APOCALÍPTICOS E INTEGRADOS
Quando eu morava em Porto Alegre, e escrevia meu primeiro romance, recebi da minha mãe o livro de contos "Angú de Sangue", do Marcelino Freire. Acho que foi meu primeiro contato com essa "nova literatura". Eu ainda tinha aquela mentalidade de que "bicho bom é bicho morto" e não tinha o menor interesse em conhecer os contemporâneos.
Mas o livro do Marcelino me trouxe uma nova dimensão, uma literatura viva, atual, identificável, que estava acontecendo enquanto vivíamos – e que ainda assim continuava sendo literatura.
Só anos depois fui conhecer pessoalmente o Marcelino, aprofundar meu conhecimento sobre essa literatura, descobrir onde estava o povo minha idade que escrevia. Minha temporada em Parati, com JP Cuenca e Chico Mattoso também foi ótima para isso. Apesar de eu ser o único dos três que já tinha publicado um romance, eles pareciam muito mais inteirados da "cena" do que eu. O Mattoso, especificamente, me despejou uma horda de novos autores, com sua ótima revista literária "Ácaro".
Agora é inevitável eu fazer parte. Acabo recebendo vários livros de colegas aqui em casa, convites de lançamentos e estou sempre conhecendo novos escritores em eventos (ALIÁS, acabo de voltar do Prêmio Portugal Telecom – concedido ao grande Paulo Henriques Britto). Eu acho uma bobagem esses rótulos de "Geração 00", ou mesmo os grupos e panelinhas. Se eu quisesse pertencer a um grupo, eu continuaria tocando teclado numa banda de rock. Para mim, o principal atrativo da literatura é a independência, a prática solitária (e masturbatória). É mais ou menos sobre isso que trata meu conto "Seis Dedos pra Contar" (que está aí no site, no link das "Formigas").
Mas se a prática é solitária (e, acredito eu, densa, verdadeira e particular), a promoção tem de ser solidária. É preciso se integrar, vender o peixe (abrir a espinha) e "todos juntos somos fortes". Também não dá para negar que, por mais que queremos ser únicos, há traços comuns nas obras escritas atualmente. Não dá para fugir do "peso da geração".
Enfim, são essas (e outras) discussões sobre "nova literatura" que formam os temas de um encontro literário no Itaú Cultural –Encontros de Interrogação (dias 22 e 23 de novembro) - promovido pelo Marcelino Freire, Nelson de Oliveira, Claudio Daniel e Frederico Barbosa.
Marcelino me mandou um email com um convite e uma pergunta, que será o tema da minha mesa. Respondi para ele de imediato. Vai aí:
Cadê a Nova Clarice? Cadê o Novo Rosa?
"Agora que você me perguntou, eu escuto a Clarice toda noite, fazendo o sino tocar. É na igreja aqui do lado, na rua de cima, atrás do meu apartamento, de hora em hora. Quando estou sozinho de noite. Quando estou deitado com insônia, alguém toca o sino na igreja e me diz que não estou só. Não estou sozinho nessa madrugada onírica, com Clarice, mas talvez esteja apenas sonhando."
"Já o Rosa eu não sei por onde anda, não sei por quem dobra, nem que esquinas virou. Na verdade, eu nem saberia reconhecê-lo, porque só olho por trás de franjas. Talvez seja o assassino do papa, no meu suicídio não publicado. Talvez seja aquela cadeira reservada, em sorveterias, botecos e bares. Sempre que eu quero puxá-la, alguém me diz: "já tem gente", e eu me sento na sarjeta... "olhando as estrelas."
O meu debate é dia 23 de Novembro, terça-feira, às 17 horas no Itaú Cultural (Av Paulista 149). Estarei numa mesa com Cecília Giannetti, João Filho e Verônica Stigger, mediado pelo grande Marçal Aquino. Mais pertinho eu aviso de novo.