogado ao mar. Faltou-me chão, cambaleei das pernas, deslizei pelo convés de uma vida – tão breve, que eu chamava de “a vida inteira” – e acabei a bordo de um pequeno barco, frente à frente com um guepardo.



Estava relendo meus emails com Scliar, e fiquei triste de não poder mandar o livro pra ele, como prometido. Era dos raros autores brasileiros que unia literatura de verdade a algo mais fantástico, como eu me proponho a fazer...

Minha irmã batia na porta do banheiro. “Mãe, o que se passa com esse moleque?” Elas ainda não estavam acostumadas. Nem eu. Olhava a clara rala como membrana entre meus dedos e me perguntava se era realmente aquilo. Era realmente aquilo? Eu chegara lá. Às vésperas do meu aniversário de catorze anos, em alto mar.

Conheci o Scliar muito superficialmente. Me apresentei algumas vezes, como fã, e nunca conversamos muito. Mas o email que ele me mandou sobre "As Vidas de Max" (o conto que está em PORNOFANTASMA) vai ficar guardado para sempre.



E acho que não tenho por que não colocá-lo aqui. Vai:



Scliar, querido, como vai?

Nos encontramos algumas vezes em Flip, Bienais, etc. Sou leitor seu desde a adolescência, agora tenho cinco romances publicados.

A história é a seguinte: há alguns meses eu estava avaliando para uma editora o novo livro do Martel ("A 20th Century Shirt", ainda não lançado)
[o livro acabou sendo publicado com o nome "Beatice and Virgil" - no Brasil saiu pela Nova Fronteira, não por acaso] e me lembrei da polêmica em torno dos livros de vocês. Fiquei instigado e li os dois - gostei muitíssimo, mas me senti praticamente compelido a exercitar a minha versão num conto...

Para mim, a idéia do adolescente num barco com um grande felino me desperta instantaneamente uma alegoria de despertar sexual (que não foi exatamente o ponto de nenhum de vocês). Acabei indo por esse caminho, e colocando num contexto bem mais burguês e debochado (o rapaz como um adolescente num cruzeiro de férias com a família, etc).

Acho que o conto rendeu bem. Estou preparando um livro de contos (o meu primeiro nesse formato), a ser lançado no começo do próximo ano pela Record e quero incluir lá.

O conto é assumidamente uma homenagem a vocês dois (a começar pelo título) e claro que vou colocar as referências no livro. Mas, antes de tudo, queria mandar para você.

Se quiser ler e me mandar suas impressões, será uma honra para mim.

Desde já, obrigado. Nos cruzamos em breve.

*'s
Santiago Nazarian

[Infelizmente, eu e Scliar nunca mais nos cruzamos.]




A resposta:

Meu caro Santiago, muito obrigado pela mensagem, pelas amáveis palavras e pelo belíssimo conto, que li com o maior interesse e emoção. Realmente, você deu uma dimensão nova à idéia! Para mim é motivo de orgulho que minha história possa, ao menos em parte, ter lhe servido de inspiração. E agora temos um time: jaguar, tigre e guepardo! Imbatível! Aguardo ansioso seu livro. Até lá, receba o grande abr. do fã Moacyr Scliar


O que eu não mencionei para Scliar, e meio que tinha deixado de lado para mim mesmo é que dos treze para os catorze anos eu ESTIVE num navio. Um transatlântico bem burguês, como narrado no livro, com minha mãe e minha irmã, "com shows de mágica e bingo. Até com números circenses e entradas sub-reptícias no cassino."



Eu não encontrei nenhum guepardo, não. Na verdade, tive uma namoradinha, gaúcha, Fernanda, não esqueci dela (ela esqueceu de mim? O que foi feito dela?). Mas o conto é um pouco mais boiolinha... É essa minha tendência, sabe, de androginizar e (homo)sexualizar todo adolescente, como se todo adolescente fosse andrógino, e como um menino de 14 anos fosse de fato um ser sexual...



