Outra resenha minha publicada semana passada na Folha:
Uma jovem advogada
prospera na carreira ao conseguir condenar um inspetor acusado de tortura.
Quarenta anos antes, outra mulher tenta fugir do marido contra o qual planejava
um atentado. Seu filho mais novo sofre de estranhos distúrbios e apresenta,
ainda novo, um comportamento violento. Seu filho mais velho ingressa no
exército para fugir do pai, um político autoritário. Essas e outras histórias
aparentemente desconexas vão se interligando lentamente nas 450 páginas de “A
Tristeza do Samurai”. De fato, até
metade do romance de Víctor del Árbol, o leitor pode se encontrar perdido sobre
qual é exatamente a trama, quais são seus mistérios (e qual é o sentido do
título).
“A Tristeza de Samurai”
é um ambicioso misto de drama histórico, thriller político, de espionagem e
policial. A combinação não deixa de gerar um pastiche tarantinesco, com
centenas de momentos recosturados de clichês cinematográficos: um menino
passeia com seu cachorro, que acaba encontrando um corpo; um psicopata
deformado é mantido num porão como animal de estimação dos mafiosos; o policial
perseguido por matadores acaba morto por sua própria esposa abusada.
Entretanto, se Del Árbol recicla imagens já vistas, o faz com extrema
competência. A arquitetura do romance é impressionante, com diversos núcleos se
encaixando em quarenta anos de história. A trama segue do começo dos anos 1940
até começo dos 80, servindo também de panorama da ditadura franquista na
Espanha.
Beneficiado por uma
melhor edição original, o texto poderia ter se livrado de momentos
desnecessariamente explicativos e de lugares comuns (“se sentia vazia como uma
noite sem estrelas”, “usada como uma ovelha entregue aos lobos”, “hesitava como
um passarinho que vê, um belo dia, lhe abrirem a porta da gaiola”). Os diálogos
são invariavelmente eloquentes demais para quem os profere, e tudo é demasiado
encaixado para ser feita uma leitura realista – mas pode ser aceito sem
problemas num contexto de gênero. Longe de ser alta literatura, A Tristeza do Samurai cumpre os diversos
desafios a que se propõe e está longe de ser uma obra medíocre. Como romance
policial, ganhou o Prêmio Polar em 2012.
Avaliação: Bom