POST DE SUPERMERCADO
Com a Anni, dona da casa que agora é minha.
Agora estou instaladinho, no meu apartamento em Helsinque, que não tem a vista de Florianópolis, nem todo o repertório de São Paulo, mas é muito melhor equipado em fogão, geladeira, microondas, lava-louça e máquina de lavar, tudo da última geração.
Na verdade, na primeira noite aqui eu quis me matar. A internet que a Anni me deixou não funcionava, e eu me vi sozinho neste minimalismo escandinavo, pensando mais uma vez: "O que é que eu vim fazer aqui?"
Mas normal. Já passei por isso. Lembro há quase dois anos, no primeiro dia da minha nova casa em Florianópolis, ouvindo o barulho da rua, o pagode dos vizinhos, pensando que asneira eu havia feito me mudando para lá. E foi a melhor coisa que eu fiz. E acho que agora também, acho que agora também, ainda está tudo bem incerto. Como diz Wander Wildner: "Eu não consigo ser alegre o tempo inteiro..."
Como todo mundo... talvez como todo mundo, ou como algumas pessoas, algumas noites eu vou dormir achando que o suicídio é a única saída. E alguns dias eu acordo achando que não pode haver alguém no mundo com uma vida melhor do que a minha. Na verdade um pensamento não contradiz o outro, minha vida é tão boa que se terminasse agora eu estaria satisfeito. Mas o que estou dizendo?
É meio só para dizer que, como todo mundo, eu posso dormir querendo morrer, e acordar querendo viver mais um pouco, mas isso não me faz em nada especial, nem me dá grife de problemático-bi-polar, receita para tomar tarja preta ou necessidade de consultar um terapeuta. Eu apenas me arrasto da cama e vou fazer mais uma página. Então vamos parar de chororô porque that's life, e a vida infelizmente é a única possibilidade.
Isso era para ser um post de supermercado...
Instalado nesta nova vida reciclada, me arrastei da cama no dia seguinte para o supermercado. Gostei do supermercado. Amei o supermercado. Não sei se vou poder abrir mão do supermercado daqui. Não só consegui comprar tudo o que estou acostumado - manga, gengibre, maçã verde, frutos do mar - como uma maior variedade. É ótimo para cogumelos e saladas, e algumas coisas são mais baratas. Fiquei, por exemplo, meio chocado em ver que o quilo da manga era pouco mais de 2 euros. Isso não dá uns 5 reais? 5 reais não é o quilo da manga no Pão de Açúcar? E sim, a manga daqui VEM do BRASIL, assim como a blueberry vem da Argentina, a mesma que se compra aí, e aqui também é mais barato.
Isso não quer dizer que a vida aqui é mais barata do que em São Paulo... mas está quase pau a pau. O problema é que o que é caro aí pode até ser um pouquinho mais barato aqui, mas continua sendo tudo caro. Tudo vem de fora. Viver aqui é viver com o que existe de caro no Brasil (ou seja, blueberries, cogumelos e mangas do Pão de Açúcar).
Mas dá para ser feliz.
Primeiro almoço que cozinhei na minha casa: salmãozinho nazariano.
Para álcool, existe uma política rigorosa. Para começar, em bares, restaurantes e boates, não se pode servir mais do que uma dose (de 20ml!) por vez. Isso, ao meu ver, impossibilita que se prepare grande parte dos drinques de verdade (como caipirinha, margarita, Long Island iced tea) é tudo completado com muito gelo, limão e soda (cáustica).
Para levar para casa, qualquer bebida com teor alcóolico acima de 5% (ou seja, qualquer coisa que não seja cerveja ou a cidra daqui) só pode ser comprada em lojas do governo chamadas de... Alko (que original). Vinho nessas lojas até que tem um preço ok (vinho chileno sai em média por 7 euros, ou seja, mesmo preço do que no Brasil) mas o litro de uma Smirnoff, por exemplo, sai por mais de setenta reais! Não sei como o povo consegue ser alcóolatra aqui. Mas dá para entender como tem tanto gordinho, se eles têm de se embebedar com cerveja...
Mas dá para ser feliz...
Mesmo em dezembro.
A Anni também me deixou uma bicicleta e tenho andando por todo canto com ela. Ainda não está lá tanto frio. Hoje fez uns sete graus. Nada de neve. Porém os dias estão cada vez mais curtos, mais escuros, e mesmo quando o sol sai parece sempre fim de tarde. De qualquer forma, o dia mais curto do ano é em dezembro, próximo ao Natal, depois começa o inverno, o frio aumenta mais, mas os dias passam a se alongar.
Mais difícil do que montar uma casinha de gingerbread é pronunciar o nome: piparkakkutalo.
Eu estarei aqui o inverno todo, se antes eu não me matar. Tenho conhecido pessoas legais. Ontem fiz jantar para um "rapazinho especial"; cozinhei frutos do mar, arroz de jasmim - nada típico brasileiro mas tudo bem típico do que eu mesmo cozinhava no Brasil. Depois construímos uma casinha de gingerbread, coisa típica de Natal. Só isso já me fez sentir numa nova vida, numa nova casa, numa casa que é minha.
Pode ser pequena, capenga e um caos, mas é doce e é a minha cara, a minha casa.