Bem, um menino de 14 anos é um ser sexual, se a gente lembrar bem, mas quando nós, bode velhos, olhamos de fora, eles parecem apenas crianças. Diferentemente das meninas, meninos de 14 anos, na verdade, na realidade, no mundo real, fora das páginas e longe dos guepardos, são crianças... Quer ver?



Que bebê! Esse era EU, aos treze para os catorze, num cruzeiro em alto mar, cumprimentando o capitão.

Mas o livro é muito mais do que isso! É um oceano de prazeres, e espermas e espadas e águas-vivas. Compra logo e não me enche o saco!


Só venha falar comigo quando terminar "Todas as cabeças no chão, menos a minha!" O último conto, e o meu favorito.

25/05/2011

MOMENTO NERD



Thor.



Bacaninha o filme do Thor. Cafoninha - não tinha como não ser - mas bacaninha. Thor nunca foi mesmo dos meus favoritos, mas até aí, Homem-de-ferro não era e o filme foi um dos melhores.


Vai aí meu ranking pessoal dos filmes da Marvel que eu vi.


Homem-aranha
Homem de ferro
Homem-aranha 2
O Incrível Hulk
Homem de ferro 2
X-men 3
X-men 2
Thor
Quarteto fantástico e Surfista prateado
Quarteto fantástico
X-men
Hulk
Demolidor
Homem-aranha 3
Motoqueiro fantasma


Cresci lendo Hulk e Homem-aranha. E se fosse para escolher um próximo herói Marvel para as telas, eu diria.. MULHER-HULK. Ok, ok, não é um personagem para se levar a sério, mas o filme podia ir nesse tom, uma comedia escrachada de super-herói, como eram os próprios quadrinhos dela assinados pelo John Byrne, onde a personagem até conversava com o leitor. É só uma ideia...




Deus, como eu sou nerd, eu sei, eu sei.


20/05/2011

LEMBRANÇAS DE VIDAS PASSADAS

Sim, eu era ruivinho e encaracolado.



Agora que o inferno astral do aniversário ficou para trás – posso aproveitar tantas coisas boas que andam acontecendo ou estão prestes a acontecer. Cristiane Lisbôa diz para não comentar, para não atrair olho gordo, mas com tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo, fico pensando se uma não pode funcionar como um “boi de piranha cármico” da outra. Talvez eu devesse apenas espalhar boatos falsos, que atraíssem em si os maus olhados. Então tá: “Fui convidado para ir para a Austrália! Para nadar com os crocodilos!” (Enquanto isso, nado a salvo para a outra margem.)



Meu retrato de Dorian Gray, feito pelo João Lestrange de presente de aniversário para mim. Foda que no retrato eu já estou bichado... e ainda assim melhor do que muitos dias...




O aniversário passou, foi dos melhores, isso eu já disse. E fiquei lembrando de tantos aniversários passados, tantos aniversários desperdiçados. Aniversário é uma coisa meio triste, diz aí? Aniversário é uma coisa meio deprê. Não é só por envelhecer, tem aquilo de ser um dia mega importante na nossa vida, e não querer dizer porra nenhuma para ninguém mais. Geralmente eu tento driblar. Geralmente eu tento fingir que não tem nada acontecendo. Mas secretamente sempre espero que um terremoto arrase o mundo, que os mortos ressuscitem ou que eu apenas abra a porta e encontre os amigos gritando: “surpresa!” Nunca aconteceu.

O que eu me lembro dos aniversários é isso:

- Sempre fiquei mega constrangido com o povo cantando “parabéns a você.” O que o aniversariante faz? Canta junto? Sorri amarelo? Se esconde num buraco? Quando eu era pequeno, me escondia, literalmente. Gritava, chorava, esperneava, de pânico do parabéns.

- Sempre havia um enfeite em cima do meu bolo. Lembro de um fofão num aniversário, de uma onça com um coqueiro em outro (e como eu já era metidinho a biólogo, eu protestei e protestei que coqueiro não era habitat de onça). O mais constrangedor foi um dos Smurfs. Eu tinha uns sete ou oito anos, e assistia Smurfs meio secretamente. Minha mãe sabia, e colocou um enfeite de Smurfs no bolo, para todos meus colegas verem. Smurfs era coisa de criancinha. Me escondi num buraco.


