05/08/2008

A PRAGA DO DIA


"VOCÊ!!! que praticamente vendeu sua alma à literatura, vai se transformar praticamente num jacaré de esgoto, e depois camelar, camelar, com seu livro novo praticamente nas garras dos demônios!!!"



Estamos chegando a mais uma Bienal. Agora é assim todo ano, de seis em seis meses, a cada semana em algum lugar do país bate o calendário e temos uma Feira do Livro, um Festival de Literatura, uma Bienal, não dá nem pra sentir saudades.



Eu não vou estar lá não.



Bienal de São Paulo também eu nunca participo. Nem sei por quê. Nunca me convidam. Nunca estou lançando livro. Este ano também não. Deveria, mas não estou. Você sabe, minha editora foi comprar cigarros e nunca mais voltou...




"O Prédio, o Tédio e o Menino Cego" estava informalmente combinado para este mês. Foi entregue para a Nova Fronteira há meses. Contrato assinado. Adiantamento pago. Ilustrador pago. Capa aprovada. Então... Cadê? Ninguém me diz mais nada. Eu não sei. Você que mora no Rio não quer perguntar para mim? Você que tem estilingue sabe quebrar vidraças? Pode atacar pedras nas janelas sem nunca, nem sob tortura, dizer que fui eu que mandei?



Acho que, agora, livro novo só em 2009...

Imagino que seja maldição de Guimarães Rosa. Você sabe, o fantasma faz 100 anos este ano, e a Nova Fronteira está amarrando boca de sapo na encruzilhada para ressuscitá-lo. Eu morro pouco a pouco esperando. Depois que seqüestraram meu livro (por contrato), o que mais posso fazer?



VENDER “OLÍVIO” AUTOGRAFADO, A 25 REAIS, JÁ INCLUINDO FRETE, ENTREGUE NA SUA CASA, POR TEMPO LIMITADO.

Já que não tem livro novo... requento os antigos, né? Então você, que não comprou ano passado e estava se rasgando para eu voltar a vender, me escreve logo que a quantidade é limitada e o período de venda também: santiagonazarian(arroba)gmail.com


Voltando à encruzilhada, assisti à pré-estréia do novo filme do Zé do Caixão, “Encarnação do Demônio”. Bacana. Bacana. Uma doença. Mas bacana, bacana. E surpreendente.

José Mojica Marins não filmava há mais de 20 anos. E esse é uma continuação de um filme de 67, “Esta Noite Encarnarei no teu Cadáver”. Mas o personagem Zé do Caixão sobreviveu esses anos todos como figura folclórica, fazendo aparições na TV, shows pelo Brasil, chegando até a virar figura cult no circuito do cinema underground de horror nos Estados Unidos e Europa.

Agora ele está de volta.

E está velho, lesado, decadente, tudo o que só poderia fazer bem a uma figura como Zé do Caixão.

O filme mostra o personagem saindo da cadeia, após 40 anos preso. De volta às ruas, segue com os planos de encontrar a mulher perfeita e gerar um filho. Ele ainda conta com a ajuda de seu ajudante corcunda, Bruno, e um novo séqüito de seguidores e perseguidores.

É só isso. Não tem mais muita história, muito roteiro, tem um ritmo até bastante truncado. Funciona porque tem o essencial que um filme de horror deve ter: clima. Provoca aquela sensação de pesadelo, de loucura, que há em outros filmes igualmente B, igualmente sem roteiro e que se tornaram clássicos (“Evil Dead”, “Holocausto Canibal” e “O Massacre da Serra Elétrica” entre eles).

Sim, “Encarnação do Demônio” é um filme de gênero. É um filme de terror. Não é feito para qualquer público, nem para o público costumeiro do cinema nacional. Quem for assistir esperando rir com o lado lúdico e bisonho do personagem vai se assustar. O filme é pesado, escatológico, não se permitindo em momento algum fazer humor com a mítica de Zé do Caixão. A ingenuidade divertida que hoje os antigos filmes de Mojica transpiram se transforma numa insanidade violenta em “Encarnação do Demônio”.

Há cenas de canibalismo, escalpelamento e tortura em geral, todas com efeitos explícitos e excelentes. As cenas de body art – com pessoas penduradas com ganchos, bocas costuradas, etc – são REAIS. E, como não poderia deixar de ser, há cenas com aranhas, baratas e ratos vivos.

Já os efeitos das cenas sobrenaturais são mais toscos, não convencem tanto. Mas a idéia de fazer os fantasmas das antigas vítimas (dos antigos filmes) aparecerem em preto e branco é bem legal.

José Mojica Marins, você sabe, não fala, pragueja. E é assim no filme todo. Todas as frases, até as mais corriqueiras, são ditas (ou declamadas) como se fossem uma maldição, me lembrando da sátira feita a ele por Hermes & Renato (veja abaixo). Já era assim nos filmes da década de 60, e como talento de atuação é bem discutível. Mas contribui bastante para o clima de insanidade do filme.


A sátira.

E ainda há uma legião de atores cults, como Zé Celso e Helena Ignez, e amigas queridas que adorei ver por lá, como a Cléo de Páris (que faz uma das noivas do Zé), e Geanine Marques (como A Morte).



Cléo.




O resultado final é um ótimo filme de horror. Pesado. Bizarro. Com uma belíssima direção de arte e trilha sonora (de André Abujamra e Marcio Nigro). Dá pra sentir também o dedo de Dennison Ramalho, roteirista e assistente de direção, uma das pessoas mais atuantes no gênero de horror no Brasil, que dirigiu o excelente (e creepy) curta “Amor Só de Mãe”.

Vai dividir opiniões, mas espero que sirva pra arejar um pouco o cinema nacional, trazer novos temas, acender o lado fantástico. Até porque, temos aí o filme do Chupacabra, do Christiano Metri (em que assino o roteiro com ele), que já está fermentando.

Nos festivais de cinema fantástico e de horror pelo mundo à fora, acho que “Encarnação do Demônio” fará uma bela carreira. Não só por ser extremo, mas por ser bem brasileiro. Esse clima de macumba, de terreiro, confere uma exoticidade única ao filme, que deve agradar bem aos gringos fãs do gênero.

Enfim, é o cinema nacional reencarnando.

Trailer do filme:




No mais, tenho me arrastado pela casa, sem café, nem gás, nem gasolina. Lendo, lendo, lendo. Por desânimo. Por prazer. E por trabalho. Tenho feito parecer para algumas editoras. Resenhas e entrevistas para revistas como Rolling Stones e Simples. Nada de grandes emoções. Semana passada fiz uma entrevista com o Noll.



O livro "de lazer" do momento é "Mysterious Skin", do Scott Heim, que gerou um filme bem bacana do Gregg Araki (lançado no Brasil como "Mistérios da Carne"). Bem que eu queria indicar como tradução para alguma editora daqui, mas sabe como é, coisa meio underground...

Então recomendo "Olívio", autografado, 25 pila.

NESTE SÁBADO!