31/01/2012
29/01/2012
24/01/2012
20/01/2012
18/01/2012
Bons leitores não formam (necessariamente) bons escritores. Para escapar do repertório lido, e criar algo novo, é preciso algo mais. Mas um mau leitor também não tem por quê escrever, e cada vez mais me pergunto por quê...
Tem sido difícil engrenar em boas leituras. Eu não tenho dó, ah, eu não tenho dó. E largo grande parte dos livros no meio, no começo, ou mesmo perto do fim. Por isso é bom os períodos que sou soterrado (por editoras) em leituras críticas, sou obrigado a ser fiel ao livro, acabo recuperando o prazer de ler em si, e ainda sou pago para isso.
Mas agora não sou pago para isso.
Vim para a Europa com um estoque bem limitado de livros. Ainda não me adaptei aos e-readers, e livro pesa, pesa, ocupa espaço. Em São Paulo tenho toda uma biblioteca, e os livros continuam chegando sem esforço. Aqui, estou tendo de recorrer à livraria Academica, no centro, que tem uma seção boa seção de literatura em inglês – e os paperbacks por volta de 10 euros, veja, saem mais barato do que os livros nacionais no Brasil. O problema é que eu não sei escolher...
Já falei muito sobre as prateleiras intransponíveis, como é difícil saber o que há em cada livro, por trás de uma lombada, qual será aquele que tem a ver com você. Nenhum tem a ver comigo. Escolho errado. Volto com uma pilha de mau gosto para casa.
O primeiro livro de 2012 foi Luke and Jon, um “romance de formação” de estreia do britânico Robert William, esse eu consegui ler até o fim. É um livro bonitinho, da amizade entre dois meninos meio losers numa cidadezinha rural. Bonitinho, eficiente, mas nada de novo, nada de memorável. Um livro “bonzinho” demais, que não ofende ninguém. Não me empolgou.
Swamplandia - outro romance de estreia, da americana Karen Russel – prometia (ao menos para mim), ambientado naqueles parques de jacarés da Flórida. Achei que não tinha como eu não gostar. Mas não consegui terminar. Achei meio... livro de mulherzinha.
Luka and the Fire of Life é o elogiado romance de Salman Rushdie, que há tempos eu queria ler, por todo o tom de fábula e ter uma influência forte dos videogames. Mas na prática achei apenas... infantil. E com essa “fantasia mitológica” que me aborrece. Não consegui terminar.
Achei que The Mammoth Book of Best New Horror (de 2010) fosse ao menor ser divertido. Mas quando comecei a ler percebi meu erro: “best NEW horror”, de 2010, ou seja, é um volume publicado anualmente, trazendo os melhores NOVOS autores do ano. Não é possível que todo ano surjam tantos novos bons autores de terror. Nem é possível que novos autores sejam lá tão bons. Então pelo que fui notando, saltando entre contos, o livro é uma bangolice de histórias de vampiro e zumbis (“boooo!”), nada perturbadoras de fato. Mas desse eu ainda não desisti, talvez eu ainda consiga encontrar um ou outro conto que preste.
Então lembrei de As Certezas e as Palavras, livro de contos que Carlos Henrique Schroeder me deu em Jaraguá do Sul, e que eu havia trazido na mala. Foi uma boa escolha. Não só porque eu estava precisando ler algo em português do Brasil, mas porque me trouxe de volta Santa Catarina. Schroeder é autor catarinense e batalhador da cena literária por lá (ele que organiza o Festival Nacional do Conto, de que participei ano passado). Apesar de estar longe de poder ser considerado um livro “regionalista”, em vários contos se nota esse Brasil tão peculiar (e tão pouco visto na grande mídia, na grande literatura) que está muito mais inserido num contexto de América Latina, pela proximidade e intercâmbio com o Uruguai, com a Argentina. Finalmente, esse eu gostei bem, e eu até poderia dizer que me trouxe uma nostalgia do que eu não vivi, mas... eu já vivi. É, agora eu posso dizer que já vivi, e talvez esse Brasil me inspire e preencha meu universo interno muito mais do que... sei lá, minha infância paulistana nos Jardins?