- Eu era fã do He-man, claro. E já tive um enfeite de He-man no bolo. Mas, só para me humilhar, meu primo milionário mandou construir um Castelo de Grayskull em tamanho real no jardim da casa dele, no seu aniversário. Era o mesmo primo que costumava roubar todos os meus amigos, quando eles descobriam que na casa dele tinha um campo de futebol. Eles ficavam jogando o sábado inteiro, eu trancado na frente da TV, jogando Castlevania e Super Mario.


- Meu aniversário de trinta anos, passei em Santiago do Chile, a caminho do deserto do Atacama. Estava hospedado no Crowne Plaza, hotel bem bacanudo; e na noite da virada dos vinte e nove para os trinta, eu tomava um drinque no bar do hotel, sozinho, me preparando para sair. Uma mulher cantava “Se você disser que yo desafino amor...” num portunhol bizonho. E eu tive a melancólica sensação de que isso era fazer trinta anos – conquistar certa sofisticação, com certa decadência. Essa sensação ainda não passou.

- O aniversário do ano passado, passei num pântano. Também estava sozinho, em Florianópolis, e decidi ir para as dunas da Joaquina por um caminho alternativo. Era um pântano. E eu afundava meus pés na lama, na água, me preparando para ser picado por uma cobra. Seria uma boa morte. Seria um bom final para a história.


- Tive um namorado que disse que nunca comemorou o aniversário na infância. Nunca fizeram festa. Só uma vez... E montaram literalmente um circo na casa dele, com palhaços, malabaristas, engolidores de espada... Para montar toda a estrutura, de surpresa, tiraram ele de casa, levaram no parque, no shopping, no zoológico. Quando voltou para casa, estava tão cansado que dormiu, o aniversário TODO. E ouviu pelo resto do ano os colegas comentando: “Nossa, sua festa foi a melhor de todas!”


- E quando eu tinha uns oito anos, tinha um amigo chamado Igor. Moleque bacana, e razoavelmente popular. Mas por algum motivo, no aniversário dele NINGUÉM foi. Tinha toneladas de brigadeiro, cachorro-quente, bolo, mas NINGUÉM foi. Só eu. E como eu era um moleque sem noção, ao invés de consolá-lo, eu piorava as coisas: “Mas não vem ninguém nessa festa? Que festa chata!” A mãe dele tentava consertar: “A gente congela as comidas, filho, a gente reforça o convite pro sábado que vem.” Desde então, batizei essa sensação de que não virá ninguém de “Síndrome de Igor.”




O bolo de aniversário este ano, no Bar Balcão, feito pela Hitomi, depois do lançamento na Vila. Este ano venci a Síndrome de Igor. E eu mesmo puxei o parabéns.


16/05/2011

RESENHANDO O LANÇAMENTO


Em clima de festa.


Chegaram hoje as lindas fotos do lançamento, feitas pelo Moisés Ferrarini (www.moisesferrarini.com). Retratam bem o clima carinhoso da noite, com amigos queridos e leitores lindos.

O grande ator Rafael Primot, que lança livro de contos em breve.


A diva Renata Bastos.



Essa lindinha veio de BH só para o lançamento.


Ricardo Escandon.





Até umas oito e pouco da noite estava vazio de dar pânico, depois ficou cheio de forma agradável. Foi um evento muito menos hypado do que o lançamento dois últimos dois livros, é verdade, embora tenham saído notinhas no Glamourama, Vogue RG e Estadão. Também não teve gente cuspindo fogo, carne de jacaré e grandes baladas, resolvi fazer uma coisa mais low profile mesmo, em livraria, para focar no livro (O Prédio gerou mais colunas sociais do que resenhas...). Mas foi boa ideia lembrar aos convidados que era meu aniversário (no dia exato); eu não ganhava tanto presente assim desde a infância! Acho que foi meu melhor aniversário, ever, ainda mais com a comemoração do final de semana em Porto Alegre.







Patrícia Casé, isso é prestígio.

Nina Lemos.




Perto do Júnior eu viro um anão.






Liandro.






Lellis é colega de infância.






