POLEGARES OPOSITORES
Ontem, depois de passar na Editora, fui no Sesc Consolação assistir aos debates de Márcia Denser com Clarah Averbuck e Marcelo Mirisola com Reinaldo Moraes.
Ai, ai, é tão doloroso.
A gente se acha tão especial, acha que tem um trabalho único, daí vê todos os escritores buscando o mesmo espaço, o mesmo reconhecimento. Contando as mesmas vantagens, expondo o mesmo orgulho.
E basta expor nosso orgulho para ele se tornar vergonha...
Fora que sou obrigado a ouvir coisas como "o Escritor tem de..." ou "todo escritor é..." da boca de outros escritores, e não concordar. Pensar, "não é bem assim", "não, meu processo é diferente", ou "não tem nada a ver".
Como o Reinaldo Moraes, que disse ontem que "o bom é ter escrito. Escrever é chato, doloroso." Já ouvi a mesma coisa da boca do Cuenca. Não concordo. O bom é escrever, viver a história, conviver com o personagem. Sempre que termino um romance, me dá um vazio, fico sem saber o que fazer. Depois vou batalhar a publicação/divulgação, porque quero continuar vivendo aquela história, ao menos falando sobre ela em entrevistas, ao menos lendo sobre ela em resenhas...
Mas enfim, cada escritor tem seu processo. Eu não posso colocar meu processo como regra, nem eles podem colocar os deles. Por isso não acredito em oficinas literárias.
A Márcia Denser também disse ontem que "só começou a escrever de primeira depois dos 35 anos". Que antes reescrevia, repensava, corrigia. Que é preciso maturidade e segurança para escrever de primeira.
Também não concordo. Acho que esse "ímpeto" de escrever pode ser bem característico da juventude, dos românticos apaixonados que escrevem de forma derramada (e ainda assim, literária, rica, bela). Eu escrevo assim, de primeira. Só releio meus livros para corrigir os erros mais evidentes.
E ontem também teve o Mirisola fazendo tipo. "Eu odeio escrever. Escrevo só porque não sei fazer outra coisa. Não queria ser escritor. Não vejo valor na literatura..."
Nessas horas, Clarah Averbuck bêbada e serelepe é perfeita. Ela ficou na platéia batendo boca com ele.
É mais ou menos sobre essas coisas que trata meu conto "Seis Dedos para Contar", que vocês podem ler aí do lado, no link ‘Formigas no Açúcar". O orgulho de cada um sobre seus próprios dedos. Eu, cortando os dedos da concorrência...
"Tínhamos todos seis dedos em cada mão. Além disso, quase nada em comum."
E agora meus cinco dedos estão ensangüentados na capa do "Feriado". Vai entender minha fixação com isso. Talvez tenha vindo do piano. Mas conheci um vietnamita uma vez que disse que eu tinha "flores nos dedos" (ui...) e que eu iria criar algo muito importante.
Como tantos outros...