“Ela tem os olhos mais belos que já vi (verdes ou azuis ou verdes-azuis, como ela prefere), embora agora não possa vê-los (pois é noite e na beira deste rio não há luzes), eu sei que ela me olha (ou tenta). Está frio e estamos molhados, mas de mãos dadas.” – de As Certezas e as Palavras, de Carlos Henrique Schroeder.
Universo interno... regionalismos... Me fez pensar também nos posts mais recentes do blog do Marcelino. Ele é um cronista afiado e tem comentado de forma lírica das pedras do crack no meio do caminho aos estupros do Pedro Bial – e eu com isso? E eu com isso, me pergunto, principalmente ao ler coisas como essas:
"Escrever ou não escrever? É pouco o que eu escrevo. Diante do que li hoje na Folha de S. Paulo. Em reportagem sobre a Cracolândia. Se tivesse sido eu o autor das frases. Ali faladas. Diriam com certeza. Como esse escritor viaja. Cachimba-se na maionese. Pega pesado. Tipo. Quando alguns de meus personagens soltam a língua. Esbravejam. Defendem seu lar. Custe o que custar. Brigam por um sofá. Uma mobília. Pedem disciplina. Respeito. Tratam bem suas visitas. Quer um pouco de Coca? A gente tem. Umildemente. Tem. Ah. Meu caro. A ficção é que não está com nada. Diante da fala do povo. Morto. Zumbis zangados. Expulsos de suas moradas. Covas rasas. Porém honestas. A ficção dá pena.” de Shakespeare na Cracolândia, do blog do Marcelino, Ossos do Ofídio - http://marcelinofreire.wordpress.com/
Concordo. A ficção dá pena. Concordo. A ficção está com nada. E fico pensando o que resta, então, a mim, como ficcionista. Eu, que sempre acreditei na ficção pura, percebo que nem é isso o que se espera de um escritor. A mágica de criar do nada, dar a luz ao que não existe, mostrar o que não há, não interessa mais a ninguém… Espera-se é que o escritor seja um comentarista da realidade, o cronista, que diga com melhores palavras o que todos já sabem.
As pessoas querem ler sobre suas próprias vidas. As pessoas querem se identificar. E minha bandeira, que foi sempre a de trazer a diferença, a estranheza, parece mais o emblema de um alienado.
Por isso eu mato.
Até que se procura, o que se pede, o que se encomenda a um escritor é apenas uma visão mais bem formatada dos tempos atuais. Convida-se o escritor para fazer resenhas, crônicas, análises, entrevistas – o que menos se pede a um autor é para fazer ficção. Ainda espero (e desafio!) pelo dia que serei convidado por algum veículo a ter uma coluna de histórias de ficção semanais.
Sinceramente o que eu tenho sentido é isso, que esse esforço por fazer o novo, por trazer o novo, apresentar ao leitor algo que ele ainda não viu, não é mais, ou nunca foi valorizado.
Mas prefiro morrer (e matar) a comentar o BBB.
13/01/2012
Jyväskylä.
Mas isso também torna tudo mais fácil, o frio, a reclusão, a privacidade. Digo que é bem mais dramático viver deprimido com os passarinhos cantando na sua janela, o sol entrando pelas frestas, o calor, o barulho, a obrigação de ser feliz, no Brasil. É um terror se arrastar pelo trânsito, é um sufoco conseguir um minuto de silêncio. É triste ser depressivo em São Paulo. Aqui, apenas faz parte da vida. A Finlândia, no inverno, é o melhor lugar do mundo para ficar deprimido.
Aqui não se escuta um pio. No prédio, nas ruas. As pessoas falam baixo, não falam nada. Ninguém fala comigo; eu não entendo nada do que é dito. Quatro horas da tarde já está escuro, oito horas da noite já é madrugada. Num sábado, por exemplo, depois das 18h é difícil encontrar um supermercado, as lojas estão fechadas.
Eu nunca entrei nesse fuso horário. Aqui, mais do que nunca, não tenho horário para nada. Eu nunca preciso acordar. Só depois de me revirar muito na cama decido que não tenho mesmo mais sono e me forço a levantar. Sigo com as traduções. Um texto ou outro encomendado. Nunca me perco nos prazos, mas são basicamente ditados por mim mesmo, são meus próprios trabalhos. É quase uma delícia viver como depressivo, sem ninguém para cobrar.