Michel Laub foi o primeiro a chegar.




A Record encomendou cupcakes para os convidados. E os convidados trouxeram os presentes mais lindos. Teve chocolates que a Gabi Matos fez especialmente mim; a Hitomi fez um bolo maravilhos; Alexandro Matos me trouxe uma caixa de cherry da Kopenhagen (provavelmente meu chocolate favorito - gosto que herdei da minha mãe); João LeStrange me fez um retrato de Santiago Gray fantástico; Pira trouxe lembranças de Floripa; Hugo Guimarães me gravou DVDs com clássicos obscuros de terror; a Editora Leya me mandou uma caixa de vinho com taça; Marcelino Freire me montou um pântano completo de brinquedo; e o Fábio simplesmente me deu um PSP.







Momento emoção, quando o Fábio me deu um novo Playstation Portátil, bem pretinho (eu já tive um, que consegui quebrar em seis meses - e o Fábio já me deu um Nintendo DS há alguns anos, que funciona muito bem. Se todos os ex fossem como ele...).




Hitomi e o namorado rocker. O bolo dela foi o parabéns da noite.














Marcelo e Guima.



A fila - com Nicolas e Luis Fernando.



Eduardo Simões.




Sorry que não consigo obviamente colocar aqui foto de todo mundo que foi. Escolhi as que eu estou melhorzinho, haha. Mas foi todo mundo registrado, mesmo quem tentou fugir, viu? Estão bem guardados.





Meu tio, Eduardo Nazarian.




Comemorando gol de sei lá quem, com Del.



Também foi lindo ver leitores e amigos que vieram de longe, pegaram ônibus, só para me prestigiar. Ator em cartaz recebe aplausos à cada apresentação; músicos recebem gritos e assobios; até artista plástico pode ter um retorno imediato de sua obra; mas escritor só tem esses momentos mesmo, ou encontros furtivos, emails (e não é raro ouvir coisas do tipo: "Gostei muito do seu livro, mas não vou ficar elogiando para você não ficar se achando"; puta merda, escritor não pode mesmo ser feliz?)





Daniela Ximenes é mulher do fotógrafo.






Não se pode dizer que faltaram leitoras lindas.






Adrienne.





A fila com Maíra Mee e minha mãe.




Depois do lançamento, dei com uma esticadinha com quem ficou por lá, no Bar Balcão, onde cantamos o parabéns, e na manhã seguinte já peguei um vôo para Porto Alegre, para ver as amigas mais queridas. Teve mais comemoração, mais presentes, mas as fotos ficaram uma merda - haha - porque foram feitas com Iphone da Cris. Tão aí:






As meninas que eu mais amo nesse mundo - dá pra ver? Cris, Taina e Letícia.




A minha grande amiga Vanessa Krongold (também diva, vocalista do Ludov) estava por Porto Alegre e fez a alegria da minha festinha.




E Renata Leiria, que eu não via há tempos.



Agora começo a receber as primeiras impressões do livro. Já saíram críticas bem bacanas no O Globo e Gazeta do Povo (Paraná), já dei algumas entrevistas e, sim, vai ter em breve coisinhas bacanas na TV... Mas para mim o mais interessante é sempre saber a opinião de quem lê.




E para quem não foi, não guardo mágoas, até porque, sei que os que faltaram só terão doenças e vidas miseráveis logo mais. Não é praga não, longe de mim.






10/05/2011

É NESSA QUINTA

(E é só até as 22h mesmo, porque é o horário da livraria - na Lorena, hein? - e deu.)


08/05/2011

TESOUROS PARA A JUVENTUDE





Acabou de sair uma linda edição de "O Mágico de Oz", pela Leya/Barba Negra, com o texto original integral, na tradução minha.

Foi um trabalho bem gostoso de fazer. É um texto bastante infantil, no melhor sentido, e eu me sentia como se estivesse contando a história para uma criança, procurando deixar a tradução o mais leve possível.

Como não tenho filhos nem sobrinhos, estou quase dando o livro para uma criança no semáforo.

Outro livro que li esses dias, por puro prazer, foi o "Ilusões Pesadas" do franco-pitéu Sacha Sperling.

