Queria eu narrar guerras, desastres, anunciar em meus dedos a descoberta do apocalipse. Mas não tenho me derramado em hemácias, nem exaurido em combates os leucócitos. Está tudo em seu devido lugar, no lugar de sempre. E eu continuo em silêncio.
Aqui está tudo em suspenso. “Um tédio pastoso”, como diria Noll, ou uma paz borrachenta. 2008 tem sido um ano bem parado, sem muitos dramas, nem muitas emoções. Eu não deveria reclamar, mas faltam desafios. Tenho lido. De 3 a 4 livros por semana. Tenho produzido. Tenho tido tempo para produzir. Mas produzo melhor quando me falta tempo. Você não tem nenhuma proposta provocativa para me fazer? Digo, você não quer fazer uma solicitação para testar o meu talento? Os trabalhos andam sempre os mesmos. Pouca gente lambe meus dedos. Pouca gente requer - e desafia - os serviços de um jovem escritor brasileiro...
Quero saber o que você tem a me oferecer.
Fui ver o Hamlet do Wagner Moura, uma neurose só. Gostos de peças neuróticas. Adoro a Denise Stoklos. Gosto de Hamlet. Já legendei um Hamlet no teatro. Mas tive certa dificuldade em seguir o texto desse, um pouco acelerado demais. De qualquer forma, é uma montagem vigorosa, e melhor o excesso do que a falta. Sou partidário do excesso. Sou adepto do excesso. Sou apaixonado pelo excesso e pelo excesso e a repetição. Pelo exagero. Shakespeare tem disso. Wilde tem disso. Noll tem disso e eu me certifico de como dá para ser consistente e incisivo sem contenções. Como o elogio aos sutis nem sempre é necessário. Como a simplicidade e a objetividade não devem sempre ter vez. Quero mais.
No tédio, repito a mim mesmo.
(Foto: Ambooleg) "Em silêncio, não sou ninguém."
Estou tentando entender o que acontece aqui dentro. Estou tentando não fazer barulho e manter tudo direito. Também nem ando com tantas vontades – me basta o excesso de cada dia e o excesso de quase nada. Me cansa. Queria uma força para ir contra. Ou uma força para testar os meus músculos – meu tríceps, que seja. A academia continua em dia. Mas nem preciso ir para me cansar. Me cansa. Talvez porque eu não esteja mais tomando café. Sim, ainda não estou mais tomando café. Nem gasolina. A última festa a que eu tinha de ir, dormi e perdi. O amor me embala e me desperta - peço que ele me deixe continuar dormindo. E ainda não peco nunca mais, nem tenho vontades. Não tenho vontades, quase nada.
Quase nada.