Dormir é tão difícil quanto acordar. Vou enrolando pela madrugada escrevendo, lendo, assistindo todo tipo de coisa pela Internet. Esta semana assisti o Roda Viva do Eike Batista, do Jô Soares, do Datena. Marília Gabriela entrevistando Danilo Gentili, Danilo Gentili entrevistando Marília Gabriela, os dois episódios de “Mulheres Ricas”. Pois é, são madrugadas longas...
Segundas e quartas pratico “Body Balance”, que apelidei de Bloody Balance, maldito equilíbrio. É algo entre o alongamento e o pilates, mas já está me dando nos nervos. No início, achei hilário o tom de auto-ajuda da instrutora: “Sinta o amor dentro dei si; você é um guerreiro do coração” – agora já não suporto mais, principalmente porque são sempre as mesmas músicas, os mesmos exercícios, na mesma sequência. Será que isso é manter o maldito equilíbrio?
Bem, a vaidade, ao menos, mantém o meu. A vaidade é que salva minha vida. Me tira de casa todos os dias, para a academia. Me resgata das drogas, da bebida. Se não fosse minha vaidade, não sei o que seria da minha vida.
Então este final de semana fui para Jyväskylä, um pouco mais frio, um pouco mais norte. Conheci um leitor brasileiro querido, há algumas semanas, que está estudando aqui, e abusei de um convite cortês aceitando-o de verdade.
Jyväskyla é uma cidade universitária, há 4 horas de trem de Helsinque. Cidadezinha pequena, sem muito o que fazer, mas bem gostosa para um final de semana. Toda coberta de neve – me lembrou aquela cidadezinha do Alasca do filme 30 Dias de Noite – com paisagens lindas para se andar de bicicleta durante o dia, bares e clubes para a noite.
O Jere eu deixei para trás, apenas para trás, sem ligar, atender, sem mandar mensagem. Isso, em São Paulo, seria mais fácil. Aqui, me sentia na obrigação de aproveitar ao máximo as possibilidades. Mesmo quando não estava realmente rolando; em São Paulo seria mais fácil. E um relacionamento pode deixar você mais fraco. Aqui, que não conheço ninguém, é fácil me apoiar demais em alguém. Não quero mais. Os relacionamentos, afinal, provam como as pessoas são fracas.
As pessoas são fracas, e sempre precisam de algo ou alguém para se apoiar. Manter o maldito equilíbrio. Ou pílulas para dormir. Pílulas para acordar. Pílulas para ser feliz. Eu entendo bem como é – é tudo uma questão de química, seja pelas drogas, ginástica ou o amor. De manhã (ok, às duas da tarde) a cafeína realmente me ajuda. Álcool também, mas é um equilíbrio bem mais delicado, precisa ser muito bem dosado (e esporádico) ou te mergulha de vez na depressão. É tudo uma questão química, eu sei bem, para mim e para você. Por isso mesmo nunca tive muito respeito por quem se vangloria: “Oh, eu tomo remédios. Oh, eu sou problemático.” Eu me arrasto da cama, e tomo cafeína.
Sérgio e a namorada, Noora.
E está tudo lindo – oh, está tudo lindo. Veja só as fotos, não está tudo lindo? É tudo parte da vida – é disso que estou atrás. A dose, o equilíbrio, a química da vida. Privilégio meu, que posso balancear alterando a luz, o amor a temperatura, enquanto você se gaba de suas conversas no analista.
Não me entenda mal, estou feliz de estar aqui. E vou sair fortalecido. A Finlândia é o melhor lugar do mundo para se estar depressivo.
12/01/2012
07/01/2012
02/01/2012
Reveillon para mim é indispensável viajar. Morando em São Paulo, sempre acho deprê passar em São Paulo. Ano passado estava morando em Floripa, e achei sem sentido sair de lá, já que é um grande destino de verão e eu tinha uma casa na praia para receber amigos.