É o relato de um adolescente de catorze anos (escrito quando o autor tinha dezoito), vivendo uma relação obsessiva com um colega de escola, Augustin. Livro perfeito para adolescentes gays com paixões platônicas por amigos HT, ou mesmo para essa juventude desregrada de hoje (ahaha, falou o tiozinho) que já está nas boates com catorze anos, com chapinha no cabelo, cara toda maquiada e o nariz afundado no pó.

"Não tem umas horas em que você tem vontade de se mandar?" Augustin me pergunta isso enquanto comemos um sanduíche na ponte cujo nome eu não sei. Ele olha o Sena. Quero dizer a ele que sim, que essa ideia me obceca. Partir. Todo mundo quer fugir aos catorze anos, né? Respondo que gostaria de fugir e voltar todos os domingos.

O livro causou furor na França, pelo conteúdo pretensamente auto-biográfico e pela idade do autor, é claro. Mas longe de ser literatura marginal - não tem nada realmente chocante no livro, a proposta não é essa; e afinal, foi publicado no Brasil pela Companhia das Letras, não é? - ou uma grande novidade literária, a beleza do texto está no lirismo, na delicadeza com que o narrador descreve sua relação com Augustin - que nos denuncia essa paixão antes mesmo do personagem se dar conta.

É seu gosto pelo segredo, pela mentira, que lhe permite manter uma certa superioridade sobre mim.

Lindinho-lindinho. Assim como o autor, é claro, o que faz toda a diferença. É o exemplo perfeito de um livro que só poderia ter sido escrito por um jovem, e da importância de que se publique ainda cedo (ao contrário do que pregam autores mais conservadores, vide Lygia Fagundes Telles.)

Sperling. Mandou bem, moleque.


E para terminar, recebi aqui em casa esses dias da Editora Globo a "Coleção Agatha Christie". São três clássicos - "E Não Sobrou Nenhum", "O Assassinato de Roger Ackroyd" e "Cinco Porquinhos", com orelhas escritas por autores contemporâneos. Eu fiz o "Roger Ackroyd" e o que haviam me pedido tinha sido algo próximo da ficção, uma orelha menos convencional. Então entreguei isso:



Dizem que quando a gente morre todas as histórias de nossa vida passam em nossa mente. Eu me lembrei disso quando senti a faca entrando. Minhas próprias paixões, conquistas e fracassos, emaranhadas com aquelas que vivi como leitor. Não conseguia diferenciá-las, principalmente porque ainda estava concentrado em continuar respirando. Ele enfiou a faca novamente - e outra vez - depois parei de contar. Eu vim ao chão, ele seguiu para a porta. Meu assassino me deixava para completar sozinho a história. Não fazia sentido, minha própria morte, uma trama à qual eu não poderia dar final. Me lembrava de tantos romances policiais – sempre com um grande desfecho, uma grande virada, motivos e encaixes que davam poesia a uma morte. Naquele momento, eu só queria chegar ao telefone, chamar uma ambulância, ligar para minha irmã e perguntar qual era mesmo o nome daquele livro da volta do Detetive Poirot? A memória é um lento rastejar. E eu estava tirando tudo do lugar - apagando digitais, manchando pegadas, destruindo pistas que narrariam minha vida, meu assassinato. Sem mais poder seguir em frente, permaneci deitado no chão de tacos, meu sangue se infiltrando nas frestas, misturando-se a fios de cabelos, restos de insetos, lágrimas de outrora. Ficaria ali, para contar minha história? Ou seria tudo esquecido, enxaguado, reformado com um novo piso? No meu último suspiro, apenas um desejo: como eu gostaria que minha morte tivesse sido escrita por Agatha Christie.

