23/05/2012

O QUE ANDA LENDO?

Santiago Nazarian com Edney Silvestre, escritor e repórter.

[Publicado na minha coluna mensal da revista Metáfora, de maio]

Nazarian: Edney, tem uns minutinhos?

Silvestre: Deixa eu interromper o texto que estou a escrever. Meu personagem teve um filho.

Nazarian: Virou vovô! Então, o que está lendo?

Silvestre: Hehe. Estou relendo Tonio Kroeger. Vou falar do romance doThomas Mann durante uma viagem ("Navegar é preciso") com um grupopelo rio Negro. Vamos: Walter Hugo Mãe, Nilton Bonder, Clarice Niskier, Ignacio de Loyola Brandão e eu. É um projeto que está no segundo ano, organizado pelo Samuel Seibel, das Livrarias da Vila. No final cada um falará de seu livro preferido.

Nazarian: Nossa, que incrível. Amo esse livro. É muito cruel, e verdadeiro Eu tinha naquela ediçãozinha vermelha da Abril, capa dura com o Morte em Veneza... É seu preferido?

Silvestre: Não tenho um "preferido", mas foi esse que me salvou a vida na adolescência. É portanto o livro mais importante pra mim. Foi um dos quatro que carreguei para NY quando me mudei pra lá. Os outros foram um roteiro detalhado de "Himmel Über Berlin", aliás, "Les ailes dudésir", do Wim Wenders; uma edição velhíssima de "O encontro marcado" [Fernando Sabino] e uma edição da história da Yeda Leite Linhares.

Nazarian: Adoro aquela coisa de ele [Tônio Kroeger] chegar ao ponto máximo que poderia, como escritor, mas ainda assim ser sempre um excluído, não conseguir tocar o "mundo dos belos"...

Silvestre: Sim, o artista como excluído, sempre. Lembra do capítulo em que ele vê o baile por trás das janelas, do lado de fora? O mundo dos ajustados não é o nosso. Não te parece?

Nazarian: Mas talvez todo mundo se sinta meio assim, talvez apenas os escritores tenham mais oportunidade de narrar, até porque narram sozinhos...

Edney: Talvez.

Nazarian: O que eu já encontrei de ex-colega que eu achava popular, integrado no colégio, que hoje é metido à artista. E eu digo: Você não pode ser artista, você era integrado! Haha. Mas ninguém se vê como integrado...

Silvestre: Hum... Não sei se concordo. Aliás, sei: não concordo. Sei de gente que se acha ajustada. Não é, mas se acha. Os escritores americanos, tantos, profissionais da escrita, trabalham das nove as cinco, com intervalo de almoço, nos seus romances, contos e peças. Conheci alguns perfeitamente, digamos, ajustados ao sistema.

Nazarian: Esses não me apetecem... Mas me diz, na hora de escolher esses livros, seus livros de cabeceira e tal, não se sente meio pressionado a apontar "autores brasileiros"?

Silvestre: Não, Santiago. Até porque, na minha juventude, os arrasa-quarteirões da crítica e dos leitores eram Jorge Amado etc. Not my cup of tea. Sou mais introspectivo. Dos brasileiros, gosto mesmo é do Graciliano Ramos.

Nazarian: Ufa, enfim um autor brasileiro que não paga pau pra Machado!

Silvestre: Nem Machado, nem Lobato.

Tonio Kroeger é uma novela escrita por Thomas Mann em 1901, quando ele ainda tinha 25 anos. Foi publicada em português no Brasil, além da Editora Abril, pela Nova Fronteira.

NESTE SÁBADO!