Este ano, mesmo morando temporariamente em Helsinque, achei meio deprê passar aqui. Pesquisei lugares mais bucólicos, como a Lapônia, e estava tudo lotado, caro e complicado.
Estocolmo não é das minhas cidades favoritas, mas acho a viagem entre Helsinque e Estocolmo bem divertida. Há diversas ferries que fazem essa travessia, que leva cerca de 17 horas – você pega de tarde e chega na manhã seguinte. São grandes navios com cabines, restaurantes, bares, boate, karaokê, cassino e tudo mais – é uma balada em si, e muita gente faz a travessia só por isso.
Eu já fiz essa travessia umas 4 vezes (a última tinha sido em outubro do ano passado, com post no blog inclusive) e comecei a pensar que seria uma forma engraçada de passar o ano novo. Os navios da Viking Line são bem, bem cafonas, com umas famílias comprando loucamente nas lojas duty-free, adolescentes bebendo até cair, e o povo se entupindo de comida nos bufês. Chequei então a disponibilidade, eles ainda tinham cabines para o ano novo, propus ao Jere e lá fomos nós...
A virada foi no navio em si (“Mariella”), e achei mais engraçado do que nunca. Estava bem, bem lotado, mas o Jere parecia ser o único finlandês à bordo. Muitos, muitos russos, alguns somalianos, indianos, enfim um programa para turistas. Parece glamuroso dizer que passei o ano novo à bordo de um navio, indo para a Suécia, mas a coisa é relativa. Todos os finlandeses com que comentei que ia passar o réveillon lá, inclusive, me pareceram um pouco assustados – “Hum, vai ser... uma experiência” – e acho que o Jere mesmo se arrependeu várias vezes de eu tê-lo convencido, especialmente quando embarcou.
Finlandeses e russos não se bicam – a Finlândia já esteve sob domínio da Rússia, a guerra foi feia e até hoje o jeito bruto e despojado dos russos assusta um pouco o povo tímido daqui. “Olha só a roupa dessa mulher,” comentava o Jere sobre uma menina de micro-saia, “uma finlandesa nunca usaria uma coisa dessas.”
Um bom exemplo dessas diferenças foi que ouvimos mais gritos e comemorações às dez da noite (quando era meia noite em São Petersburgo) do que à meia noite.
O navio também é um programa majoritariamente heterossexual, repleto de famílias. Alguns russos vinham puxar papo e combinei com o Jere a história de que ele era “patinador de gelo” e eu era empresário dele. No final, nos entupimos no bufê, compramos no free-shop, jogamos no cassino, bebemos no bar, aproveitamos bem a cabine e foi tudo lindo.
Passamos só o domingo em Estocolmo, que eu já conheço razoavelmente bem. Encontramos um primo do Jere, casado com uma chilena, passeamos pela cidade com eles e voltamos no final de tarde para o navio. A viagem de volta foi bem mais tranquila, o “Mariella” bem mais vazio. Mas achei bem gostoso ficar vendo a banda tocar ao vivo aquelas músicas de festa de casamento (“Mamma Mia”, “La Bamba”, “I Will Survive”) com uns velhinhos dançando de rosto colado, uns bêbados perdidos na pista, crianças dançando com as mães - Ah, e tinha um barzinho mais “cozy” com um cara que cantava ao piano e fez inclusive uma versão de “Hurt” do NIN, quando estava pronto para encerrar a noite.
Enfim, foi de fato um EVENTO, como eu acho que ano novo tem de ser. Jere também se divertiu e deu o braço a torcer que foi uma boa ideia, afinal. Eu mesmo tenho certeza de que se ele fosse para o Brasil iria querer me arrastar para uma micareta, um carnaval de rua, os desfiles do Rio ou qualquer coisa bagaceira desse tipo.
Os drinques finais do novo ano.
Chegamos hoje de volta a Helsinque, e de tarde a cidade começou a se cobrir de neve; já não era sem tempo. Fui e voltei à pé para a academia, debaixo de uma nevasca. Não vim para a Finlândia para fugir disso. Cruzando parques vi coelhos correndo, patos voando, a vida selvagem enfim tomando conta da cidade...