Mas não passou. O editor disse que ficou pouco convencional, perto do que os outros autores entregaram, e me pediu uma orelha mais normalzinha. Ficou essa:

Dizem que quando a gente morre todas as histórias de nossa vida passam em nossa mente. Mas será que fazem sentido? Uma vida inteira, ou um assassinato. Será que naquele instante derradeiro tudo se encaixa num clique e tem-se a impressão de que a história está completa, tudo foi cumprido, era esse mesmo nosso final, tramado desde o começo? Com tanta violência, tantos assassinatos, nós, que aqui restamos, ainda estamos procurando sentido. Somos como um Detetive Hercules Poirot... mas jogados num romance surrealista. As pistas não se juntam, os motivos são banais, não há o toque de planejamento, de genialidade, a beleza de uma morte bem pensada, o assassinato no momento exato... Relendo hoje “O Assassinato de Roger Ackroyd”, vejo como falta propósito em nossas vidas... ou nossas mortes. Como tudo seria mais interessante se fosse realmente um hábil quebra- cabeças, deixado a desvendar para os mais atentos, ou os perseverantes, que seguissem até o final. A vida compreendia pelos leitores. E tudo com um fino humor inglês. Não sei que histórias passarão em minha cabeça quando a faca finalmente entrar nas minhas costas. Mas adoraria que minha morte tivesse sido escrita por Agatha Christie.

04/05/2011

O INFERNO É VOCÊ!


Lançamento semana que vem, Livaria da Vila da Alameda Lorena, 1731.



Ainda falta pouco mais de uma semana, mas eu vou martelar e martelar aqui para você não esquecer, porque o que não falta é bangolé me perguntando "que dia é mesmo" ou já dizendo "desculpe, perdi seu lançamento." É dia 12, quinta da próxima semana.

E será meu aniversário também, exatamente no dia. É uma forma de fazer pressão - para você não faltar a dois eventos meus de uma vez só - comemorar, já que eu nunca faço nada no aniversário e... de repente ganhar uns presentes a mais?

Lançando livro novo, tentando comprar um apartamento, correndo com as traduções e planejando mais uma grande viagem ao fim do mundo nem dá para sentir direito o inferno astral. É um inferno só. Uma ansiedade generalizada. Mas não vou me deixar estressar, não vou me deixar estressar...

Os livros mesmo só chegaram na minha casa ontem. Foi aquilo: a editora mandou há quinze dias uma caixa de livros errados - "Como criar dois filhos sem perder o humor e lucidez", ou algo assim. Pegadinha do Malandro. Liguei pra editora e ela riu horrores da minha cara. PORNOFANTASMA já havia sido distribuído para as livrarias, os leitores estavam comprando, mas eu ainda não tinha recebido os meus. Comprei um antes, só para ver, só para ter. Agora chegaram... E não quero dar pra ninguém.

Já dei algumas entrevistas sobre o livro, um programa de TV sobre literatura da Rede Minas, o jornal o Estado de Minas, a revista Criativa... Mas não tenho muito o que dizer. Ou melhor, não tenho mais muito saco para isso. É frustrante perceber que é mais fácil jornalista pedir entrevista do que LER o livro, dar resenha. Em entrevista eles só fazem as perguntas básicas e você já entrega o texto-resposta pronto para ser publicado. Fácil. Mas me interessa muito mais saber as impressões de fora do que eu ficar falando do livro. O que tenho pra dizer está lá, em ficção. Ao explicar só vou falar merda...



(Mas se você se interessa por minhas merdas: http://www.divirta-se.uai.com.br/html/sessao_7/2011/04/17/ficha_agitos/id_sessao=7&id_noticia=37549/ficha_agitos.shtml

Fora o lançamento de SP, você me pergunta, eu não sei. Não vai ter muita coisa não. Já marquei um bate-papo com Ana Paula Maia em Belo Horizonte, em junho (tudo acontecendo antes em Minas, desta vez) e por enquanto só. Depende dos convites; estou querendo mesmo é que o livro tenha sua carreira independente de mim, porque eu sempre me esforço tanto e acabo percebendo que não faz muita diferença, é energia em vão. O livro está lindamente escrito. Está lindo. Agora estou querendo mais é viajar, ler, trabalhar, viver e manter o tanquinho em dia. Você que faça o favor de comprar, ler, divulgar, repercutir. Isso quem faz é você. Isso é trabalho do leitor. Meus livros não precisam de mim.




NESTE SÁBADO!